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quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

A Cimeira Europeia de 8 e 9 de Dezembro

Uma vez mais, a opinião pública considera a Cimeira Europeia a realizar a 8 e 9 de Dezembro como uma cimeira decisiva, uma cimeira do tipo «make or break» em que os líderes europeus jogam o futuro da Europa. No entanto, uma coisa é o plano do dever-ser, outra o plano do ser; e no plano da substância, da matéria concreta, das decisões palpáveis e das acções criadoras, esta Cimeira irá ser uma farsa. E é uma farsa porque entre realizar-se esta Cimeira nos moldes em que ela se irá realizar ou não se realizar simplesmente, conduziria ao mesmo ao resultado – à manutenção das tensões nos mercados financeiros.
O extraordinário avanço e progresso que a Sra. Merkel e o Sr. Sarkozy propõem para esta Cimeira é uma revisão dos Tratados Europeus, ou mais concretamente, uma revisão do Pacto de Estabilidade e Crescimento, com regras mais exigentes em termos de disciplina orçamental e com sanções mais duras e de aplicação automática para os países incumpridores.
A proposta do Sr. Van Rompuy, que é de resto a única que merece a atenção dos mercados, de tornar o BCE o famoso lender of last resort dos países membros da zona euro irá cair no esquecimento e será votada ao ostracismo. É esta única expectativa que vem tendo um efeito positivo nas bolsas nos últimos dias. Com o desvanecimento dessa expectativa, os efeitos nos mercados serão imediatamente sentidos, especialmente junto da taxa de juro das obrigações italianas.
Na prática, a proposta da Sra. Merkel e do Sr. Sarkozy, ou direi, da Sra. Merkel com o dobrar de costas do Sr. Sarkozy, pretende dar maior corpo ao espírito vertido no Pacto Estabilidade e Crescimento que, no passado, se ficara apenas pelo espírito (curiosamente, essa violação do corpo iniciou-se precisamente pelos signatários da proposta). Ironias de parte, não negamos que uma revisão dos Tratados é necessária, e que é imperioso cumprir com o que não foi realizado em Maastricht, mas será esta sequer a componente mais importante para a resolução da crise e permitirá ela proteger os países da zona euro contra a instabilidade dos mercados? A resposta é um rotundo não.
A questão mais imediata, mais premente para a Europa é a seguinte: convencer cabalmente os mercados da firmeza da solidariedade europeia e assegurar o financiamento dos membros da zona euro a taxas de juro sustentáveis. Isso faz-se por uma de duas vias: a actuação em larga escala do BCE ou através da emissão de eurobonds. Nenhuma das duas opções estará em discussão na Cimeira Europeia desta semana.
A proposta da Sra. Merkel e do Sr. Sarkozy representa o triunfo da visão da opinião pública alemã sobre as origens da crise: a incompletude de Maastricht. Mas essa é uma visão estreita: não se trata apenas da violação objectiva de um limite de endividamento e de défice público; é também a ausência de uma verdadeira governação económica, de uma coordenação fiscal, de falta de liderança política, e sobretudo de falta de competitividade cujo remédio, ao contrário do que sugeriu o Sr. Westerwelle num recente artigo de opinião no Público, não passa pela fantochada da Agenda Europa 2020 que não é mais do que a mera enunciação de propósitos, objectivos e aspirações vagas, sem qualquer concomitância e concretização prática.
Se compreendemos a preocupação alemã em torno da necessidade de se reformarem as instituições europeias para que estas se adaptem às exigências de uma progressiva integração europeia e, portanto, de uma maior responsabilização dos Estados nacionais perante as instâncias europeias, evitando-se, assim, cometer os erros do passado, a verdade é que com as hesitações do seu Governo e a obsessão da disciplina orçamental, no momento em que se pretenda dar o passo final em termos de integração europeia, arriscamo-nos a que nos falte um requisito indispensável para tal – a Europa.

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