A mais bela, a mais pura e a mais duradoura glória literária de prosa da blogosfera

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domingo, 30 de janeiro de 2011

Querido, mudei outra vez o Código do Trabalho!

O actual Código do Trabalho entrou em vigor a 17/02/2009. Passados ainda nem sequer uns meros 2 anos, já se fala na sua alteração.

O actual executivo encontra-se pressionado pela Comissão Europeia e pelo Fundo Monetário Internacional para reformar o mercado laboral, nomeadamente reduzindo o valor da indemnização em caso de despedimento individual, actualmente fixada em cerca de um mês de salário por cada ano de trabalho, um dos valores mais altos da Europa.

Sendo o Direito do Trabalho um ramo de Direito Público, encontra-se naturalmente muito mais permeável às mutações. No entanto, sucessivas e constantes modificações, sobretudo quando tange a codificações, são totalmente impensáveis, dado que impedem que os regimes sejam sedimentados e que seja criada jurisprudência. Se é certo que as leis devem acompanhar a evolução da economia, do país e da realidade empresarial, estarem permanentemente a ser modificadas, já se torna incomportável, sobretudo para aqueles que as têm de pôr em prática todos os dias. Isto dá, por vezes, azo a autênticos jogos matemáticos: a lei A entrou em vigor a 02/01/2008; a 04/01/2009 entrou em vigor a lei B que revogou a lei A; a 04/06/2009 entrou em vigor a lei C que revogou a lei B. Ora a um contrato de trabalho celebrado a 06/01/2009 por um trabalhador que é despedido a 07/01/2009 e que quer saber quais são os seus “direitos”, que lei vamos aplicar? Pois é, Caríssimos, a vida já não é fácil, mas quando teimam em complicá-la ainda mais…

De qualquer forma, José Sócrates apresentou já 50 medidas que pretende pôr em prática para aumentar a competitividade e o emprego. Dentre estas medidas destaca-se a fixação de tectos máximos para os valores das indemnizações em caso de despedimento e eventuais mudanças nos critérios de fixação das compensações e indemnizações. Vejamos o que o actual Código do Trabalho consagra a esse respeito. Actualmente, na hipótese de despedimento colectivo ou despedimento por extinção do posto de trabalho, o trabalhador tem direito a uma indemnização correspondente a um mês de salário base mais diuturnidades por cada ano de trabalho. No caso de despedimento ilícito, a lei fixa um intervalo para a indemnização a pagar ao trabalhador que não queira ser reintegrado na empresa. Esta indemnização é fixada pelo tribunal e varia entre 15 e 45 dias de salário base e diuturnidades por cada ano de trabalho, valor que a jurisprudência tem fixado nos 30 dias. O Governo pretende agora impor um tecto máximo de 12 meses de salário às indemnizações pagas aos trabalhadores em caso de despedimento e, assim, facilitar o ajustamento das empresas às flutuações da procura. Mais, quer que por cada ano de trabalho seja apenas dada uma indemnização por antiguidade de 15 dias de salário.
É notório que esta medida irá penalizar os trabalhadores mais antigos da empresa. No entanto, a Ministra do Trabalho contra-argumenta, afirmando que tudo se justifica dada a necessidade que as empresas têm de ver reduzidos os custos que têm de suportar no momento da reestruturação empresarial, ao mesmo tempo que têm de garantir o pagamento das indemnizações aos trabalhadores.

Caríssimos, é óbvio que esta medida vai ser bastante negativa para os trabalhadores que, mais uma vez, se vêem prejudicados, pois, independentemente de terem trabalhado numa determinada empresa, 5 ou 35 anos, receberão o mesmo no que respeita à indemnização por antiguidade. Ademais, os efeitos desta medida só se repercutirão a longo prazo, uma vez que esta nova fórmula de cálculo de indemnização só se irá aplicar aos novos contratos de trabalho celebrados após a entrada em vigor da nova lei. Assim sendo, esta medida não terá efeitos para as empresas que neste momento têm necessidade de se reestruturar.
O Governo propôs também a criação de um fundo alimentado pelas empresas que pague, pelo menos parcialmente, os custos dos despedimentos, destinado a trabalhadores contratados depois da entrada em vigor da medida. Este fundo será constituído por contribuições de todas as empresas, ou seja, na prática, até as empresas que mais empregam trabalhadores, terão de contribuir para este fundo de pagamento das indemnizações em virtude de despedimentos.
As medidas do Governo para “estimular o emprego” passam também por um reforço da negociação dentro da empresa, o que, segundo a Ministra, permitirá uma resposta mais adequada às flutuações do mercado e às necessidades de ajustamento das empresas. O Governo pretende que os contratos colectivos acordados entre associações sindicais e empresariais permitam que a mobilidade geográfica e funcional, a gestão do tempo de trabalho ou os salários possam ser negociados dentro da empresa. São igualmente alargadas as situações em que os sindicatos podem transferir o poder de negociação às comissões sindicais ou de trabalhadores; contudo, também aqui os efeitos serão diminutos, uma vez que dependem da vontade dos sindicatos de delegarem o poder negocial nas comissões.

Aguardemos, portanto, novos episódios da série “Querido, mudei outra vez o Código do Trabalho!”.

A vida está má, está! Até para os marqueses!

sábado, 29 de janeiro de 2011

A Revolução no Egipto

Seguindo-se à Revolução na Tunísia, surge agora a Revolução no Egipto. Pelo quinto dia consecutivo, o povo junta-se nas ruas e eclodem os protestos: no Cairo, em Alexandria, em Mansour, no Suez. Não é um grito de revolta isolado, trata-se da voz do povo que se ergue em uníssono.




















No dia de hoje, com o objectivo de acalmar a onda de protestos o Presidente Mubarak demitiu o Governo – é a primeira vítima das manifestações. Decerto não será a última. Queria o Presidente Mubarak fazer crer ao povo que escutava os seus protestos, que pretendia de agora em diante, de acordo com os desejos do povo, iniciar um novo movimento de reformas ao Egipto que lhe traria maior democracia e liberdade. Debalde – as manifestações continuam. O movimento espontâneo do povo egípcio não aponta aos braços e aos pés do regime, àqueles que constituem os instrumentos acessórios do poder: aponta directamente ao coração. E o coração deste regime é o seu símbolo máximo: o Presidente. Das duas uma: ou as manifestações acabam com a queda do regime de Mubarak ou terminam com uma repressão violenta e bárbara das forças de segurança sobre os manifestantes. Este último cenário é cada vez mais improvável – o Presidente chamou os militares a actuar; os militares juntaram-se a sua voz à do povo nos protestos. E este é um factor que faz a separação entre o sucesso e o insucesso: no caso da Tunísia, também os soldados apoiaram o povo nos seus protestos e a Revolução triunfou; no caso do Irão, na Revolução Verde de há dois anos atrás, a guarda pretoriana de Ahmadinejad e a coesão que se revelou entre o exército na defesa do regime acabou por segurá-lo.
Todos estes protestos, no entanto, têm uma base comum – é o descontentamento do povo árabe face a um regime numa fase claramente degenerativa da sua vida, numa crise aguda de legitimidade que apenas a força opressora do exército disfarçava. Pois bem: o povo deixou de ter medo – vem às ruas, grita, protesta, revolta-se, insubordina-se, rebela-se, ergue a sua voz.

A Revolução na Tunísia teve um efeito sobre os restantes povos dos países árabes: antes, o povo resignava-se perante as suas condições de vida miseráveis, perante o autoritarismo, perante a falta de liberdade: o regime brandia o exército numa das mãos e o povo tremia. Em Janeiro, o povo tunisino esmagou o medo: saiu à rua e triunfou. Demonstrou a todo o povo árabe o poder da crença – o poder de acreditar num ideal: a liberdade, a democracia. Demonstrou que a democracia prosperando por entre os Países Árabes não é um mero sonho de intelectuais utópicos: é a concretização da vontade do povo árabe, do povo por si, livremente organizado, agindo como um todo, sem uma força inspiradora que lhes insufle a vontade a não ser o ideal da liberdade.


E este movimento que irrompe em todo o Mundo Árabe deve fazer pensar os Europeus: deve fazer pensar uma certa direita xenófoba que emerge cada vez mais na Europa: na Holanda, por exemplo, os radicais de Geert Wilders, um anti-islamista, partilham o poder com o centro-direita. Espalham a sua mensagem populista entre o povo e, aqui e além, vai penetrando. Um pouco por toda a Europa, o discurso anti-islamista vai prosperando, negligenciando as consequências que, no futuro, daí poderão advir.


Pois bem: o povo árabe demonstra agora o seu verdadeiro carácter. Não se tratam de islamistas radicais, de meros títeres de meia dúzia de extremistas religiosos: a sua voz permaneceu calada todo este tempo; mas porque havia um regime ditatorial, opressor, autoritário que esmagava essa voz e o povo remetia-se ao medo e ao silêncio. Os dirigentes destes regimes não educavam o povo, não o cultivavam; apontavam-lhe apenas um caminho: a religião. Na ausência de outras forças inspiradoras, a religião foi durante muito tempo o ideal que conferiu sentido à vida do povo árabe. Não mais: o pensamento do povo árabe não se dirige ao radicalismo religioso, à corrupção, dirige-se sim à aspiração da liberdade, da dignidade do homem, da democracia. E o povo não deixará mais que outras pessoas se interponham entre si e a sua vontade e que falem em seu nome.

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Redes Socais

Toda a gente sabe da sua importância hoje em dia. Algumas manifestações que têm ocorrido recentemente no Egipto, por exemplo, foram organizadas e difundidas através delas. O próprio Papa Bento XVI já se pronunciou sobre elas: sim, as redes sociais são importantes, mas os seres humanos não se deverão esquecer que o contacto pessoal continua a ser a verdadeira maneira de aprofundar, cimentar e solidificar amizades.
Também na economia as redes sociais parecem assumir um papel cada vez mais importante, havendo especialistas que receiam o início de uma bolha à sua custa, tal como aconteceu no início do milénio com os negócios «.com«. O Facebook prepara a sua entrada em bolsa. Mark Zuckerberg tem um filme à sua custa. O rapaz que interpreta o papel de Mark Zuckerberg está nomeado para «Melhor Actor» nos Óscares. Enfim, as redes sociais estão na moda.

Madame Pompadour
E este, pessoas em geral, seria o poder das redes sociais se estas fizessem parte do quotidiano de outros tempos.














Letícia. a Marquesa
Actualmente, com a panóplia de Redes Sociais existentes, confesso que tenho muita dificuldade em entender para que é que cada uma delas serve. Assim sendo, encontrei uma forma fácil e eficiente de perceber qual o fim de cada uma.




















Lord Nelson

Dedica-se isto a todos os info-excluídos com amor pelos livros... Isto não é o facebook.





















Carlos Jorge Mendes

Tendo presente a mensagem de Sua Excelência, o Papa, estimado leitor, continue a investir nas amizades - e não apenas nas amizades virtuais. Evite, por favor, fazer figuras destas.



quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Eleitores sem Voto


Portugal é um país curioso: fazem-se muitos estudos dos quais poucos chegam a ter aplicação prática. No Estado pululam os grupos de trabalho, os comités, as comissões, os gabinetes de acompanhamento e os comissariados que, com funções mais ou menos definidas, operam num momento anterior à da execução, naquele momento em que as coisas estão para ser e ainda não o são.



De entre estas entidades, temos a Comissão Nacional de Eleições, um órgão independente que funciona junto da AR e onde se encontram representados os três poderes do Estado tendo como funções assegurar a igualdade de oportunidades e de acção das candidaturas e garantir a igualdade de tratamento dos cidadãos em todos os actos de recenseamento e operações eleitorais.
Posto isto, chegamos rapidamente à conclusão que a CNE tem menos trabalho que o Pai Natal! Natal há um por ano, enquanto que eleições nem sempre. Apesar deste pouco trabalho, a CNE não conseguiu assegurar o regular funcionamento das últimas eleições presidenciais.


Após a bronca, a CNE veio afirmar não ter responsabilidades na execução ou na “direcção das actividades administrativas e materiais inerentes à execução prática do processo eleitoral e ao recenseamento, incluindo a administração da Base de Dados do Recenseamento Eleitoral”, conforme afirmado pelo seu presidente.

Lavadas as mãos, como Pilatos, a culpa vai para Ministério da Administração Interna. Jorge Miguéis, director administração eleitoral propôs o envio aos novos portadores do CC de um aviso, seguindo o exemplo do que se tinha feto em 2009 avisando que, não o fazendo, poderia haver bronca – e isto em Agosto.
O aviso foi dirigido ao Director Geral da Administração Interna (Paulo Machado) que olhou para tal documento, coçou a cabeça e enviou (lá vai outra vez o aviso) para a secretária de Estado da Administração Interna, Dalila Araújo, que a despachou favoravelmente. Depois de tudo isto nada foi feito, porque o ministro não disponibilizou verba…


Pode dizer-se que gastar dinheiro com a informação atempada aos eleitores através de carta é ridículo. Nos cremos que não se pode por um preço na democracia. Se vamos por aí, mais barato seria não ter eleições.
Depois outras questões se levantam: para que existe então uma estação pública de televisão se não para fazer serviço público? Acaso esta mensagem não era de serviço público, quiçá de interesse superior ao Preço Certo? E a rádio pública? Se nem para isto serve então…
Mais, mesmo que se viva num outro mundo, em que se julgue que todos os cidadãos são extremamente diligentes, não se pode sancionar que esses mesmos cidadãos tenham escolhido determinado momento para o envio do SMS: pois, se prometia a operacionalidade do serviço durante as eleições, não se pode vir agora criticar as pessoas por, no âmbito da autonomia das suas vontades, terem escolhido um determinado momento, mais próximo ou mais distante do acto eleitoral. Se a algumas pessoas foi dito (não a todas, porque a mim não, por exemplo), no momento da entrega do CC, que lhes foi atribuído um novo número de eleitor, não lhes foi comunicado a eventual possibilidade de sobrecarga do sistema.


E como a nós, talvez muitos outros não tenham sido informados: o pico de pedidos de informação deu-se após as televisões referirem aquela possibilidade, nos jornais do meio-dia.
O Ministro não se demite porque “não foge”. Mas senhor ministro, a demissão não é uma fuga… A demissão é a forma de V. Exa. assumir as suas responsabilidades. E já agora ponha os olhos no Director Geral da Administração Interna que, apesar de ter avisado V. Exa., em tempo útil, dos eventuais problemas e depois V. Exa. ter feito ouvidos de mercador, apresentou a sua demissão: "As eleições correram mal, sou o director, devo assumir a minha parte de responsabilidade por exercer um cargo de confiança política - ainda que a minha missão seja na verdade mais técnica".
Tenha vergonha e demita-se senhor ministro já que negou as verbas pedidas e ignorou os avisos! Os portugueses não querem desculpas, querem é que a culpa não morra solteira, como é costume neste sítio chamado Portugal.


E já agora seria interessante saber quanto dinheiro recebeu a Critical Software, empresa escolhida para gerir todo o processo…
Não podem burocratas impedir o voto por cidadãos regularmente inscritos. E porque motivo se andou a mexer nos números de eleitor? E porque motivo não consta ele do CC? Todo um Simplex que não faz sentido.

Gostaríamos de referir, que após 100 anos esta república dos bananas, lá continua a cambalear, nem conseguindo a regular eleição do chefe de Estado, seu pressuposto básico. Ai Portugal, Portugal…

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Notas sobre as Presidenciais

Lord Nelson teve já oportunidade de, levemente, suavemente, com as pontinhas dos dedos de tratar o assunto das Presidenciais. Pois bem: nós, mais brutos, mais funestos, voltamos ao assunto mas partindo da nossa perspectiva. E queremos desde já iniciar pelo tema da abstenção, dos votos brancos e dos votos nulos. A percentagem da abstenção sabemos como foi: 53% - a mais elevada de sempre. Um sinal que os problemas surgidos com o exercício do direito de voto não beliscam. Votos brancos – foram quase 200.000; mais de 4%. Os votos brancos são, no meu entender, um sinal bem mais grave da enfermidade da democracia portuguesa que nos rege hoje do que a abstenão. Demonstra que existem cerca de 200.000 portugueses conscientes das suas responsabilidades de cidadão e cientes da sua condição que exercem o seu direito de voto mas que não encontram em nenhum dos candidatos um quadro mínimo de valores com que se identifiquem. Um conjunto de candidatos que não consiga transmitir um conjunto mínimo de valores capazes de convencer 200.000 eleitores não significa uma enfermidade da democracia e do sistema – representa, isso sim, uma enfermidade dos intérpretes da democracia e do sistema. E uma enfermidade que acompanha a democracia portuguesa há já três décadas. Sucessivamente, durante 30 anos, um conjunto de políticos revezam-se; os rostos mudam é certo, as ideias, porém, permanecem as mesmas.
Um pequeno exemplo para atestar da qualidade dessas ideias: no último dia da campanha presidencial, o Presidente da República reeleito, na ânsia de capturar meia dúzia de votos, criticou o Governo pela redução de salários na função pública. O Sr. Cavaco Silva sugeriu antes como forma de obter de reduzir o défice orçamental a criação de um imposto excepcional sobre os mais ricos. Decerto, o Sr. Cavaco Silva não ignora que aquando do primeiro Programa de Estabilidade e Crescimento foi criado uma taxa adicional em sede de IRS de 45% para os rendimentos superiores a 150.000 euros por ano. O Sr. Cavaco Silva estava ciente disso; e, no entanto, produziu aquela afirmação. Que nos diz isso do seu carácter? Que é um demagogo, que é um populista, que é um mentiroso – porque como reputado economista que é e afirma ser, sabe que os cortes na Administração Pública eram inevitáveis e que, somente, pecam por tardios, face aos elevados cortes que o Estado tem que operar na despesa pública, representando os gastos com pessoal a maior rubrica das despesas do Estado. E que a partir de determinada taxa, o imposto deixa de ser um verdadeiro imposto, cobrado pelo Estado para fazer face às despesas públicas, para se tornar num verdadeiro confisco.
E será pois este populista, este demagogo, este mentiroso que presidirá aos destinos do País nos próximos anos. O problema de Portugal é que sucessivos populistas, demagogos e mentirosos se têm apoderado do poder, negligenciando a coisa pública e atendendo apenas ao interesse pessoal pela reeleição ou ao interesse partidário. Não se trata de um problema do sistema, trata-se de um problema dos intérpretes do sistema: não surge na cena política portuguesa uma única personalidade capaz de se elevar pelo mérito das suas ideias, do seu trabalho, da sua dignidade, da sua ciência, da sua integridade.

Estas eleições trouxeram também sinais importantes à esquerda. E não representa a derrota do Partido Socialista – representa sim a derrota do sector à esquerda do Partido Socialista que é, de resto, um sector cada vez mais marginal dentro do Partido. Hoje em dia, o verdadeiro socialismo não se faz aproximando-se do radicalismo do PCP ou do BE: faz-se antes afirmando a diferença para esses partidos que se refugiam na sua irresponsabilidade governativa para atacarem o PS porque sabem que nunca terão de arcar e responder pelas consequências das suas políticas. E Alegre descobriu bem as consequências de se juntar ao Bloco de Esquerda. Continuo a entender que o Partido Socialista tomou a decisão correcta ao apoiar Manuel Alegre – porque não havia alternativa. A existência da candidatura de Alegre no PS impossibilitou a existência de outra candidatura com possibilidades reais de triunfar pela divisão que comportaria à esquerda. Quem errou foi sim Manuel Alegre ao aceitar o apoio do Bloco de Esquerda: a união do PS ao PCP e ao BE é ontologicamente impossível pela oposição de valores que os contrastam. Uns representam a velha esquerda; os outros a moderna esquerda. E é isso que os militantes socialistas têm de entender, mas sobretudo os militantes ainda enclausurados a uma esquerda desfasada do tempo e da realidade: a verdadeira esquerda apenas pode existir dentro do Partido Socialista: a esquerda que defende o Estado Social mas não alheada da realidade e da conjuntura e dos desafios que enfrentamos. Enquanto a esquerda mais à esquerda for incapaz de entender isso, qualquer aliança de esquerda não será uma operação de soma, mas de divisão. As clivagens ideológicas existentes entre PS e o PCP e BE pelo seu radicalismo de discurso impossibilitam qualquer possibilidade de união. E nesse aspecto PSD e CDS apresentam clara vantagem, sobretudo agora com a liderança de Passos Coelho e a viragem ainda mais à direita em direcção ao CDS.

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

As Presidenciais no Portugal de 2011



Após o anúncio dos resultados eleitorais, sentamo-nos com um papel e um lápis, fizemos cálculos básicos (regra de três simples) e chegamos às seguintes conclusões:

Cavaco Silva foi eleito presidente com menos de 2.500.000 votos, o que equivale a dizer que mereceu as preferências de 23,16% dos eleitores.

Num outro sentido, 277.712 cidadãos deram-se ao trabalho de ir votar nulo ou branco. Estes, somados com os 5.139.483 abstencionistas (que não quiseram votar ou quiseram e não puderam e, entre burocracias, desistiram) e com os 189.351 votos do candidato Coelho (epifenómeno que agrega essencialmente os votos de protesto) dá um total de 5.606.546 eleitores que não se sentiram representados em nenhuma candidatura minimamente credível.
Ora 58,22% dos eleitores foram pois indiferentes à possibilidade de eleição do chefe de Estado – ou não votaram, ou votaram em branco ou votaram em protesto. Não vamos aproveitar os dados para fazer propaganda monárquica – deixámos apenas à consideração do leitor este facto: 58,22% dos portugueses não se interessaram por esta eleição. Todos os números avançados podem ser conferidos aqui, ou então resultam de cálculos efectuados tendo por base a informação que ali consta.

Quanto à noite eleitoral, como estas eleições tiveram lugar em Portugal todos saíram vitoriosos… Não houve derrotas para ninguém. Vejamos então:
Cavaco ganhou porque foi o mais votado.

Nobre dizia, dias antes da campanha e olhando olhos nos olhos a Alegre, que apenas um tiro na cabeça o impediria de chegar à 2ª volta. Ele não chegou à 2ª volta, nem levou um tiro na cabeça, mas afirmou que a candidatura dele era a vencedora.

Francisco Lopes saiu vencedor porque, um candidato do PCP nunca perde! O povo não cai, o povo não perde!

Alegre, apesar de ter perdido, acaba por não perder dado que, segundo o próprio, começa a sua vida política todos os dias. (Um dos seus apoiantes bloquistas – Louçã – afirmou que a direita já estava a afiar as facas para tomar o poder… E isto é inconcebível! Partidos políticos que queiram tomar o poder? Típica ignorância burguesa…)

Defensor Moura não entrou para ganhar (disse o próprio), introduziu o tema BPN e não congratulou o vencedor… Cumpriu assim o seu objectivo de chatear Cavaco, saindo pois vitorioso neste aspecto e no global, até porque não tinha mais nenhum objectivo.

Mas o único que venceu de facto Cavaco, em 3 concelhos da Madeira, foi José Manuel Coelho… O candidato que não foi a debates! E que derrotou João Jardim nalgumas urnas! Este candidato, sem partido nem movimentos conseguiu quase 5% da totalidade dos votos e ganhou um futuro político na Madeira.

Para o final deste post fica uma crítica ao recém-eleito presidente: um discurso de vitória que serve apenas finalidades de vendetta, mesmo que eventualmente justificada, não serve para unir os portugueses e só prova uma coisa – após a eleição de um árbitro de entre os jogadores, aquele não é o árbitro de todos: nem os adversários o vêm como isento, nem ele vê os adversários como iguais aos apoiantes…

De realçar o bom discurso de Pedro Passos Coelho – o presidente do PSD não se aproveitou da vitória do candidato por si apoiado para fins próprios. As presidenciais não servem para avaliar o Governo, isso é verdade e ele não caiu em tentação. Mostrou integridade!

O post já vai longo e ainda pretendíamos falar da monumental trapalhada com os números de eleitor e, em especial, das declarações bestiais (de besta) do porta-voz da CNE. Mas, para não maçarmos o leitor, tais considerações ficarão, para quinta-feira.



segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

A situação já está a cheirar mal

Que a situação está má para todos já sabemos e que muito sacrifício e esforço se pede constantemente a quem tem de suportar a maldita crise, também parece que estamos a par. Mas como o povo português está ciente da sua capacidade de desenrasque, cujo florescimento remonta a tempos idos em que a sociedade, já madrasta para com o país à beira-mar plantado, obrigou os portugueses, pequeninos e simpáticos a dar o litro e a puxar pela cabeça por forma a criar embustes e esquemas que lhes possibilitassem contornar os anos agrestes que fomos sempre vivendo ao longo destes séculos.

Por isso agora, mais do que nunca, essas capacidades são necessárias e imprescindíveis para sobrevivermos todos à época das vacas magras. Então o que notamos? Negócios adormecidos a desabrochar em tudo quanto é sítio, um comércio de carência para as horas de maior aperto quando já nada parece sorrir. Negócios que levantam dúvidas e desconfianças sobre as verdadeiras intenções, na maioria das vezes pintadas com tons de solidariedade e boa-fé.

Eu saí de casa decidida a ver e cheirar com os meus próprios sentidos no que se está a transformar a crise. Andados 15 minutos tropecei numa loja de compra de ouro usado. Esta realidade sufoca todos os espaços comerciais que estavam desamparados e abandonados por força de outros comércios menos eficazes não suportarem os seus custos de rendas e manutenção. E uma coisa curiosa neste novo mercado de jóias e preciosidades usadas é a aparente inexistência de problemas de concorrência pois, tal como acontece com as lojas dos chineses, em cada rua há duas a três lojas de compra de ouro usado. Estaremos nós assim tão ricos que nem damos conta? Porque se se justifica esta proliferação de estabelecimentos, então significa que as pessoas estão a recorrer com muita frequência à venda das jóias que têm encostadas e sem uso em casa para sarar uma parte do golpe na economia familiar.

Entre esta praga, ainda por se saber se justificada ou não, surge uma outra, cuja abordagem requer algum cuidado salvaguardando-se deste modo as reservas de sensibilidade do leitor. Quem se atreve a sair de casa terá também sido confrontado com outro negócio menos revigorado noutras alturas que é o da venda de coisas usadas, coisas no geral. Segundo o meu entender, todos agradecemos que haja um sítio onde possamos depositar roupas e móveis ou electrodomésticos que já não queremos, aliando a isso uma sensação de dever cívico cumprido por acreditarmos estar a ajudar pessoas que, com mais dificuldades que nós, podem retirar algum uso das coisas que despachamos. Agora: perto de minha casa, numa antiga oficina cujas respectivas áreas se assemelham mais a um armazém, alguém decidiu criar um desses centros de depósito de tralha usada, mas algo massivo, em grande. Há uns dias passei em frente desse negócio, do outro lado da estrada que terá de largura mais do que 10 metros certamente e não havia muito vento, apenas uma leve chuva. As coisas, quase postas no passeio parece que obrigam quem passa a tropeçar nelas para se dar conta de que, ali, há objectos que lhe podem ser úteis e essas mesmas coisas, todas juntas, em grandes quantidades, emanam um odor próprio dos objectos a que já ninguém pega há muito tempo, ou seja, mofo, mofo que alcança mais de 10 metros de distância.

Para quem de direito: ponham-me mão nisto se faz favor…ajudar sim, mas intoxicar os transeuntes não.

domingo, 23 de janeiro de 2011

O regresso de D. Sebastião?

Começa a surgir uma corrente de opinião entre prestigiados especialistas das matérias económico-financeiras segundo a qual inevitavelmente o euro terá os seus dias de existência contados. Em Portugal, alguns analistas consideram esta a única saída que permitirá a sobrevivência das empresas nacionais, a salvação da balança comercial e a retoma da economia.

O euro foi lançado oficialmente em 1999, no cumprimento da terceira fase da União Económica e Monetária, tendo entrado em circulação em 2002. São 13 os países que nos correntes dias usam o euro nas suas transacções civis e comerciais: Portugal, Grécia, Alemanha, Espanha, Holanda, Áustria, Itália, Bélgica, França, Finlândia, Luxemburgo, Irlanda e Eslovénia. A chegada da moeda única europeia alterou os hábitos de consumo dos cidadãos: crédito fácil a taxas de juro reduzidas, inflação diminuta e uma enorme variedade de produtos importados a baixos preços fizeram as delícias de qualquer um. Até que as dívidas se foram avolumando, as taxas de juros aumentando e o descalabro aconteceu. O resto, Caríssimos, vocês já sabem e estão a vivê-lo.

O futuro do euro está longe de gerar consensos. Na actual conjuntura, o euro corre o risco de se desintegrar ou porque as maiores potências económicas da UE se irão fartar de transferir quantias para os países mediterrânicos ou porque estes países se cansarão de ser obrigados a seguir medidas de austeridade impostas para poderem receber essas tais transferências e requererão o regresso da sua autonomia económico-monetária.

O abandono do euro e o regresso da moeda nacional permitir-nos-ia manipular as taxas de câmbio em prol da competitividade portuguesa. Segundo estimativas, o regresso ao escudo seria acompanhado de uma desvalorização entre os 30% e os 40%, o que conduziria à necessidade das nossas empresas compensarem no exterior a queda que se registaria na procura interna, obrigando, assim, a economia a industrializar-se novamente. Se, a longo prazo, poderia constituir uma solução viável, a curto trecho, teríamos o caos instalado, com uma acentuada diminuição do poder de compra, congelamento do financiamento externo, nacionalizações e aumentos incomportáveis do desemprego. Atentemos ao exemplo da Argentina. Durante a década de 90, este país viveu com a sua divisa fixada ao dólar. Deste modo, beneficiou de taxas de juro baixas, crédito fácil e consumo excessivo. Todavia, a dada altura, os mercados deixaram de poder conceder mais financiamentos a este país. O FMI interveio, dadas as grandes dificuldades atravessadas pelos argentinos, não tendo a economia resistido. O Governo deixou a divisa cair, os cidadãos levantaram todos os seus depósitos bancários, colapsando o sistema financeiro. A Argentina, ao longo dos anos, foi recuperando faseadamente a sua competitividade, contudo, não foi fácil e o trilho foi penoso.

Esta semana, um professor italiano sugeriu como sendo uma inevitabilidade o abandono do euro, caso se verifique a reestruturação da dívida soberana de um ou mais membros da UE, explicando que o euro poderá dar origem a duas novas divisas: um euro mais forte, para os países do centro europeu, e um euro mais fraco, para os da periferia.

Não creio que a saída do euro seja uma hipótese, mas sim uma impossibilidade. O custo seria elevadíssimo e efectuando uma análise custo-benefício, não sairíamos em nada a lucrar. A nova moeda iria desvalorizar-se e o Governo e a Banca não conseguiriam suportar todos os custos para fazer face a essa dívida.

O que é certo é que 6 em cada 10 portugueses prefere voltar a usar o escudo em vez da moeda única, estando a insatisfação nacional acima da média dos 13 países da Zona Euro. E o mais curioso, e concluindo, é que muitos portugueses ainda mantêm em casa notas de escudo, estimando-se em 109,6 milhões de euros o montante que o Banco de Portugal ainda não recolheu. Se este dinheiro estivesse em circulação, os funcionários públicos já não conheceriam as reduções salariais a que estão a ser sujeitos já este mês.

A vida está má, está! Até para os marqueses!

E como hoje era dia de eleições, ainda bem que votaram em consciência!

sábado, 22 de janeiro de 2011

Dia de Reflexão

Na sequência do fim da campanha presidencial de ontem, pensávamos nós, no dia de hoje, depor aos augustos pés do leitor uma pequena súmula da dita cuja e reflectir um pouco sobre as virtudes e os vícios de cada candidato. Pura ingenuidade, caro leitor! Pura inocência!
Assim que manifestamos esta nossa vontade, logo um amigo nos diz:
- Ah! mas não podes! Amanhã é dia de reflexão!
Ao início, não o queríamos acreditar (porque o nosso amigo é um pouco folgazão):
- Mas estás a falar a sério?
- Sim, estou a falar a sério. Amanhã é dia de reflexão. Não podes falar sobre as presidenciais. É ilegal. – disse ele.

Com efeito, hoje, segundo o legislador é dia de reflexão. E dia de reflexão equivale a colocar uma mordaça sobre a boca, impedindo as pessoas de livremente exporem as pessoas sobre um tema sobre o qual se irão pronunciar no dia seguinte. Pelo que, para o legislador, o acto de reflexão é feito em silêncio. Para o legislador, a discussão de ideias consiste no seguinte processo: a pessoa dobrar-se, colocar-se em posição de chinês, cerrar as pálpebras, e meditar, mas em silêncio – tal como o faria um budista diante de Buda. Comunicar, porém, essas ideias, expô-las – cometer tal atrocidade isso não é possível.

O nosso legislador manifesta uma suprema confiança no discernimento dos portugueses. Julgando-os incapazes de pensar e decidir pela sua própria cabeça, delibera que na véspera de se pronunciarem sobre as presidenciais, todos se deverão calar sob pena de se influenciarem mutuamente. O legislador português pensa, portanto, que os portugueses são incapazes de avaliar o mérito intrínseco a cada ideia e que, consequentemente, são inaptos a separar o trigo do joio. Nos tempos que correm, em que a liberdade se pretende tão plena e tão absoluta quanto possível, e livre da intromissão do legislador, este senhor decreta o português incapaz para pensar e, velando pela sua segurança, silencia os indivíduos que podem, nefastamente, influenciá-lo e levá-lo a tomar uma determinada posição. A falta de discernimento é aquilo a que comummente se chama de estupidez: é uma inaptidão para ligar uma causa a um efeito. É isso que o legislador chama aos portugueses: estúpidos porque não são capazes de pensar por si, então o legislador, investido de toda a sua soberana razão, pensa pelos portugueses. Chama-lhes de pedantes porque não depositam confiança nele e no seu entendimento, e por consequência, ele é incapaz de distinguir imediatamente o que é justo num caso particular.

De entre todas as espécies que existem no universo, o homem é a única capaz de reflectir, de transformar abstractamente todo o elemento intuitivo num conceito não intuitivo da razão. O legislador português julga que essa é uma tarefa do eremita, solitária, e que por ser embaraçosa, deve, por isso, permanecer no interior dos homens.

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

No Interior

Sexta-feira.
Dia de início de fim-de-semana, dia de reflectir sobre escolhas e dia de reflectir, também, sobre Portugal. O mundo é grande e o nosso País, lá pelo meio, é como um pequeno ponto num Universo tão vasto que até à nossa compreensão chega a escapar.
Agora, divagações à parte, o que será o Interior português dentro desse tão incomensurável Universo?

Lord Nelson

"O Interior é uma terra sujeita a desgraças: falta de investimento, envelhecimento da população, dificuldades de acesso a infra-estruturas básicas e explosões no café do Arsénio..."


A Marquesa

"Em honra a todos aqueles que fazem parte do Sul Interior de Portugal, e porque, confessemos, já estamos com saudades destes senhores:"


Carlos Jorge Mendes

"Eu quando penso no Interior - penso em sofisticação, em modernidade, em exotismo. Naturalmente que as mulheres do Interior não são excepção a esse quadro de pensamento. E aqui fica uma pequena amostra do que o Interior traz de melhor em mulheres:"


M. Pompadour

"Comprovando a todos que o Interior é ainda uma fonte de futuros sucessos e de inexploradas áreas profissionais."

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Estado de Polícia


A forma típica de luta dos sindicatos portugueses é inconsequente: arruadas com palavras de ordem, ditas pelos trabalhadores que, com contrato de trabalho a termo incerto, pouco têm a temer. Findas as palavras de ordem e dada a entrevista para o telejornal, dispersam para combinar outro dia para repetirem a façanha… Ou então é a greve, essa coisa inventada só para incomodar (lembremo-nos dos transportes) os restantes. Os sindicatos são organismos anacrónicos, que ainda perspectivam o mundo como e estivéssemos no PREC, deixando-se instrumentalizar pelos partidos políticos da esquerda mais radical.





Não gostamos de sindicatos nem da sua retórica. Mas estamos dispostos a bater-nos até às últimas consequências para que eles possam dizer o que quiserem e manifestar-se à sua vontade.


Segundo noticiado pelo Público, na passada terça-feira, estando a manifestação contra os cortes salariais junto à residência oficial do primeiro-ministro, a terminar, alguns sindicalistas teriam tentado dirigir-se ao Parlamento, tendo sido impedidos pela Polícia de Segurança Pública.

Nas imagens podemos ver um polícia de bastão levantado a ameaçar os manifestantes, enquanto outro empurra um manifestante para o afastar do perímetro da residência oficial. No mesmo local, um sindicalista tenta esquivar-se à mão de um polícia que parece apertar-lhe o pescoço.
Tal atitude da Polícia de Segurança Pública é completamente inaceitável e revela que a consciência axiológica dos agentes de autoridade em questão se encontra num estado deveras primitivo. E o mal está mesmo aqui – aqueles agentes, dizendo-lhes que são “de autoridade” esquecem-se que existem para servir os cidadãos e não para os oprimir.


É absolutamente necessário um novo paradigma para a administração pública – a administração tem de deixar de ser autoridade para passar a ser administração serviço. Um polícia é antes de mais um cidadão e não pode nunca esquecer-se disso.
Os agentes aqui envolvidos agem como cães-de-fila do regime, oprimindo os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, que também são sindicalistas. Nada justifica bastonadas em manifestantes pacíficos. Nada! É por causa de pessoas como estas que os regimes autocráticos e totalitários podem existir… São eles a mão que segura o bastão. Mas, pobres deles, não percebem que coarctando a liberdade do seu semelhante acabam por coarctar também a sua, pois nada mais são que funcionários de um Estado que está demasiado habituado a fazer o que lhe apetece. Se alguém nos quiser processar esteja à vontade – mande um e-mail o endereço que está aqui à direita que forneço os dados necessários e vemo-nos em tribunal!

Não concordando com os sindicatos, defendo até às últimas consequências que eles sejam livres de dizer as barbaridades que entenderem.


As condutas dos agentes são numa palavra – medíocres. E, face às imagens existentes, deveriam ser movidos processos disciplinares aos agentes em questão. Que tenham muita vergonha!

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Reforço do Fundo de Estabilização ou Eurobonds?

O Sr. Durão Barroso parece, finalmente, ter ganho consciência do cargo que desempenha e das suas responsabilidades na liderança da Comissão Europeia. Isto porque, autonomamente, livremente, independentemente, o Sr. Barroso decidiu fazer uso da matéria cinzenta que existe entre o seu crânio, sem consultar a Sra. Merkel e ter o desplante, o descaramento, e a desfaçatez de dizer que o Fundo Europeu de Estabilização Financeira (FEEF) necessita de ser reforçado. Isto, segundo noticia, a Der Spiegel, deixou a Sra. Merkel furiosa – porque não foi previamente informada. E supomos que deixou igualmente a prestigiada Der Spiegel aborrecida. Porque a prestigiada revista alemã largou a compostura e a imparcialidade jornalística para insultar positivamente o Sr. Durão Barroso. Eis algumas das tiradas irónicas da Der Spiegel:

In Azerbaijan, Barroso is a great man”.

Algo irónico, não parece? É que aproveitando a visita de Barroso ao Azerbaijão para tratar do fornecimento de gás natural à Europa, o Sr. Barroso foi algo bajulado pelo Presidente do País, o Sr. Aliyev. Pelo que, para a Der Spiegel, o Sr. Barroso não consegue ganhar respeito na Europa, mas tão-só no muy reputado Azerbaijão. Falamos, obviamente, no Presidente da Comissão Europeia: um traste andrajoso.

The man with a reputation for being more of a pussycat than a lion suddenly wants to be the savior of the euro.”

Mas esta afirmação parte, de facto, a loiça toda. Numa peça jornalística que se pretende informativa e imparcial de forma a que os cidadãos possam informar-se e autonomamente retirar as suas próprias conclusões – note-se o tom que é utilizado nesta frase que soa praticamente a escárnio.

Olhemos, no entanto, a substância da questão principal – o reforço do FEEF. A Alemanha não se opõe totalmente ao reforço do FEEF, mas opõe-se ao timing. A Sra. Merkel e o Sr. Schauble defendem que o FEEF não está pressionado e tão-pouco a sua capacidade esgotada. Para além disso, dizem que, recentemente, Portugal e Espanha foram bem sucedidas nas colocações de dívida na semana anterior. Á Sra. Merkel e ao Sr. Schauble citamos a opinião do Nobel da Economia de 2008, o Sr. Krugman: com mais umas emissões de dívida a 6,7% e veremos o que os políticos apelidam de sucesso. Essas emissões de dívida apenas podem ser consideradas de sucesso se algo for feito no curto prazo, ou seja: já.
E mesmo o reforço do FEEF pode revelar-se curto – e na minha opinião assim o será. Porque qual é o problema do actual FEEF? Continua a ser um fundo cujas garantias são asseguradas pelos governos nacionais. Pelo contrário, as já muito faladas eurobonds responsabilizam conjuntamente todos os estados da zona euro, assegurando e serenando as colocações de dívida no mercado. É a única verdadeira arma de que a zona euro dispõe para acabar com a crise. A solução que a Alemanha defende é curta: é suficiente para acalmar os mercados um par de dias, para depois voltarmos ao mesmo velho problema.
E mesmo assim, a Alemanha não concede o reforço do FEEF sem que alguns desejos lhe sejam atendidos: o leitor já adivinhou – mais austeridade. A Alemanha pretende, com efeito, o reforço da coordenação na zona euro – mas segundo os seus termos, e segundo os ditames da austeridade. Já o reforço da coordenação da zona euro através da criação de uma agência europeia de dívida que transforme as obrigações dos Estados soberanos em obrigações soberanas da zona euro – nem pensar. Eis então o que a Alemanha pretende: a Alemanha até está disposta a aceitar o alargamento da capacidade do FEEF, mas ir para além desse alargamento nunca! Um reforço modesto de FEEF, portanto e nada mais.
Eis o que a este propósito pensa o Sr. Wolfgang Munchau, respeitado colunista do Financial Times, e melhor que tudo, imparcialmente alemão, comparando as alternativas reforço do FEEF e eurobonds:

“Não está bem claro se a opção FEEF menor/incumprimento seria mais barata. Pelo contrário, para o sistema no seu todo, seria provavelmente mais dispendiosa e arriscada.”

Parece, pois, claro o caminho a seguir: falta é coragem política. E a Europa poderá pagar durante décadas a cobardia da sua actual geração de políticos.
PS: Apesar de o post anterior do Lord Nelson ter incidido sobre a questão tunisina, aqui fica ao leitor uma sugestão de leitura sobre o mesmo tema - uma coluna de opinião brilhante de Abdellah Taia, vencedor do Prix de Flore 2010, no jornal Le Monde, intitulada Le réveil du peuple arabe.

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Tunísia




Um regime tão velho quanto eu caiu.

A Tunísia anda na boca do mundo porque a partir do desespero de um homem (que se imolou em Tunes, protestando por terem proibido vender os seus produtos nas ruas) o descontentamento do povo escalou ao ponto de fazer tombar o presidente Ben Ali .

Há cerca de um ano e meio estive na Tunísia. Fiz cerca de 3000 km em estradas africanas, indo para longe dos resorts para europeu ver, correndo o país de lés a lés e nunca suspeitei que o fim daquele regime autocrático estivesse iminente. É claro que nenhuma ditadura se aguenta eternamente (como nenhuma democracia) mas as tensões sociais estavam bastante camufladas: existiam cartazes do presidente em todas as terras, fotografias em todos os estabelecimentos, forte presença policial e alguma censura nos jornais nacionais (pelo menos nas edições em francês). Em todas as cidades onde estive, tanto no longínquo e árido sul, como no mais mediterrâneo litoral norte, existia uma calma aparente. Mas uma calma de país sem rumo – inúmeras pessoas deambulavam na rua, indiciando uma elevada taxa de desemprego; polícia a patrulhar as ruas com armas semi-automáticas e um silêncio geral sobre assuntos políticos.
No entanto não havia notícia de problemas, viam-se obras em curso promovidas pelo Estado, nenhuma manifestação e, de resto, business as usual.

Em Tunes encontramos uma Paris árabe, com aquela decadência típica de capital de ex-colónia, com os seus belos edifícios já velhos para lá de antigos, aromas de especiarias no ar e uma animada vida nocturna, com muitas pessoas a passearem-se junto ao mediterrâneo, com estabelecimentos abertos, num cenário de belle époque. Foi porém nesta cidade apercebi-me de como o regime estava atento e interessado naquela paz: no foyer do hotel onde estava alojado, conversava em voz alta com outros estrangeiros e gracejei, em francês (língua lá bem entendida) com o facto de se poder ver a evolução de Ben Ali ao longo dos tempos, por causa dos inúmeros retratos. Depois de o fazer, fui informado por um funcionário que naquela terra, era má educação gracejar sobre Monseiur Ben Ali: eis o poder autocrático.

Tal como nós não o esperávamos, também não o esperou decerto o presidente Ben Ali, apanhado de surpresa e forçado a fugir para o Reino da Arábia Saudita, deixando no país um vazio de poder. Ainda foi tentado um coup d’état pelo primeiro-ministro (aliado de Ben Ali) mas foi prontamente denunciado pelo presidente do parlamento Faoud Mebazza.

É com agrado que verifico que os presos políticos vão ser libertados e um governo de unidade nacional se está a formar. Esta poderá constituir uma oportunidade única para a democratização um país que, desde a sua independência em 1956 conheceu apenas dois presidentes. Mas também pode ser a ruína de uma economia muito centrada no turismo… Estes tumultos farão com certeza diminuir as receitas, aumentar o desemprego e agravar as tensões sociais… Será um caminho difícil mas pode significar a liberdade.

No entanto é de recear que a instabilidade tunisina alastre a todo o Magrebe – já existem manifestações no Egipto, Argélia, Marrocos e Jordânia. Estas, tendo por base o aumento dos custos dos bens essenciais, podem assustar os regimes desses países e acabar tudo isto num banho de sangue.

Uma última nota para dar conta ao leitor que o referendo no Sudão do Sul, assunto deste post, correu bem, sem incidentes de maior e foi validado pelos observadores internacionais. No final deste mês conhecer-se-ão os resultados e talvez, haja ali um novo país.

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

De 2011 para todos vós

Caríssimos leitores, antes de mais cumpre-me pedir perdão por tão longa ausência, o interregno durou mais tempo do que terei previsto inicialmente e, por isso, peço desculpa a quem pensou que nunca mais ia ter que aturar as minhas balelas e agora se vê nesta situação de impotência face ao meu regresso.

Pois parece que, entretanto, eventos de enorme relevo social tais como o aniversário do Opinador de Veludo marcaram as épocas festivas e, apesar de não ter referenciado na altura que estava extremamente satisfeita por ver aquilo que era uma espécie de projecto dos meus dois estimados colegas, Lord Nelson e Dr. Carlos tão bem sucedido e a crescer com o contributo de outros como eu, congratulo hoje vossas excelências por terem tido a ousadia de se atreverem a publicar opiniões tão pertinentes e mordazes sobre o estado da vida política, económica e comum portuguesa fazendo votos que, com a maior ou menor dedicação de todos nós, consigamos manter este blog regularmente visitado por pessoas que não as nossas próprias pessoas.

Posto isto e atendendo a que muita coisa aconteceu desde que a minha ausência marcou a vida cibernética decidi realçar aquilo que, no meio da confusão noticiosa típica da entrada no novo ano, me despertou a atenção. Então vai haver eleições é? É que pensei que depois do bárbaro homicídio dessa figura mediática que era o Carlos Castro e as trágicas cheias do Brasil essa coisa das eleições tinha deixado de ser importante e seria adiada! Se não foi mais valia que fosse, porque tenho reparado que ninguém está muito interessado em decidir-se sobre quem votar, mas sim sobre se o Renato Seabra deve ou não ser censurado em praça pública. As pessoas estão confusas e eu também.

Muito se diz sobre a importância que os media têm nestas alturas em que a vida politica está em fase de decisões importantes, em como é essencial que se foquem e levem ao povo português o sumo que, depois de espremidos, os candidatos têm para oferecer à sociedade, mas a verdade é que isso acontece cada vez menos. E eu vinha censurá-los, espalhar o meu descontentamento pela classe jornalística em si e as más escolhas que insistem em fazer no que diz respeito ao alinhamento das notícias e todas essas coisas que, quem ainda vai estando minimamente atento, se apercebe quando pensa em tudo o que se passa no país e acompanha o jornal, mas a verdade é que se avaliarmos as coisas pelo lado do interessante e curioso e não do importante, percebemos bem as escolhas que as redacções fazem. No entanto, se de facto há eleições este mês como andam para aí a dizer previno já que, pelo que tenho ouvido, muita gente vai votar no Carlos Castro.

domingo, 16 de janeiro de 2011

Inconstitucionalissimamente

opinámos aveludadamente aqui acerca da instituição do exame de acesso ao estágio de advocacia e sempre nos insurgimos veementemente contra esta medida criada unilateralmente pelo actual Bastonário da Ordem dos Advogados.

Pois no decurso da passada semana, e após diversos pedidos de fiscalização da constitucionalidade do regulamento da OA que modificou as regras de admissão ao estágio (recorde-se que se antes todo o licenciado em Direito podia inscrever-se como advogado estagiário na OA, depois deste regulamento, tornou-se necessária a realização prévia de um exame de acesso ao estágio ou então a detenção do grau de Mestre, caso em que se estaria dispensado do referido exame), o Tribunal Constitucional declarou inconstitucional o exame de acesso ao estágio.

Marinho Pinto não se cansou de justificar a urgência na instituição deste exame, dada a massificação da profissão e a necessidade de garantir a qualidade do exercício da actividade profissional da advocacia, ressaltando o facto de que o Centro de Estudos Judiciários, escola que forma os futuros magistrados, também submete os seus candidatos a exames de acesso.

Não é nossa intenção repetir tudo quanto já por nós foi aqui afirmado acerca desta matéria, mas apenas relembrar que esta medida é notoriamente uma forma de limitar o acesso à profissão, tendo sido este mesmo fundamento usado por duas licenciadas em Direito que, junto do Provedor de Justiça, requereram a sua intervenção, pedindo a fiscalização da constitucionalidade do supra citado diploma instituinte do exame de acesso ao estágio. Estas mesmas duas licenciadas instauraram igualmente no Tribunal Administrativo de Lisboa uma acção administrativa para que lhes fosse permitido o acesso imediato ao início do estágio, sem necessidade daquele exame. O Tribunal julgou a acção procedente, despoletando-se então a polémica no seio da OA. Muitos outros licenciados em Direito seguiram as pisadas destas duas licenciadas. “Que ninguém pense que vai entrar na Ordem só com um diploma de licenciatura!”, disse, na altura, o Bastonário, insistindo na emergência da melhoria da preparação dos licenciados, afirmando também que “o Regulamento da OA não é ilegal e bater-me-ei com todas as minhas forças contra o facilitismo”.

O que é certo é que o Tribunal Constitucional “se bateu contra a força de Marinho Pinto”, declarando inconstitucional o referido diploma, podendo ler-se no acórdão: “declara-se, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade do art. 9º-A,1 e 2 do Regulamento Nacional de Estágio, da AO, na redacção aprovada pela Deliberação n.º 3333-A/2009, de 16 de Dezembro, do Conselho Geral da OS, por violação do disposto no art. 165º, 1, b) da CRP”.

Esta decisão do TC vai no sentido de que este exame de acesso ao estágio é uma limitação à liberdade de acesso e de escolha de profissão, liberdade esta que consta do elenco dos direitos, liberdades e garantias constitucionalmente consagrados (art. 47º). Por conseguinte, a sua restrição só pode ser efectuada por via de lei formal, ou seja, lei da Assembleia da República ou decreto-lei autorizado do Governo. Ora, como esta restrição foi efectuada por um mero regulamento de uma ordem profissional, assistimos a uma violação clara do preceituado na Constituição da República Portuguesa.

Em declarações posteriores à publicidade do acórdão, Marinho Pinto afirmou acatar a decisão do TC, mencionando porém que não baixará os braços, porquanto irá desenvolver esforços junto do Governo para que seja criada nova legislação que regule o acesso ao estágio mas, desta vez, ainda mais exigente. Assim sendo, apenas os Mestres em Direito poderão iniciar o estágio de advocacia. “É uma pena, porque queríamos escolher, entre os novos licenciados pós-Bolonha, aqueles que fossem bons”, afirmou. Com as relações agudizadas como as conhecemos entre o Bastonário e o actual executivo, duvido que Marinho Pinto consiga levar a sua avante. A ver vamos…

O mais inacreditável é quererem que os licenciados em Direito “morram na praia”, uma vez que, após um penoso curso de 4 anos, com milhões de páginas estudadas, com dezenas de exames escritos e orais, com elevadas propinas pagas e com sacrifícios financeiros e emocionais inestimáveis, se considere que um licenciado em Direito ainda não se encontra habilitado para iniciar o estágio (o estágio, note-se!). Se querem combater a massificação da profissão, tenham a coragem de reduzir o número de vagas nas faculdades públicas e encerrem os cursos de Direito nas faculdades privadas. As legítimas expectativas dos licenciados são defraudadas de dia para dia e o mais grave é que isto parece não ir nunca acabar! Senhores, nós criticamos o exame não por não nos sentirmos habilitados para o realizar, mas porque constitui mais um dos imensos obstáculos que temos e enfrentar para conseguirmos começar a trabalhar! Se o estágio não é, via de regra, remunerado e se ao longo da sua realização temos ainda um sem-número de exames, para quê estarmos a complicar ainda mais? Limite-se o acesso à profissão logo à entrada dos cursos de Direito e não à sua saída!

A vida está má, está! Até para os marqueses!

O que vale é que esta semana recebi uma notícia que me deixou a alma feliz, feliz, feliz: a melhor banda do Mundo vem a Portugal. E eu lá estarei! 06/07/2011 - Coldplay no Optimus Alive. Para ouvir e chorar literalmente por mais!...


sábado, 15 de janeiro de 2011

Cenas da Campanha Presidencial

O Sr. Pedro Passos Coelho, ao acordar, enfiara as chinelas nervoso e inseguro: nessa noite, iria, pela primeira vez, envolver-se publicamente numa acção de campanha com o Sr. Presidente da República. E essa insegurança devia-se à incapacidade do Sr. Passos Coelho brindar nessa noite o Sr. Presidente da República com uma palavra fácil e fluida que brilhasse naqueles primeiros momentos embaraçosos dos cumprimentos. Depois de calçadas as chinelas e vestido o seu robe de chambre, o Sr. Passos Coelho caminhou lentamente para a sua toilette: lavou a cara, desfez a barba. E durante 45 longos minutos ensaiou frases cheias de efeitos para dizer ao Sr. Cavaco Silva. E quando finalmente a julgou encontrar, logo partiu para a rua de São Caetano. À noite, quando avista o Sr. Presidente da República, o Sr.Passos Coelho, avança confiante, seguro, desenha um longo sorriso, estende a mão ao Sr. Presidente e diz com a maior das artificialidades:
- O senhor tem estado em grande forma.
O Sr. Passos Coelho continuava a sorrir largamente, enquanto sacudia a mão do Sr. Presidente – as pregas do rosto em volta dos lábios realçando-se vivamente. À semelhança de um artista que acaba de realizar o seu número, o Sr. Passos Coelho esperava agora os aplausos. O Sr. Cavaco, no entanto, permaneceu imóvel como uma estátua, apertando-lhe a mão. E quando se esperava que o Sr. Presidente tivesse a gentileza de dizer alguma ao Sr. Passos Coelho, retribuindo-lhe a gentileza – eis que nada lhe disse (ah! insensível!) e passou, logo em seguida, a cumprimentar as outras pessoas que ali estavam. O sorriso postiço do Sr. Passos Coelho recolheu-se; deu um passo atrás, embaraçado e – imaginamos nós que, naquele momento, se gostaria de esconder eternamente entre a penumbra. O incómodo entre ambos foi evidente. A frase espalhafatosa de Passos Coelho nem sequer mereceu uma palavra de consolo de Cavaco.

Pouco antes deste dia de campanha, o Sr. Presidente da República, questionado pela imprensa, afirmou que entendia que existia um elevado risco de haver uma crise política em 2011. Segundo o Sr. Presidente da República essa possibilidade apenas faz aumentar a responsabilidade dos portugueses nesta eleição uma vez que será necessária uma pessoa altamente capaz para lidar com esse cenário: - capacidades que se encontram, obviamente, divinamente, reunidas em Cavaco. Esta afirmação provocou algum espanto entre a imprensa já que o Presidente sempre se preocupou em afastar tal cenário pois tal seria negativo para a imagem do país.
Em função desta polémica, logo apareceu pressuroso o seu mandatário no Porto, o Sr. António Lobo Xavier, dizendo que é perfeitamente óbvio que há risco de uma crise política. Caro Dr. António Lobo Xavier, queira V. Ex.ª considerar o seguinte exemplo: V. Ex.ª está à mesa jantando com os seus convivas; acabam de tomar a dessert; e V. Ex.ª sentindo um pouco do peru do jantar entre os dentes, estouvadamente, saca de um palito e começa a palitar os dentes. Obviamente que na realidade V. Ex.ª nunca cometeria tal imprudência. E porquê, Sr. Doutor? Por pudor, V. Ex.ª. Porque V. Ex.ª preferiria arriscar um tímido sorriso quando alguém lançasse um leve gracejo, revelando o peru entre os dentes do que escandalosamente sacar do palito e começar a palitar os seus dentes diante de toda a gente. V. Ex.ª fá-lo por convenção, por etiqueta: porque sabe que não deve fazê-lo.
O mesmo se passa com o nosso caso. É possível que possa haver uma crise política em 2011? É possível sim. Deve o Presidente da República dizê-lo, confessá-lo abertamente na presente conjuntura? Obviamente que não. E porque o fez então? Por motivos estritamente eleitorais. Para triunfalmente argumentar que em função da possibilidade da ocorrência de uma crise política é necessário um Presidente experiente e hábil para lidar com estas situações complexas. E, por coincidência, esse Presidente experiente e hábil é precisamente o mesmo que antevê a crise política. Quanta modéstia, V. Ex.ª! Mas sabe que mais V. Ex.ª? Este tipo de argumentação poderá, de facto, convencer meia dúzia de parolos assustados que se deixam intimidar por esse tipo de argumentação, mas é um rude golpe no indispensável perfil com que um Presidente da República se deve revestir: e o Presidente da República deve ser uma pessoa prudente e, sobretudo, que defenda os superiores interesses do País. Interesses esses que, nesta fase da conjuntura política, económica e social, não passam pela necessidade da primeira figura política do País chamar a nossa atenção – e principalmente a atenção dos mercados – para uma eventual crise política no País com todas as consequências que dai advém.

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Das Gaffes

As Gaffes são do melhor que há. Não para quem as comete obviamente. Mas para quem delas se apercebe. Não há nada melhor do que uma mistura explosiva de palavras que nos leva às lágrimas de tanto rir ou do que um pensamento inconveniente que é verbalizado sem que o consigamos controlar.

Quem é que não se lembra da melhor gaffe de sempre do nosso Primeiro (no meio de uma imensidão delas, note-se!) quando afirmou que "Cada um de nós deve contribuir para tornar Portugal um país mais pobre!". Ai, Trocas-te, Trocas-te... Só tu e Deus sabem a verdade!


Por Lord Nelson:

Simplesmente não consegui escolher qual a melhor gaffe da televisão em Portugal... Isto é mesmo, o nosso país: homens do nuorte e velhos desorientados... Enjoy






Por Letícia, a Marquesa:

Pobres dos jornalistas que têm de suar as estopinhas para poderem ter o pão-nosso-de-cada-dia, aturando seres de outro planeta ou assumindo o risco de um inesperado retorcimento de língua...




Por Carlos Jorge Mendes:

Porque os políticos são iguais a qualquer um de nós - com cérebros, por vezes, estúpidos -, mesmo na América, onde se gaba a qualidade da democracia, aqui fica um exemplo vindo da Cúpula do Poder: o Sr. Joe Biden, exaltando a sua nação, pedindo inclusivamente a homens em cadeira de roda que se levantem no auge do seu júbilo.

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Loiras ao Poder





Talvez o amigo leitor não saiba quem é a pessoa nesta foto. Se lhe disser que se chama Marine, provavelmente em nada o ajudo. Mas se lhe disser que tem por sobrenome Le Pen aí já se fará, decerto, luz. Com efeito esta loira de 42 anos, advogada (portanto legalmente loira) é filha de Monsieur Le Pen, líder carismático da extrema direita francesa e a sua mais provável sucessora.

No próximo congresso desta força política que terá lugar no próximo fim-de-semana, Marine Le Pen irá a votos contra Bruno Gollnisch, um integralista católico, à direita da direita.

Madame Le Pen sucederá assim a seu pai, Monsieur Jean-Marie Le Pen, e deve ser vista como uma força a ter em conta nas eleições presidenciais de 2012, por três motivos: primeiramente, as sondagens de intenção de voto para 2012 dão-lhe já à partida 14% dos votos (o que muitos candidatos presidenciais não presidenciáveis em Portugal gostariam); em segundo lugar, Marine tem um discurso menos liberal (economicamente, bem entendido) que o seu pai, o que, à direita populista em tempos de crise pode ser benéfico. Por fim, o seu discurso nacionalista e anti-muçulmano na amálgama multicural francesa, poderá muito bem captar votos de uma direita mais conservadora, desiludida com o normal desgaste da UMP de Sarko, no poder desde 2007.
Convém relembrar que a Front National é uma força política a ter em conta pois, no ano de 2002, foi o seu candidato (Le Pen) que disputou a segunda volta para as presidências contra Chirac.
A extrema-direita anda mais clean, com menos bafio a sacristia e mais amarela, claro está. Loiras ao Poder? A ver vamos…

E já que falamos de Marine, lembramo-nos disto:

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

O Problema Europeu

O Sr. Issing, antigo economista-chefe do BCE, num boletim do OMFIF (Official Monetary and Financial Institutions Forum) divulgado terça-feira, mostra-se especialmente preocupado com o futuro da zona euro e com o desperdiçar de oportunidades por parte dos respectivos líderes para corrigir e fortalecer a governação da zona euro, que deverá ser cada vez mais estreita.

Com efeito, o que mudou na Governação da Zona Euro desde a crise de dívida soberana? Se haviam problemas a serem corrigidos, entretanto identificados com o despoletar da crise, o que foi feito? Passará a solução apenas pelo reforço das medidas de sanção para os membros violadores do Pacto de Estabilidade e Crescimento? Mas se até a própria Alemanha possui uma dívida pública em desrespeito com o mesmo.

O que foi feito pois desde a crise de dívida soberana e foi isso suficiente para resolver os problemas? Sabemos que os problemas passam sobretudo pela necessidade de maior coordenação das políticas dos países-membros de forma a que a Europa, como um todo, cresça de forma mais harmonizada e competitiva. Eis então o que foi feito desde o momento em que a Grécia recorreu à União Europeia e ao FMI para resolver os seus problemas.

A aprovação de um mecanismo de resgate de emergência para os membros mais endividados da zona euro no valor de 750 mil milhões de euro, inicialmente meramente temporário, mas em 2013, com carácter definitivo; igualmente a partir de 2013, os credores dos países da zona euro poderão suportar parte das perdas que esses países enfrentem caso entrem em incumprimento; recentemente, depois de um período de acalmia, o BCE voltou em força aos mercados de dívida, comprando títulos de dívida dos países em maior dificuldade, isto já depois de decidido um aumento do seu respectivo capital.

Mas – todas estas medidas, resolvem elas o problema de fundo da Zona Euro? Foi feita alguma coisa para corrigir os desequilíbrios existentes entre os Membros? Que políticas foram tomadas para que haja maior coordenação e harmonia no Governo da Zona Euro e da Europa? Apenas um reforço da componente orçamental, onde Bruxelas poderá controlar mais proximamente, os orçamentos nacionais.

Mas a isto se resume a acção europeia na resposta a uma crise que ameaça não só a estabilidade e a sustentabilidade da união monetária, mas também a união política da Europa. Claramente insuficiente.

Mas este é apenas parte do problema. A crise de dívida pública colocou claramente em evidência as diferenças de competitividade entre a Europa do Norte e a Europa do Sul; mas colocou também em evidência uma mentalidade alemã, uma mentalidade irlandesa, uma mentalidade grega, e não uma mentalidade europeia na resolução dos problemas. Isto é, a verdade é que a Europa continua bastante distante do Federalismo. Nem ele se afigura, para já, desejável: é que os Estados estão longe de terem a confiança necessária para abdicarem do seu poder e confiá-lo a uma terceira entidade. E por aqui passa grande parte do problema da Europa.

Toda a união política, económica, monetária e agora orçamental é inútil se ela não for revestida do elemento aglutinador de povos: o sentimento de pertença a uma comunidade. E cada cidadão, cada político continua a encarar os problemas europeus como sendo um problema alemão, um problema irlandês, um problema português, encarando-o segundo a perspectiva que melhor convém a esse país, mas não o encara como um problema europeu e como um problema que afecta a Europa. Logo, a solução para o problema tende a ser definida consoante os interesses das nações mais poderosas face à ausência de uma Comissão politicamente forte. Isto apresenta logo um grande problema: é que muitas vezes o interesse das nações mais poderosas não coincide com o interesse da Europa.

Enquanto esse sentimento faltar, os cidadãos alemães permaneceram cépticos quanto ao euro e saudosos do marco, porque o marco proporciona-lhes um sentimento de pertença; os políticos alemães encararam os países periféricos como ameaças ao seu crescimento porque respondem perante os eleitores alemães e não perante a Europa. Assim, cada país tenderá sempre fatalmente a encarar um certo problema europeu da sua perspectiva, da perspectiva alemã, da perspectiva grega, da perspectiva portuguesa, e nunca como um problema que aflige toda a Europa e que exige que a solução a encontrar diga respeito a toda a Europa.

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Acções de Campanha





Tínhamos pensado não fazer um post sobre uma eleição, cuja existência discutimos. No entanto, a realidade impeliu-nos e lá vai disto:

A campanha eleitoral portuguesa a que assistimos demonstra a falência da república portuguesa.

Na preocupação, diga-se compreensível, de assegurar a eleição, os candidatos alimentam ou gastam tempo a refutar acusações sobre aplicações financeiras, rendas pagas em dinheiro ou textos publicitários, que esvazia toda a discussão útil sobre os concretos problemas do país e as eventuais soluções.

Assim uma das alegadas virtudes do sistema republicano, ou inexiste de todo, ou inexiste agora: as presidenciais não servem para reflectir sobre a organização política, não serve para o país se reinventar. Serve apenas para um animado lavar de roupa suja que em nada dignifica a república que tão contestada anda e serve para gastar rios de dinheiro.
As pessoas andam confusas se estão a votar para o BPN, para o BPP, para a AMI ou para o circo…

Com tantas discussões, mesmo que infundadas, sobre o passado político e privado dos candidatos, lançou-se uma sombra sobre a sua honestidade. A realidade torna evidente que aqueles jogadores não poderão ser árbitros.

Temos uma campanha eleitoral vazia de ideias, repleta de ataques. Tal agressividade de todas as partes acarretará uma consequência – a divisão dos cidadãos e, por via dela, muito dificilmente o próximo presidente, seja ele quem for, conseguirá ser o presidente de todos os portugueses.

E note-se um pormenor interessante nos candidatos da esquerda: numa eleição que se quer supra-partidária, um deles é indigitado pelo comité central do seu partido, vindo do anonimato para a ribalta, apenas por causa daquela deliberação – poderá este ser árbitro ou estará sempre condicionado por quem lhe deu o ser (mediático). O outro – que consegue a proeza de ter um pé no governo e um pé na oposição – clama contra aqueles que nos emprestam dinheiro (e amanhã tornamos a ir ao mercado pedir mais 20.000.000.000 de euros), dizendo que devem ter moral e preocuparem-se com os povos… Parece-nos a maneira lógica de assegurar a continuação dos empréstimos a um spread decente. Pessoalmente, gosto que a pessoa a que empreste dinheiro, ainda antes de emprestar, me diga para ter calma e ser mais decente.

É impossível eleger um árbitro de entre os jogadores… A república é uma contradição nos seus próprios termos.

Aconselhamos o leitor a treinar a dobragem do seu voto em quatro e a praticar o xis pois com a crise que anda, caso se engane, não tem direito a segundo boletim.

Por fim, como sabemos que a Sodona Merkel lê o Opinador deixamos aqui este vídeo desse grande querido para ver se afastamos o FMI do futuro próximo!
Sodona Merkel, com um líder destes estamos em bom caminho! Não se preocupe…


domingo, 9 de janeiro de 2011

Felicidade divina

Ano novo, vida nova! Todos nós que, às doze badaladas, comemos uvas passas, uma por cada badalada, uma por cada desejo formulado para este novo ano, decerto pedimos, à primeira ou segunda uva passa: "Quero ser feliz!". Mas o que é a felicidade?

A definição não se vislumbra fácil, embora o possa parecer. Como a Marquesa é crente em várias coisas, estudos científicos incluídos, não posso deixar passar incólume mais um estudo científico divulgado esta semana a propósito da felicidade. Os investigadores buscam incessantemente a descoberta daquilo que tornaria o Homem permanentemente feliz, já que este parece ser o fim principal de toda a existência humana. Assim, segundo os neurocientistas, temos uma natural tendência para sermos felizes. Todavia, a felicidade não é um conceito unitário, antes possuindo diversos níveis: existe a felicidade do instante, aquela que está associada à nossa participação na sociedade, à ocupação profissional e até a concernente à nossa relação com Deus. E, segundo os mesmos estudiosos, para sermos felizes, precisamos de, pelo menos (pelo menos, notem bem!) de saúde, algum prazer, noção de paz e de dignidade humana, estabilidade familiar, amor, realização profissional, estatuto social, dinheiro, amigos, governo competente (esta, confesso, fez-me dar as minhas tradicionais sonoras gargalhadas, vá-se lá saber porquê!) e ambição pessoal.

Neste estudo fala-se ainda acerca da relação entre a religião e a felicidade, colocando-se a seguinte questão: A religião traz a felicidade ou ela já se encontra no nosso cérebro? Estes cientistas comprovam que as diferentes formas de estabelecer relacionamentos com os conceitos de Deus, religião e Igreja activam também zonas do cérebro de modo desigual e confirmam a existência de um campo cerebral em particular que é activado de todas as vezes que se ora ou que questões religiosas se despoletam, mesmo aquando de meras conversas a esse respeito. Curiosamente, tal zona cerebral encontra-se associada às sensações de bem-estar, de tranquilidade e de paz interior.

A ligação ao divino está intimamente conexionada com o modo como o ser humano se relaciona com a vida e com o fim último da sua existência. No entanto, actualmente temos vindo a assistir a um infeliz afastamento da sociedade europeia face à religião o que, por sua vez, conduz a um esquecimento da importante noção de felicidade que o Catolicismo propõe. Isto pode explicar, em parte, a presente conjuntura económico-financeira, porquanto esta possui indubitavelmente no seu cerne uma gravíssima crise de valores onde honestidade, humildade e solidariedade são conceitos esquecidos e significantes parcos de conteúdo. Hoje, a felicidade não é rainha.

Neste ano que ora se inicia, estejamos atentos ao que verdadeiramente nos fará felizes. Porque, com as devidas adaptações, como alguém sabiamente diria: "O que nos conduz à felicidade é invisível aos olhos!".

Feliz Ano!

sábado, 8 de janeiro de 2011

Alemanha e França pressionam Portugal a pedir ajuda

Ao que parece, os especialistas andavam parcialmente equivocados: o pedido de auxílio de Portugal ao Fundo de Estabilização Europeu (FEEF) irá, efectivamente, consumar-se, mas não depois dos primeiros três meses do ano.

Segundo noticia, a Der Spiegel, Alemanha e França pressionam Portugal para efectuar o seu pedido de adesão ao FEEF, com o objectivo de evitar que o contágio português se alastre à dívida pública espanhola. Não acreditamos que haja, ainda, verdadeiras pressões no sentido literal da palavra, mas tão só telefonemas relembrando a Lisboa que o FEEF verdadeiramente existe e está ali à disposição do Governo Português, sem no entanto, o instar a recorrer ao Fundo.

Alemanha e França, no entanto, parece-nos que apenas estão a adiantar aquilo que parece cada vez mais inevitável, tentando impedir a escalada dos juros espanhóis, agindo preventivamente.
A verdade é que Portugal irá na próxima semana aos mercados financiar entre 750.000milhões e 1250.000milhões de dívida pública a 4 e a 10 anos, quando o seu juro a 10 anos é de, aproximadamente, 7,3% - uma taxa verdadeiramente insuportável. Ora, Portugal não pode aguardar por toda a operação de colocação de dívida que vai efectuar nos três primeiros meses do ano e só depois considerar as condições de financiamento para o restante; até porque o montante a financiar é demasiado elevado: quase 9.000 milhões de euros. Ou seja, as primeiras emissões de dívida são fundamentais – ou o juro a pagar é acessível ou não há outra opção a não ser recorrer ao FEEF. Realizar operações de colocação de dívida deste montante a 7% é hipotecar o nosso futuro. Por isso, a menos que uma nova decisão a nível europeu surja entretanto – e aqui falamos das Eurobonds -, Portugal não irá conseguir resolver os seus problemas por si porque não consegue obter no mercado de dívida taxas de juro sustentáveis para se financiar. Mesmo que para tal proceda a uma operação de venda directa de títulos da dívida, como se noticia que irá fazer na próxima quarta-feira, vendendo os títulos à China e ao Brasil. É que então, a pressão da Alemanha e da França não será leve no sentido de evitar que a subida dos juros portugueses acarrete a subida dos juros espanhóis. É assim que aparece o FMI com todas as consequências nefastas que resultam da sua intervenção, mas com uma vantagem de que Portugal cada vez mais necessita: financiamento a taxas de juro sustentáveis. Obviamente que tal implicará uma nova vaga de austeridade, com a implementação de medidas mais duras, de reformas mais exigentes, mas caso Portugal não inverta rapidamente a tendência da escalada dos juros, o caminho é inevitável.

E percebemos claramente que os indicadores macroeconómicos positivos evidenciados pelo País já não são suficientes para acalmar os mercados. Mesmo sendo o crescimento sendo o dobro do previsto para este ano e com o anúncio do cumprimento da meta de redução do défice para 7,3% em 2010, os juros da dívida pública não descem. Isto apenas significa uma coisa: é que para que a tendência se inverta, alguma notícia positiva terá de ser dada por Bruxelas e não por Portugal pois os indicadores portugueses já de pouco servem para os mercados. E essa notícia parece pouco provável face à intransigência alemã perante as Eurobonds.

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

O BPN e as Presidenciais

Depois dos debates, a campanha presidencial é marcada pelo caso BPN. E não é marcada pela discussão em torno do dinheiro que o Estado foi obrigado a depositar no BPN, nem nos respectivos custos para os contribuintes, mas sim pelo negócio de compra e venda de acções de Cavaco Silva na SLN, sociedade detentora do BPN.

Todos os candidatos de esquerda veementemente exigem esclarecimentos por parte de Cavaco. O Presidente remete para a sua declaração de rendimentos entregue ao Tribunal Constitucional. Uma coisa é certa: Cavaco declarou a operação e pagou os impostos correspondentes. Outras coisas permanecem incertas: a quem foram vendidas as acções? Como foi realizado o contrato de compra e venda? A mesma operação, realizada por outras pessoas, no mesmo espaço de tempo, obteve uma rentabilidade semelhante?

Pois bem, Cavaco recusa-se, para já, a responder a estas questões. As sondagens são claramente favoráveis ao actual Presidente; os debates televisivos correram-lhe de feição. Como tal, apenas um evento imprevisível poderia atrapalhar a sua reeleição logo à primeira volta. Não cremos que o caso BPN seja esse evento que possa gerar uma reviravolta nas sondagens. Mas uma coisa é garantida: este problema em nada beneficia Cavaco. Pelo que não se compreende a sua recusa em dar mais esclarecimentos sobre o caso, permitindo que os seus adversários o continuem a atacar com o tema. Por isso, Cavaco apenas teria a ganhar em prestar os devidos esclarecimentos. O seu silêncio apenas é compreensível à luz de uma razão: é que o seu silêncio pretende ocultar algo que ainda não veio a público e que lhe é prejudicial.

Além desta trapalhada, Cavaco envolveu-se, voluntariamente, noutra. Ou seja, quando questionado sobre os problemas do BPN, Cavaco, acossado, apressou-se a criticar a actual gestão do Banco. Uma critica que poderia acalmar a turbulência por alguns instantes. Sucede que Cavaco convidou para a sua Comissão de Honra o Presidente da CGD, Faria de Oliveira, e o vice-presidente, Norberto Rosa. Ora, sabendo que a CGD é responsável pela gestão do BPN, a que preside um dos seus vice-presidentes (Francisco Bandeira), o actual Presidente da República envolveu-se na malha de incoerência. Por um lado, critica a administração do BPN pelos problemas que o banco actualmente enfrenta; por outro, convida alguns dos responsáveis pela gestão do banco a fazerem parte da sua Comissão de Honra.

Não fosse isto suficiente, Cavaco convidou ainda alguns ex-dirigentes do BPN para a sua Comissão de Honra. O que, na nossa opinião, é ainda mais grave. É que a actual administração do BPN está a tentar solucionar os problemas que lhe foram causados pelas anteriores administrações, problemas esses que, nalguns casos, configuram crimes. É certo que dos nomes presentes na Comissão de Honra de Cavaco, nenhum deles é arguido no processo BPN. Mas se o Direito não pode exigir comportamentos moralmente irrepreensíveis – mas tão-só legalmente irrepreensíveis -, a Política, por outro lado, não se compadece com alguns tipos de comportamento. E são esses que Cavaco precisa de esclarecer.

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Paz?



O território do Sudão, com o Sudão do Sul a laranja


O início de 2011 traz uma notícia animadora para o mundo – o conflito no sul do Sudão pode vir a ser resolvido, depois de 20 anos de guerra e de mais de dois milhões de mortos.
De 09 a 15 de Janeiro o Sudão do Sul vai às urnas e terá que optar pela secessão ou por continuar a fazer parte do maior Estado africano, isto no cumprimento do acordado no Tratado de Naivasha assinado em 2005, o qual conseguiu um cessar-fogo entre o Exército Popular de Libertação do Sudão e o Governo.

Mas em tudo há um grande risco – apesar de recentemente o presidente do Sudão, Al-Bashir ter prometido que iria respeitar o resultado do referendo, isso não é certo. Desde logo porque Al-Bashir é conhecido por muita coisa (desvio de fundos públicos, homicídios, genocídio, por ter um mandado de captura pendente no Tribunal Penal Internacional) mas não por ser um democrata… Há ainda que referir que o Sul do Sudão tem importantes jazidas de petróleo que podem condicionar todo o processo – como se viu com a província de Abyei que não vai a votos… E aqui pode estar o argumento para um futuro conflito territorial sul-norte.
Mas o respeito do Norte pelo referendo é apenas o primeiro passo para o fim do conflito. Ao tornar-se independente, o Sul do Sudão terá uma tarefa hercúlea pela frente: sem infra-estruturas, sem uma elite que dirija os assuntos públicos, sem instituições sólidas, podemos assistir a um estado fracassado. Se o Norte não respeitar, será a guerra generalizada: desde logo o Sul a lutar novamente pela sua independência, o Darfur com o seu conflito incessante, e os rebeldes no este do país…

Com a eventual independência do sul, o martirizado Darfur fica numa situação ainda mais confusa: poderá ver o sul integrado no novo Estado, com o norte e o centro ainda presos ao Sudão, lutando pela autonomia de um Estado (e presidente, convém individualizar os culpados) que armou as milícias muçulmanas com a finalidade de matar as tribos cristãs, numa limpeza étnica imensa que bem demonstrou a inutilidade de uma ONU configurada com um Conselho de Segurança todo-poderoso, que possa vetar tudo.

Mas pode ser que seja o princípio do fim para Al-Bashir e para o Sudão enquanto Estado aglutinador de inúmeros grupos étnicos com diferentes línguas e religiões.

Será que em 2011 nascerá um novo Estado em África? Estamos muito em crer que sim, isto se o Sudão reconhecer e respeitar a vontade da população do sul no referendo. Mas vamos a ver… Se tudo correr bem no Sul, o Sudão fragmentar-se-á: será que Cartum está preparada para largar o Império?

N’ Opinador estaremos atentos e expectantes por uma paz decisiva!