A mais bela, a mais pura e a mais duradoura glória literária de prosa da blogosfera

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quinta-feira, 30 de setembro de 2010

BRIC – Capítulo III – Índia

Neste terceiro capítulo de análise às economias emergentes vamos debruçar-nos sobre a terra dos marajás. E como está bom de ver, o próximo será sobre o gigante amarelo pintado de vermelho – a China.





A Índia deve ter a maior média de crescimento entre os BRIC: segundo os analistas, em 2050 poderá estar no 2.º ou 3.º lugar no ranking das economias mundiais, atrás apenas de China (em 1.º) e dos EUA (em 2.º). Além de potência militar, o país tem investido em tecnologia e qualificação da mão-de- obra. É também o segundo país mais populoso do mundo (a seguir à China) e a democracia mais populosa, como decerto saberá o leitor. O PIB anual situa-se em 1.256.000.000.000 dólares.

As suas instituições políticas estáveis bem como o clima de paz social são responsáveis por atraírem muitas conhecidas empresas para aquelas paragens em fenómenos de deslocalização, muitas vezes eufemísticamente apelidados de outsourcing; e aqui podíamos falar do caso da IBM ou da JP Morgan. Podíamos, mas não o vamos fazer.

E no outsourcing a Índia leva a dianteira de todos os BRIC com 11.400.000.000 dólares de lucro anuais e tal deve-se não só à herança britânica (que se manifesta na língua e no sistema jurídico) mas também à sua força de trabalho, bastante educada, mesmo segundo critérios ocidentais – de referir que anualmente, na Índia, cerca de um milhão de jovens termina um curso superior; e estão dispostos a trabalhar por uma fracção de um salário americano ou europeu.


Apesar das inúmeras oportunidades para se tornar a 2.ª ou 3.ª economia mundial em 2050 (logo a seguir aos E.U.A. e eventualmente à China) existem riscos:


Um dos maiores perigos para o crescimento indiano vem do norte, mais precisamente de Caxemira, região há décadas em disputa com o vizinho Paquistão – potência nuclear. Este é um dossier que faz a Índia gastar um bom bocado do seu PIB em armamento e é sempre um barril de pólvora pronto a explodir a qualquer momento. Sim, até porque o Paquistão não é propriamente um país neutral e pacifista pouco permeável a influências externas. A sua política externa também deixa muito a desejar… Apesar de ser um gigante económico não tem grande influência na cena política internacional.


Mas tudo somado, a Índia é no contexto dos BRIC aquele que ac
tualmente parece ser a melhor aposta – e no próximo capítulo explicaremos porque discordamos da maioria dos analistas que apontam a China como a potência líder em 2050.


Fora do tema há agora lugar ao nosso direito de reposta ao Dr. Carlos (não que ele mereça, mas sempre ouvimos dizer que quem não se sente não é filho de boa gente). Assim:


Fome zero – das duas uma: ou o programa não era para acabar com a fome (e aí temos publicidade enganosa); ou então era para acabar (e não acabou, já lá vão sete anos o que talvez seja muito tempo para esperar de barriga vazia). E nunca nós defendemos o fim de todo o tipo de ajuda social – discutimos o grau, não o princípio…

E tendo respondido desta forma, aproveitámos para lançar uma farpa no lombo daquela excelência:

Sua Excelência ficou incomodada com os cronistas do Expresso e as suas atitudes pouco socráticas. Ora, para defender o seu mundo cor-de-rosa, Sua Excelência desata a vergastar à esquerda e à direita: à esquerda acena com o bicho papão dos mercados internacionais para justificar o contínuo despesismo e rapina do Estado (oh doutor Carlos nós queremos um Orçamento equilibrado. Mas pelo lado da despesa não pela rapina na receita!); à direita vergasta contra mudanças na Constituição! Não se mexa nem se fale! Mas esqueceu-se de um pormenor: para um Governo existir não é necessário um consenso tão alargado como para uma alteração constitucional – quer isto dizer que a Constituição (pelo número de apoios que necessita) deve ser o repositório mínimo onde se encontram as regras essenciais em que a generalidade da sociedade deve acordar. E não é isto que se passa: desde os planos quinquenais, ao redimensionamento do latifúndio, há lá muita coisa que devia sair. Não querer discutir isto apenas porque não, acenando com papões neo-liberais, é terrorismo ideológico.

Pois é Dr. Carlos… Está a ficar sozinho. E com o agravamento da insustentabilidade financeira do Estado Social arrisca-se a ficar desse lado da barricada apenas com o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa e o Dr. Manuel Alegre… Se quer um conselho, tentem converter mais uma pessoa e já podem jogar à sueca!


By the way, o senhor Sócrates quer novo aumento de imposto, não é? Aconselhamos desde já o visionamento da nossa contribuição de sexta-feira que terá muito de apropriado…

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

OE 2011 e o FMI

Segundo dados revelados pelo INE, o défice público nos primeiros seis meses de 2010 fixou-se em 9,6% do PIB. Recordamos que o défice público em 2009, após sucessivas escorregadelas, se fixou em 9,4%. Conclusão – nos primeiros seis meses do ano, em que os sinais de uma transferência de uma crise financeira privada para uma crise financeira pública estavam já totalmente consolidados e empiricamente demonstrados, quando os mercados colocavam já a corda à volta do pescoço dos Estados, o Estado Português deu um jeito ao pescoço para melhor se encaixar na corda e engordou o défice para 9,6%. Os nossos parabéns a Sua Excelência! Sua Excelência, o Estado Português, argumentará, porventura, que 0,2% é uma percentagem insignificante e que as medidas acordadas no Programa de Estabilidade e Crescimento apenas se irão repercutir no segundo semestre de 2010. Pois bem – temos a comunicar que V. Ex.ª é uma besta que se assemelha ao bombeiro que aparece para salvar a casa do incêndio quando esta já ardeu e se encontra reduzida a cinzas.

O momento presente não podia ser mais crítico para Portugal. A Espanha já não concentra as atenções do mercado pois apresentou na semana passada, as Linhas Gerais do Orçamento, os Pressupuestosum Orçamento austero que ataca o défice pelo lado do aumento da receita pública e pela redução drástica da despesa pública para os níveis de 2006. Com isto, a Espanha aliviou a pressão dos mercados e transferiu-a para Portugal e Irlanda. A situação da Irlanda é também muito critica e isso explica a razão porque a situação portuguesa não é ainda mais comatosa. Para já, a Irlanda vai concentrando as atenções dos mercados, merecendo o olhar atento do Financial Times e do Wall Street Journal. Tudo por causa do Anglo Irish Bank que terá de se alvo de uma recapitalização com o dinheiro dos contribuintes, isto é, a Irlanda é ameaçada não em função dos seus compromissos orçamentais – pelo menos não directamente – mas pela crise bancária que se revelou mais forte no seu país pela maior exposição aos activos tóxicos. Esta recapitalização terá os seus efeitos nos objectivos de redução do défice e, por este motivo, os mercados acompanham mais atentamente a situação irlandesa. Finda esta situação – a bem ou a mal – os olhares irão novamente incidir sobre Portugal. E se os olhares encontram Portugal como um País onde a redução do défice para 7,3% em 2010 está em risco, onde a aprovação do Orçamento de Estado para 2011 está comprometida, então, meus amigos, Portugal vai ter problemas. É por isso que o presente momento, apesar de delicado, é igualmente uma janela de oportunidade – oportunidade pela enésima vez de enviar um claro sinal aos mercados de que as linhas gerais do Orçamento que hoje vão ser delineadas em Conselho de Ministros, são de uma redução do défice para 4,6% em 2011. Não basta anunciar, porém – a posteriori será preciso cumprir: é preciso passar das palavras aos actos. Esta é a oportunidade para Portugal dar um sinal claro aos mercados de que é capaz de resolver os seus problemas. O aumento de impostos que se avizinha não é suficiente – é necessário, é impreterível reduzir estruturalmente a despesa. Só assim o Estado poderá aliviar a pressão dos mercados, reduzir os juros e evitar a entrada do FMI, que será inevitável caso os juros não desçam e se mantenham no máximo atingido ontem de 6,7% - a adesão ao Fundo Europeu de Estabilidade implica a acção conjunta e coordenada da União Europeia e do FMI. Uma de duas coisas acontece, portanto – ou o Estado resolve os seus problemas, ou outros irão resolve-los por ele.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

O Estado Social no "Expresso"

O jornal tem na sociedade uma influência muito séria e profunda – os jornalistas e os colunistas do jornal são responsáveis por explicar ao povo o que se passa no quotidiano na sua manifestação política, económica e social; eles são responsáveis pela crítica às instituições e aos costumes; eles são responsáveis por se estabelecer um critério que servirá de julgamento a essas instituições e costumes; eles são responsáveis por um olhar atento e independente pela acção no País; eles são responsáveis pela elevação ou diminuição da inteligência pública; eles são responsáveis pelo arbítrio em questões de honra, de probidade e do dever.


Na edição de sábado do jornal “Expresso”, os colunistas do mencionado jornal contribuíram em muita coisa – menos para o elevar da qualidade do debate público. Senão vejamos – o Sr. António Pinto Leite. O Sr. António Pinto Leite ao longo da sua crónica, preenchida por diversos soluços e lágrimas, verbera contra o PS e a sua defesa constitucional do Estado Social. Segundo sua excelência, “o Estado social é uma mentira se não for recriado e redefinido para que possa ser sustentável”. Em seguida sua excelência acrescenta – “O PS não gosta das ideias do PSD? Debata no terreno das eleições, não se esconda atrás da Constituição”. Estimado Dr. António Pinto Leite, o PS saiu detrás da Constituição no dia 27 de Setembro de 2009, escudando-se no voto eleitoral – isso sucedeu há um ano atrás. Com certeza que V. Ex.ª que o Primeiro-Ministro aldrabou, caluniou, mentiu nesse período eleitoral. Nada mais verdadeiro, V. Ex.ª. Mas dizer que o PS não debate no terreno das eleições não me parece correcto. Mas V. Ex.ª diz mais – “Como é possível, em consciência democrática, quase 40 anos depois do 25 de Abril, negar ao partido alternativo de governo a possibilidade de governar segundo o seu programa?”. Aqui é V. Ex.ª que está a aldrabar. Respeitosamente aldrabando, digo eu. Queira reparar neste ponto Dr. António Pinto Leite – não é o PSD que governa: é o PS. Logo, o PS governa segundo o seu programa, legitimamente sufragado nas urnas, e não o PSD. Aliás, Dr. António Pinto Leite, parece-nos deveras curioso que V. Ex.ª invoque o 25 de Abril, período de transição da ditadura para a liberdade para questionar como é que o partido que presentemente está na Oposição não pode governar segundo o seu programa de governo. Isto faz-lhe algum sentido? A nós não. Mas há mais, Sr. António Pinto Leite – vejamos mais uma vez o que V. Ex.ª diz – “Como negar ao partido alternativo de governo um texto constitucional alinhado com a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, segundo a qual “todos os trabalhadores têm direito a protecção contra os despedimentos?”. V. Ex.ª questiona-se, e questiona-se muitíssimo bem! Lindamente questionado, V. Ex.ª. Como se atrevem os outros partidos a ter uma opinião divergente do PSD? Como se atrevem os partidos a terem ideias próprias? Como se atrevem os outros partidos a não se dobrarem perante o PSD e aceitarem as suas ordens? O quê? Dr. António Pinto Leite informam-nos agora que as alterações da Constituição são aprovadas por maioria de dois terços dos Deputados em efectividade de funções. Pior, V. Ex.ª! Isso está inclusivamente plasmado no art. 286.º desse nefasto documento constitucional! Dizem-nos que, por isso, o PSD não pode aprovar sozinho a sua proposta de revisão constitucional contra a vontade de dois terços dos deputados porque precisa desses energúmenos descartáveis! Tudo isto é terrível, V. Ex.ª! Mas ainda há mais! V. Ex.ª conclui a sua vergastada ao Estado Social da melhor maneira, apontando que “os nossos filhos fogem, todos os dias, para países com regras de trabalho flexíveis, essencialmente assentes no mérito e no dinamismo da economia”. E quem aponta o Dr. António Pinto Leite? Aponta a Espanha, V. Ex.ª! Aponta a Espanha porque V. Ex.ª tem filhos que foram para lá! Aponta justamente a Espanha que há uns meses atrás teve de ser avisada pelo Sr. Comissário Europeu Olli Rehn para fazer uma reforma estrutural no seu código laboral por ele ser precisamente pouco flexível! Ah, Sr. António Pinto Leite! Uma desgraça! Um desvario! Até porque o Sr. Comissário Europeu que ao início instara Portugal a realizar o mesmo procedimento no seu código do Trabalho, recuou, pediu desculpa e reconheceu que Portugal já havia feito uma reforma! V. Ex.ª culpa o Estado Social de Portugal e, em seguida, segundo a sua sábia autoridade, aponta o derradeiro exemplo que ainda é pior que Portugal! Portanto, recapitulando – para V. Ex.ª, o PS é autocrático porque deixa sair os nossos filhos para mercados com uma legislação laboral ainda mais rígida que a nossa! Para justiça do Dr. António Pinto Leite, V. Ex.ª refere também a Inglaterra. Mas a Espanha, V. Ex.ª? A Espanha deixou-nos atordoados, V. Ex.ª! Veja o quanto a posição do PS é inflexível – o líder do CDS-PP, o Sr. Paulo Portas, cujo partido está colocado ideologicamente à sua direita, também não defende a sua proposta de revisão neste ponto – opta sim por maior liberalização na contratação e não no despedimento! A autocracia ideológica do PS quando nem o partido ideologicamente à sua direita concorda com a sua posição liberal! É na contratação que Portugal precisa de maior flexibilidade, tal como a OCDE, na véspera, referiu.

O Sr. Daniel Oliveira – pessoa que mais apreciamos de ouvir no sector mais à esquerda do PS – realizou no sábado um exercício sobre as consequências de um eventual imposto extraordinário sobre o 13.º mês dos funcionários públicos. Para o Sr. Daniel Oliveira, o Estado não deveria tributar o 13.º mês – esta é a sua primeira premissa. Depois, ao longo de algumas linhas, termina na ducentésima nona premissa para concluir que o Estado não deve tributar o 13.ª mês, respeitando a sua primeira premissa – porque isso dá desafogo ao comércio, porque as PMEs ficariam em pior posição, porque teria de haver mais endividamento, porque a situação económica degrada-se, porque então o Estado terá que intervir, etc, etc. Ponto um do nosso raciocínio – o Estado tem de cumprir a meta orçamental de 7,3% para este ano. Em resposta ao Sr. Daniel Oliveira, diremos o seguinte, em jeito de conclusão bem mais simples, ligando imediatamente, causalmente, directamente, o primeiro ao segundo facto – se o Estado não reduzir o défice para 7,3% este ano, os mercados degolam-nos. Esta é uma conclusão simples e directa, sem necessidades de raciocínios intermédios. Através de que meios deverá o Estado reduzir o défice já podemos discutir – mas a imperiosidade de o reduzir existe.

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

BLACK SHEEP

Caríssimos, hoje trago comigo uma missão exclusiva de serviço público, a de fazer chegar a todos vós bombas do mundo do cinema, mais precisamente, da produção cinematográfica.
Pois serei breve, como é meu apanágio e deixarei à vossa consideração e gosto a apreciação posterior da informação que aqui vou revelar.
Ao que parece, o imaginário dos produtores e guionistas e todos aqueles que trabalham em prol do mundo do cinema está longe de se esgotar. A cada dia que passa tendem a surpreender-nos com a imaginação fértil que os caracteriza, muitas vezes digna de um Hollywood de outras eras que não o século XXI.
O que pretendo apresentar-vos hoje, é umas das mais interessantes aberração das longas-metragens que temos vindo a conhecer. É a história promissora de ovelhas mutantes e super ovelhas que atacam humanos e revelam o poder superador e ameaçador de uma raça totalmente desconhecida.
O que dizer?...é mesmo ver para crer. Foi a novidade que marcou o meu dia de hoje e superou qualquer outra que me pudessem dar. A situação económica do país quase que passa para segundo plano face a estes tesourinhos que nos vão chegando ao conhecimento.


domingo, 26 de setembro de 2010

A visita papal

O Papa Bento XVI realizou uma visita ao Reino Undio entre os dias 16 e 19 de Setembro. Todas as visitas papais são sempre alvos de grande interesse e de ampla cobertura pelos órgãos de comunicação social. Contudo, esta visita ainda foi mais mediática face a todas as restantes. Não fosse o Reino Unido um país maioritariamente protestante. Não fosse ser a primeira visita de Estado de um Papa a este país.

A Inglaterra descobriu a sua identidade em consequência da Reforma. Retrocedendo alguns séculos, é facto notório a atribulada relação existente entre Inglaterra e Roma. No século XVI, Henrique VIII auto-declarou-se, através do Acto de Supremacia de 1534, Chefe da Igreja em Inglaterra, recusando a autoridade do Papa, porquanto este não reconhecia o seu divórcio com Catarina de Aragão e o seu casamento com Ana Boleyn. Estes acontecimentos, aliados à onda reformista que assolava o norte europeu, conduziu ao repúdio da figura papal durante anos a fio e à criação do vocábulo "papistas" para designar aqueles que permanecessem católicos fiéis.

Hoje o país é bastante diferente, tendo havido uma maior aproximação entre a Igreja Católica e a Anglicana sobretudo desde o Concílio Vaticano II. No entanto, ultimamente não se tem progredido como se desejava. Sobretudo desde o momento em que foi celebrada a constituição apostólica Anglicanorium Coetibus que permite aos anglicanos entrar para a Igreja Católica através de um ordinariato (note-se que apenas 10% dos habitantes do Reino Unido são católicos).

Do exposto decorre a grande importância que esta visita teve. Serviu não só para procurar atenuar quezílias, mas também para aproximar os povos. Temos inúmeros exemplos de povos de religiões distintas a habitar um mesmo país e sabemos que a convivência pacífica é inexistente. Mas acreditamos que é possível, basta haver convergência de vontades nesse sentido. Afinal, tanto o Catolicismo como o Protestantismo são ramos da mesma árvore: o Cristianismo.
Apesar de todas as polémicas que envolveram a presença de Bento XVI no Reino Unido, o Papa conseguiu fazer ouvir a sua voz, como reconheceu David Cameron, Primeiro-Ministro britânico, e centrar as atenções na mensagem que pretendia veicular. O clima de festa, o peso das suas palavras e a capacidade em abordar directamente temas deveras delicados como a relação entre a religião e o secularismo e os abusos sexuais de menores contribuíram para uma avaliação muito positiva à sua passagem por Edimburgo, Londres, Birmingham e Glasgow. O Papa revelou sempre uma postura de verdade e de humildade, relevando nos seus discursos a longa tradição cristã e democrática do Reino Unido, a coragem com que muitos enfrentaram o regime nazi e os desafios levantados por uma sociedade multicultural que propende para a infeliz marginalização da religião.

Bento XVI chegou mesmo a orar na Abadia anglicana de Westminster e no Westminster Hall. Quando o Papa disse "esta Abadia é dedicada a São Pedro", todos compreenderam que o Papa tinha tanto direito de se sentar naquele santuário quanto o Arcebispo de Cantuária, Rowan Williams. Andrew Brunn, editor de religião, escreveu mesmo, a propósito desta visita: "Este foi o fim do Império Britânico. Em todos os quatro séculos de Isabel I a Isabel II, a Inglaterra foi definida como uma nação protestante. Os católicos eram os Outros, às vezes terroristas violentos e rebeldes, às vezes meros imigrantes sujos. A sensação de que esta era uma nação especialmente abençoada por Deus surgiu a partir de uma leitura profundamente anticatólica da Bíblia. No entanto, ela foi central para a autocompreensão inglesa quando a rainha Isabel I foi coroada em 1592 e jurou defender a religião protestante pela lei estabelecida. Em todos esses 400 e tal anos, teria sido impensável que um Papa pudesse estar no Westminster Hall e louvar Sir Thomas More, que morreu para defender a soberania do Papa contra a soberania do rei. A rebelião contra o Papa foi o acto fundacional do poder inglês. E agora esse poder foi-se, e talvez a rebelião também.". Como a sabedoria popular costuma dizer: "Deus queira que sim!".

No Reino Unido, o actual Papa mostrou, mais uma vez, a força que as palavras certas na altura certa possuem, mas também não há dúvida que a força de milhares de católicos espalhados pelos locais onde passava foi essencial para que estas palavras não fossem abafadas por vozes contestatárias e fait-divers.

sábado, 25 de setembro de 2010

Notas sobre a Educação - e sobre o Lord Nelson

Na passada quarta-feira, apresentamos uma pequena sátira da Educação em Portugal. Não tivemos, contudo, oportunidade de extrair as ideias fundamentais da mesma, ao que iremos proceder agora.
A educação tem por fim – já o dissemos uma vez – a mais perfeita adaptação do homem à vida. É através da educação que é possível ao homem reconhecer e compreender as circunstâncias que o rodeiam de modo a alcançar a felicidade. Dito isto, a educação deve possuir o carácter mais prático, o mais pragmático possível para que na luta moderna da vida, o homem possa aplicar os conhecimentos apreendidos numa sala de aula. Para que outra coisa serve o conhecimento senão para nos guiar e orientar no nosso esforço diário da vida?
Este facto é tanto mais verdadeiro no que respeita ao ensino básico e secundário. Apesar dos grandes progressos feitos por Portugal no que respeita ao número de diplomados no ensino superior, sabemos que as taxas de abandono escolar são elevadíssimas quando comparadas com os restantes países da União Europeia. É, por isso, que dizemos que o ensino público deve desenvolver no espírito as noções mais práticas, os conceitos mais indispensáveis, as tarefas mais elementares, as aptidões mais necessárias para a vida prática. Com efeito, o Estado não pode desprezar os alunos que acabam por abandonar a escola, providenciando uma educação que não terá qualquer reflexo na sua vida prática, que não encontra nenhuma utilidade no seu labor quotidiano. Por certo que o abandono escolar precoce tem de ser combatido; mas quando o aluno, findo o 9.º ano ou o 12.º ano – como agora pretende o Estado com a obrigatoriedade do ensino secundário -, quando o aluno finda o 9.º ou o 12.º ano, dizia eu, e não pretender continuar os seus estudos, o aluno deve então, ter a noção mais aproximada possível daquilo que é a vida prática e dos instrumentos – conhecimentos – indispensáveis para triunfar nela.
Ora, na educação em Portugal poucos alunos retiram dela ideias para a vida prática. Aprende-se muita coisa na educação em Portugal – menos analisar, pensar e criticar. Nas escolas gregas da Antiguidade, a música, a poesia, a retórica e a filosofia eram as áreas de estudo. Tudo isto era muito bem visto, até que Sócrates questionou a utilidades destes ensinamentos na vida prática. Os nascimentos e as mortes dos reis são factos que de nada servem à vida real e que estão apenas afectos à memória, mas são sempre pertencentes ao domino da educação, não pela sua utilidade prática, mas pela convencionalidade pública – isto dizia-o Spencer.
É através da instrução que os indivíduos com menores posses se tornam iguais aos indivíduos com maiores posses. É através da instrução que os indivíduos menos qualificados poderão juntar o seu esforço ao esforço da Nação na peleja pelo apurar e pelo burilar da Civilização. Ora, o Estado ao não defender as mais elementares regras, os mais básicos princípios, não só não está a combater as desigualdades sociais, como as está a incentivar! De que outro modo pode ser interpretado todo o processo da avaliação dos professores? Esta distinta classe não deseja um modelo de avaliação rigoroso – o que se compreende porque coloca em causa a preguiça e a inépcia. Pois bem, o Estado, mole e linfático, sucumbe aos pés da classe dos professores e entrega-lhes um modelo de avaliação frouxo – um modelo que não distingue o mérito, que não promove o trabalho, que incentive o valor. Se o Estado não é exigente com os seus professores, como o pode exigir aos seus alunos? E os professores? Se estes pedem que o Estado não seja exigente com eles, como podem eles ser exigentes com os seus alunos? É neste processo em que ninguém é exigente com ninguém que a própria sociedade deixou de ser exigente com o Estado por cansaço – e, assim vai a Escola Pública se enviuvando da inteligência.

Gostaria ainda de dirigir uma palavra final ao nosso Lord. O estimado leitor estará, porventura, recordado das palavras do nosso Lord a propósito do Programa Fome Zero do Presidente Lula? Muito bem então – a verdade é que o nosso Lord cuspiu no Programa Fome Zero e apelidou-o de “fracasso”. Não querendo colocar em causa a credibilidade, honorabilidade, probidade e reputação dessa nobre instituição denominada Lord Nelson, uma outra instituição bem mais desacreditada, bem mais suspeita, bem mais parcial, residente na Alemanha – esse berço do esbanjamento público e do comunismo -, designadamente a Der Spiegel, aponta o Programa Fome Zero como um exemplo a seguir às Nações Unidas para que se alcancem os objectivos do Milénio no que concerne à fome, apelidando-o de “sucesso”.
Estimado leitor, contribuindo eu para o esclarecimento da opinião pública e das mentes mais nubladas, o que Lord Nelson quis dizer quando subiu ao púlpito foi:
- Povo! Escutai-me atentamente! Eu quero que tu, Povo, coloques as mãos nas costas e as apalpes!
O Povo olhando-se mutuamente, desconfiadamente, começa a murmurar entre si – o que pretenderá o benemérito Lord? Então, o capitalista de monóculo e cartola insiste:
- Povo! Escutai-me atentamente! Eu quero que tu, Povo, coloques as mãos nas costas e as apalpes!
O Povo confia, coloca as mãos nas costas e começa a apalpar. Aos poucos, por toda a parte começam a ressoar perguntas:
- Mas que saliência é esta? – pergunta um.
- Mas o que é isto que tenho nas costas? – pergunta outro. Não estava aqui antes!
Então, Lord Nelson, sereno, grave, diz:
- Povo! Isso que tendes nas costas são dois corcovados! Agora ide trabalhar seus camelos que me estão a atrapalhar o crescimento económico do Brasil!

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Os anúncios mais estranhos de sempre

Os nossos humores de sexta são hoje dirigidos aos anúncios mais estranhos de sempre.

Os anúncios podem ser irritantes, porque interrompem a nossa telenovela favorita justamente naquele momento em que a protagonista ia revelar quem é o verdadeiro pai da sua filha.

Os anúncios podem ser inconvenientes sobretudo quando dedicados a temáticas peculiares e transmitidos em pleno horário nobre.

Os anúncios podem dar cabo da paciência até dos mais pacientes quando são infindáveis e passam quinhentas vezes num lapso de tempo de cinco minutos.

Mas os anúncios também podem ser castiços (gosto tanto da palavra castiço, que castiço!) ou, se preferirem, estranhos a ponto de provocarem ininterruptas aveludadas risadas. Caso não acreditem no que se acabou de afirmar, vide infra:

Por M. Pompadour:

Usar uma cinta "Pompadour" é ter 20 anos toda a vida.





Por Letícia, a Marquesa:

Oi! Eu cá vou pará o anúnciou eleitorau, porqui é maix bacana e como a galera até istá com dificuldadxi em iscolher em quem vai votá para sê o próximu Lulinha, ispero dar uma piquena ajuda, sim? Beijão.





Por Lord Nelson:

Algures na fronteira entre o estranho e o perturbador...

Por Carlos Jorge Mendes:

O Dr. Carlos chama a atenção para o segundo anúncio - que todos os homens reparem atentamente nele e vejam porque se devem manter em forma.


quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Novas dívidas para pagar velhas dívidas...


Porque isto é demasiado importante para passar despercebido e a nossa comunicação social anda ocupada com o Sr. Paulo Bento, n' Opinador fica a notícia que corre lá fora!

Urge repensar a nossa despesa pública! Isto não está lá muito porreiro, pá!





A notícia do Financial Times:



"Portugal passes debt auction hurdle

By David Oakley in London and Peter Wise in Lisbon

Published: September 22 2010 11:35 Last updated: September 22 2010 17:14


Investors demanded record high yields to buy Portuguese debt on Wednesday as Lisbon scaled down the amount of money it had hoped to borrow in bond markets amid persistent worries over the health of the country’s economy.

EDITOR’S CHOICE
Portugal vows to cut deficit - Sep-22.Relief at Ireland’s €1.5bn bond issues - Sep-21.Bond sale affirms investors’ faith in Spain - Sep-16.EU rescue fund rated triple A - Sep-20.Interactive: Sovereign debt levels by country - Jun-23.Portugal Special Report - Jun-28..Portugal issued €750m in four-year and 10-year bonds, at the low end of its targeted range, after debt managers had told investors they hoped to raise €1bn.

But demand for the bonds was strong as many investors were prepared to take the risk on the Portuguese economy in return for record high yields, which are nearly 4 percentage points more than German bunds for 10-year bonds.

Portugal and Ireland, which issued €1.5bn in bonds on Wednesday, are increasingly seen as the problem countries for the eurozone, apart from Greece, which is already reliant on emergency loans from the international community.

Lisbon had to pay 6.24 per cent to borrow €300m in 10-year bonds, a record high since the launch of the euro in 1999, and 4.69 per cent to borrow €450m in four-year bonds. The yields demanded were at about the levels Portugal would have to pay if it decided to borrow from the eurozone bail-out fund, the European Financial Stability Facility.

Richard Batty, investment director of strategy at Standard Life Investments, said: “This shows Portugal has a lot of problems. Portugal cannot go on paying higher and higher yields. It is not sustainable and makes it much harder for the country to reduce its budget deficit. Investors are only willing to take a chance on Portugal for very high returns.”

Gary Jenkins, head of fixed income at Evolution, said: “In a way the auction has been a success as the Portuguese have raised the money, but they are only able to do so at a very high cost and only because investors know that the European Central Bank is there to support the markets if necessary.”

The yields compared with rates of 5.31 per cent for the 10-year bonds at the last auction in August and 3.62 per cent for four-year bonds at the previous offering in July.

Both auctions were well subscribed, with the 10-year covered 4.9 times and the four-year covered 3.5 times. Debt managers, however, cut back what they had hoped to raise because of the high yields demanded by investors. Lisbon is already ahead in its fundraising schedule.

Investor concerns about Portugal centre on the government’s failure to implement reforms to turn round its stagnating economy. The financial markets have grown increasingly sceptical about the prospects of the country meeting its target of cutting the budget deficit from a record 9.4 per cent of gross domestic product in 2009 to 7.3 per cent this year. "

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Mensagem de Sua Excelência, a Ministra da Educação, Isabel Alçada






A Ministra – Meninos e Meninas, quero que cada um de vocês pense no que fez o ano passado…

Joãozinho – Ora deixa cá ver…Espetei com três pontapés no rabo do António…

António – É verdade…Ainda ando com o rabo vermelho!

Joãozinho – Vê lá se não fizeram de ti um homem! E que mais fiz eu? Encaixilhei três nerds no cacifo da escola; intimidei o Professor de História; furei os pneus do Professor de Português…

A Ministra - …e que pensem sobretudo no que conseguiram aprender e os resultados que obteram com o esforço que fizeram para estudar e para aprender…

Joãozinho – No que eu aprendi, Sra. Ministra? Sei muito de Estudo Acompanhado, de Área Projecto, de Educação Cívica…Por outro lado, chumbei a Português, a Matemática e a Educação Moral e Religiosa, o que muitos desagrados me causaram junto do Prior…Receio ser uma ovelha negra no rebanho do Senhor…

A Ministra - …e gostava que cada um soubesse que este ano têm que fazer mais que o ano passado…

António (aos pinchinhos, batendo alegremente as mãos) – Sim, Sra. Ministra! Sim! Vou fazer mais! Vou estudar muito para ser um menino bonito! Se eu me portar bem, no Natal, o Pai Natal irá me recompensar.

Joãozinho (dando um cachaço a António) – Está calado. O Pai Natal não existe.

António (em lágrimas, soluçando) – Não pode ser verdade…

A Ministra – Se os alunos escutarem o professor, estiverem com atenção, estiverem concentrados…

Joãozinho – Mas Sra. Ministra, isso é tão chato!

A Ministra - …Nós queremos que todos os alunos portugueses tenham bons resultados na escola…

Joãozinho – Para ajudar às estatísticas do Governo, Sra. Ministra? Mas se vocês já fazem o trabalho por nós! Os exames que o meu primo realizou no 9.º ano, Sra. Ministra, até eu, Joãozinho, era capaz de os realizar e estou no sexto ano!

A Ministra – E queria lembrar-vos doutra coisa: estudar. Estudar é assim uma coisa como o desporto do cérebro. Estudar desenvolve o cérebro. Ficamos com o cérebro mais forte.

António – É verdade, Sra. Ministra? Assim como os abdominais do Cristiano Ronaldo?

Joãozinho – Isso era bom para atrair miúdas.

António – Eu quero um cérebro desses. Vou-me exercitar muito. Quais são os exercícios, Sra. Ministra?

Neurocirurgião – Aqui tens, António. Recomendo-te 20 flexões cerebrais, 30 abdominais cerebrais e 30 dorsais cerebrais.

A Ministra – E quero ainda que pensem no seguinte. Como vocês sabem, o dia tem 24 horas…

Joãozinho (espantado) – A sério?

António (boquiaberto) – Ela estará a falar a verdade?

Joãozinho (consultando um compêndio) – Mas nós não demos isso em Área Projecto…

A Ministra – Nós precisamos de nos orgulhar dos nossos alunos! Bom ano lectivo!

Joãozinho – Ficaste convencido?

António – Não sei…Ela nem sabe olhar directamente para a câmara…Não me olha nos olhos. Isso não me transmite segurança e confiança…

Joãozinho – É verdade…é verdade…Colocaram o teleponto no lado oposto à câmara que estava a filmar…Este Ministério da Educação…

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Interrupção dos BRIC - Crónica

Interrompemos a nossa análise sobre os BRIC - que consistiria em 4 capítulos, dois já apresentados - para trazer ao leitor um texto de outrem.
Trata-se da crónica do Comendador Marques de Correia, publicada no passado sábado no Expresso (Revista Única n.º 1977, última página).
Fazemos tal atendendo a que o texto de debruça sobre uma temática bastante actual - a discussão acerca da viabilidade do nosso Estado Social - de uma forma bastante original.
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Ao Comendador os nossos parabéns, e se o leitor já leu no sábado leia agora na terça... Se não leu no sábado, leia agora duas vezes, se fizer o favor. Subscrevemos na íntegra a opinião transmitida...
Passamos a transcrever:
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" Imaginem um ser humano que tinha uma monstruosa dor de cabeça. Um médico receitou-lhe, há 40 anos, uns comprimidos. O medicamento era eficaz para a enxaqueca, mas a pessoa - tendo resolvido boa parte daquela dor abrasiva e pulsátil (seja lá o que isso for) - descobriu que lhe doía também um dente e tomou mais comprimidos. Foi ao passar-lhe a dor de dentes que tomou consciência de que tinha, igualmente, uma ligeira impressão dolorosa na perna esquerda, pelo que aumentou a dose. A dor de cotovelo levou-o a tomar mais e, daí em diante, não havia ligeira contrariedade que não atacasse com mais e mais comprimidos.
Claro que a despesa com os medicamentos se tornou bastante grande, o que causava ainda mais problemas àquela pessoa. O que ganhava no emprego já não chegava para pagar os comprimidos, pelo que tinha de se endividar na banca e pagar altos juros. No entanto, sempre que lhe sugeriam viver com menos pílulas, tomando só as absolutamente necessárias, alguém subia a um palco de comício e dizia: Querem matá-lo! Querem matá-lo! São desumanos os que o querem matar! Se ele se sente bem a tomar os comprimidos, ninguém lhos pode tirar!
No entanto, argumentavam outros, não há dinheiro para tanto comprimido... Não está ele todo endividado? Ainda que se sinta bem como vai pagar? Com dívida, responderam os outros! Endivida-se mais! E ele endividou-se mais. E mais. E mais. Todo o produto do seu trabalho ia para pagar a dívida contraída porque tinha de tomar cada vez mais comprimidos, já que à medida que mais os tomava, mais lhe doíam diversas partes do corpo. Os médicos diagnosticaram: havia comprimidos a mais; tinha de cortar no consumo! Porém, ao ouvir os médicos, logo alguém subiu para um palco de comício e clamou: Querem matá-lo! Querem matá-lo! Querem tirar-lhe os comprimidos, logo agora que tanta falta lhe fazem!
O povo, claro, gostou desta defesa acérrima dos comprimidos, porque é indecente retirar a medicação a alguém quando mais precisa. Porém, os médicos insistiam que a pessoa se sentia pior, justamente porque a medicação era excessiva.
Discute para aqui, discute para ali, não se chegou a qualquer conclusão. Um dia, o excessivo consumidor de comprimidos acordou e não tinha crédito, não tinha comprimidos, não tinha nada.
Julgam que na comunidade onde isto se passou alguém reirou uma conclusão da história? Ninguém! Uns diziam que se tinha chegado a este ponto porque havia overdose de comprimidos, mas os outros juravam que se não fosse a banca, os credores e os médicos - malandros que, falando na doença, a agravavam manifestamente -, tudo estaria bem.
A pessoa em causa anda por aí, ainda. Anda mal, aos tombos, mas anda... Chegou àquela fase em que a ameaça é brutal: se continua como até aqui morre, mas já não sabe como mudar de vida.
Entretanto vai tomando os comprimidos que pode. Também não é mais um que o há-de matar... Um dia, quando morrer, ninguém saberá do que foi e cada qual ficará com a sua opinião.
Neste aspe(c)to, resta-me dizer, caros leitores, é que esta pessoa é igualzinha ao Estado Social. Está a matar-se para que não a matem...
Comendador Marques de Correia"

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

"Façam o favor de ser felizes."


Um sábio Sr., provavelmente Dr. de outros tempos, disse uma vez que quanto mais conhecia as pessoas, mais gostava dos animais. De todas as vezes que eu ouvi alguém usar este cliché, estava por detrás um momento menos bom de relacionamento interpessoal que revelava na pessoa uma desilusão inesperada por outrem, não necessariamente digno de tanta consideração para justificar a desilusão pelo género humano em massa.
Mas o iluminado que, a certa altura, concluiu que as pessoas não mereciam a importância que se lhes dava parece, a meu ver, ter pensado muito bem no assunto antes de proferir as palavras que proferiu. Se há coisa que enerva toda a gente, mas ninguém tem coragem de evitar (excepto um minoria de corajosos, regra geral rotulados por mal-criados ou coisas piores), são as falsas simpatias, o "Então, como estás?" que não traz verdadeiro interesse sobre o estado da pessoa, ou o "Olá!! Há quanto tempo...!" que não vem regado de saudades rigorosamente nenhumas.
É muito mais apelativo o animal que reconhece a mão que lhe afaga o lombo e vem dengoso procurar o calor dessa atenção e, no mesmo momento, se desagradado com a pressão exercida pelo humano que dificilmente resiste à sua fofura, evita esse contacto e não cede à necessidade que todos temos de agradar. Eles, sem dúvida, são sinceros. E se não o podem ser verbalmente, são-no nas atitudes.
As falsas simpatias geram ciclos viciosos dos quais, por ordem de comportamentos padronizados impostos socialmente, não conseguimos ver-nos livres. Não existe coragem suficiente para ignorar alguém que, apesar de sentirmos não estar a ser sincero, se dirige a nós com a mais aparatosa amabilidade do mundo, ninguém é capaz de ripostar com um "Tu não queres saber, estás a ser hipócrita." (e se calhar mandá-lo a sítios pouco bonitos). Pessoalmente confundem-me essas atitudes, porque todos temos a perfeita noção de quando somos sinceramente desejados ou acarinhados por alguém e quando não o somos. Se as pessoas não agem de acordo com o que pensam, então o que é que andamos cá a fazer?

domingo, 19 de setembro de 2010

Hoje é para ti!

És tu! És tu! Sempre vieste, enfim!
Oiço de novo o riso dos teus passos!
És tu que eu vejo a estender-me os braços
Que Deus criou para me abraçar a mim!

Tudo é divino e santo visto assim...
Foram-se os desalentos, os cansaços...
O mundo não é mundo: é um jardim!
Um céu aberto: longes, os espaços!

Prende-me toda, Amor, prende-me bem!
Que vês tu em redor? Não há ninguém!
A Terra? - Um astro morto que flutua...

Tudo o que é chama a arder, tudo o que sente,
Tudo o que é vida e vibra eternamente
É tu seres meu, Amor, e eu ser tua!



Florbela Espanca

sábado, 18 de setembro de 2010

Orçamento de Estado 2011

Esta semana os jornais portugueses noticiavam, com grande alarido, o endividamento galopante do Estado Português que quase já chegou ao limite estipulado para 2010 – 14,2 mil milhões dos 17,4 mil milhões.
A esta notícia, o Ministério das Finanças reagiu serenamente e tranquilamente. O Ministro chamou os jornais ao seu gabinete e, pausadamente, colocando verticalmente o indicador sobre a boca, disse:
- Shiu, jornais! Shiu! É o nosso segredo! É o nosso segredo!
Na verdade, o que o Governo pretende é que os jornais curvem a lombada perante suas excelências e lhes beijem as suas augustas mãos pelos relevantes serviços prestados ao País. Onde já se viu um País ralado, preocupado, incomodado, varado por o Governo a três meses e meio do final do ano – e com subsídios ainda para pagar aos funcionários públicos – onde já se viu, dizia eu, uns jornais preocupados com um País altamente endividado, numa conjectura de crise de divida pública soberana, onde os juros pagos pelo crédito são cada vez mais elevados, e cujo mercado do crédito enfrenta a maior crise desde a Grande Depressão dos anos 30 do século passado? Francamente, jornais! Francamente…Sr. Ministro, Sua Excelência! – um conselho: baixe as calças desses jornais e açoite-lhes bem essas nádegas que eles hão-de aprender! Até sangrar, Sr. Ministro, até sangrar! Eles hão-de ver como então, nessa altura, haverá novidades da Sra. Lili Caneças e da Sra. Cinha Jardim para noticiar! Se todos fossem como o Correio da Manhã, Sr. Ministro!...E pensar que a vida do 24Horas já se extinguiu, Sr. Ministro!...

O Governo ao apelar à responsabilidade política da Oposição para aprovar o Orçamento é ignóbil – o governo detém o poder executivo: compete-lhe a direcção governativa do País. É, por isso, que em primeiro lugar a responsabilidade política está nas suas mãos – cabe ao Governo apresentar um Orçamento de Estado rigoroso, credível e exequível. Em função do cenário de composição da Assembleia da República – uma maioria relativa do PS -, é necessário o voto favorável ou neutro do PSD para a sua aprovação. Mas o PSD tem manifestado as suas condições para a aprovação do Orçamento que, de forma alguma, condicionam o Governo no seu exercício do poder executivo. O PSD apresentou duas condições mínimas e gerais nas suas políticas para a definição do Orçamento – o não aumento de impostos e a redução da despesa pública: aponta os fins, não os meios. Onde reside a dificuldade destas duas orientações gerais se elas têm obrigatoriamente que constar do próximo Orçamento de Estado? Justifica isso o espalhafato que vem sucedendo nas últimas semanas na opinião pública? E o PSD até aceita negociar o dossiê das deduções fiscais – restringindo as deduções fiscais dos escalões com maior rendimento, mas mantendo as deduções fiscais para os escalões mais baixos. E tudo isto em nome da Justiça fiscal! Da Justiça fiscal, ouviste, Partido Socialista? Tu, que levaste um soco no estômago e que agora te contorces no chão com dores porque estás a ser humilhado nesta questão por um Partido que, no teu ponto de vista, quer destruir o Estado Social e que apela à tua magnanimidade em nome da Justiça fiscal que tu não espolies as poucas moedas que restam na algibeira dos escalões com menor rendimento! Mas tu, no chão, rangendo os dentes primeiro, trincando a língua depois, arranhando a terra com as unhas, num último esforço, erguendo a mão para o PSD, dizes:
- Eu hei-de sacá-lo! Ricos ou pobres, é-me indiferente! Eu hei-de sacá-lo! Mas tu, PSD, seu malvado, é que queres destruir o Estado Social! E hás-de ir para o sepulcro com esse peso na consciência!
O país não suporta maiores cargas fiscais – caso contrário, seria mais um golpe no consumo privado e continuar a fustigar o crescimento económico. O aumento dos impostos e o reduzido investimento público que se avizinha nos próximos tempos são a garantia certa de uma coisa – crescimento fraco ou nulo, ou recessão, uma vez que não há uma política expansionista pública ou privada.

Mas que estamos nós a dizer? Não haverá investimento público? Haverá pois! Como não haverá?! E o troço do TGV Caia-Poceirão? Esse troço que ligará a Europa ou Poceirão, isso não conta? Sim, só o troço Poceirão-Lisboa foi cancelado pelo Governo na véspera. O Governo que havia cancelado o troço Porto-Vigo e Porto-Lisboa, na mesma conjuntura económica que vivemos hoje, resolveu repensar a ligação Caia-Poceirão-Lisboa. E, depois de bater sucessivamente com a cabeça na parede, chegou à conclusão que o Poceirão é a nossa porta para a Europa! Que o Poceirão é a nossa praia de Madrid! Que São Pedro estará lá no Poceirão a abrir as portas do Éden! Que o Poceirão – mundialmente conhecido pela sua oferta de caviar, trufas e champagne – é a melhor forma de receber os turistas que nos visitam e os homens de negócio que querem investir em Portugal!

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

對於中國的朋友們!

Meus senhores e minhas senhoras, na semana passada dedicou-se a sexta-feira ao nosso querido Portugal, nesta, e por serem por mim considerados não menos importantes que nós, o tempo de antena do Opinador é reservado aos inúmeros chineses que, por força do seu negócio, tanto se têm aproximado do povo lusitano.

Sem mais delongas, até porque é suposto este ser o espaço dinâmico e de fanfarronice deste respeitoso e cultíssimo blog, aqui se apresentam as refinadas e aleatórias opinações dos respectivos colaboradores:


Por Leticia, a Marquesa:
"Aonde vai um chinês, vão logo dois ou três!"



Por M. Pompadour:

Para quem ainda não acreditava que eles são, realmente, mais do que as mães e pensava que era só má língua das pessoas...

"PEQUIM - A auto-estrada que liga Pequim ao Tibete, na China, vive um gigantesco engarrafamento há três dias, que atingiu mais de 120 quilômetros de extensão nesta quinta-feira.

O nó no trânsito começou nas proximidades da capital chinesa, por causa de restrições de velocidade na província de Hebei, segundo a televisão estatal chinesa. Enormes congestionamentos já estão se tornando rotina na China.

Na semana passada, as autoridades conseguiram desobstruir um engarrafamento na mesma auto-estrada que já durava a nove dias e chegou a cem quilômetros. Segundo as autoridades, os problemas nas estradas estão provocando enormes filas em estações de trem no país, a principal alternativa de transporte para os chineses."


Por Carlos Jorge Mendes:
Um chinês típico para mim já não é um chinês comungando do livro vermelho de Mao Tse Tung, venerando as políticas económicas de Deng Xiaoping que granjeram à China o actual desenvolvimento económico. Para mim o chinês típico é um chinês revoltado com o regime comunista, piscando o olho ao capitalismo americano e ao seu grande símbolo - a imitação dos rappers norte-americanos: o hip-hop. O hip-hop é a mais fiel representação da ostentação da luxúria; é a cúpula do céu do sistema capitalista. E aqui temos então um chinês na sua versão gangsta, um verdadeiro engatatão, um ladies men, um PIMP como ele orgulhosamente canta, tal como 50 Cent; e qual é o verdadeiro player que não fala orgulhosamente das suas «bitches» com a camisola por dentro das calças, com óculos à nerd? Tatuagens? Hummers? Diamantes? Soulja Boy? Eu vos apresento o verdadeiro Rei do Crunk...



Por Lord Nelson:
"Uma das razões porque os chineses acreditam que o século XXI será deles..."




Espero que se tenham deleitado tanto quanto nós e mais acrescento que, para os mais distraídos, existe aqui debaixo um link denominado "Comentários" que não empesta o vosso computador de vírus se carregarem. Eu sei que às vezes alguns dos nossos colaboradores dão a entender não ser muito amistosos e isso pode, de facto, causar algum receio nos leitores, mas para isso é que estão cá duas mulheres, a impor respeito. Não sejam tímidos vá.

E parece que cheira a cera queimada... Parabéns Dr Carlos!! :D

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

BRIC – Capítulo II - Rússia

Neste segundo capítulo sobre os BRIC dedicámos a nossa atenção à Federação Russa, talvez o BRIC com mais problemas internos capazes de impedir a sua (re) ascensão como potência económica mundial. São vários, velhos e novos…






Desde logo temos o ambiente político nada democrático que existe naquele país – o que gera uma enorme instabilidade política. O amigo leitor decerto ainda se lembrará do caso da jornalista Anna Politovskaya, que sendo bastante incómoda para o regime foi encontrada morta em casa. E convém não esquecer que após o seu advogado ter dito que ela teria sido assassinada por motivos políticos, foi decidido que o julgamento seria à porta fechada. Tal situação é completamente inaceitável num Estado de Direito. Tal como são inaceitáveis as recentes restrições à liberdade de reunião e circulação de forma a silenciar a oposição. Também o poder judicial não é autónomo encontrando-se sob a directa influencia do poder político – nada mais é que um instrumento político (veja-se o caso Gazprom).


Depois existe o magno problema dos movimentos autonómicos e independentistas, do qual o mais mediático é a situação da Chechénia. Estas situações, para além de diminuírem a necessária paz social propiciadora do crescimento económico, envolvem elevados gastos militares. Ainda estão frescos na memória colectiva os atentados no metro de Moscovo… Tão fresca não estará a agressão brutal do exército russo contra os civis chechenos, mas a Historia é feita pelos vencedores… Um país com regiões separatistas e instáveis não parece estar em condições para ser uma potência mundial.
E os gastos com aqueles militares representam também um outro problema dado que, anualmente, 60 mil milhões de dólares do orçamento da empobrecida Federação Russa são canalizados para um exército demasiado grande e obsoleto. Uma economia ou produz armas ou manteiga (como se ensina nas cadeiras de economia) …
Em quarto lugar – e note o leitor que esta ordenação é arbitrária – temos os problemas sociais. A sociedade russa é uma sociedade desestruturada, com uma elevada incidência de alcoolismo…. Há um enorme problema habitacional (inúmeros blocos de apartamentos soviéticos em condições bastante más) e bastante empobrecida. Os quadros técnicos mais bem qualificados tendem a sair do país à procura de paragens mais verdes,
Todas estas situações vão propiciar um atraso estrutural no tecido produtivo russo ainda débil devido às privatizações mal feitas, tornando-o exportador sobretudo de matérias-primas (hidrocarbonetos e gás natural) e não de produtos manufacturados, em princípio mais rentáveis.
E este atraso produtivo dificilmente será ultrapassado através de uma burguesia emprendedora – classe quase inexistente na Rússia, muito por causa dos 80 anos de ditadura socialista.
A somar a tudo isso temos uma generalizada má imagem internacional da nação russa. Se o amigo leitor se deslocar ao leste europeu encontrará um (compreensível) sentimento anti-russo, desde a Polónia à Geórgia. E durante o consulado de Putin esta imagem degradou-se. Este factor não deve ser negligenciado nos nossos dias – muitos consumidores há que evitam comprar produtos oriundos de países ou criados a partir de processos que não aprovam. Veja-se aqui o caso do movimento Comércio Justo que, paulatinamente, tem vindo a ganhar adeptos.

Pode pois concluir-se que deste grupo de 4 países a Rússia é a que tem maiores dificuldades para superar caso pretenda afirmar-se como a potência económica em 2050, uma vez que não tem grande capacidade de atracção de investimento estrangeiro, tem um tecido produtivo degradado e não possui uma burguesia dinâmica. Não é uma missão impossível… Mas será certamente muito difícil, ainda para mais atendendo à linha que tem sido seguida pelo anterior e actual executivo.

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Debate de nadas

Com a mudança de regras e com a prévia validação da Comissão Europeia aos orçamentos nacionais a priori da sua verificação pelos Parlamentos nacionais – quando deveríamos promover a construção de um orçamento credível que continuasse o esforço de consolidação orçamental, PS e PSD estão de beicinho; PS e PSD arriscam a imagem portuguesa por intrigas de poder; ao adiarem progressivamente um debate sério do Orçamento de Estado em vez de conduzirem e realizarem, desde já, negociações para se aperceberem dos pontos de vista recíprocos, das ideias convergentes e divergentes e, nestas últimas, cinzelarem as cedências mútuas de forma a atingirem um Orçamento de Estado consensual e atempadamente preparado, PS e PSD preparam-se para apresentar um Orçamento feito em cima do joelho e remendado. Em causa está o envio do Orçamento para Bruxelas para ser fiscalizado e ignoram-se as consequências nefastas do mesmo ser reenviado à procedência com uma nota de insuficiente. Os mercados atirariam os braços ao ar, pintariam Portugal de vermelho e seria o apocalipse. Portugal não pode continuar a arriscar a sua imagem externa. Os perigos de Bruxelas não ratificar o Orçamento são enormes – pressão dos mercados e subida das taxas de juro. Estas estão já na casa dos 6%, o limiar do incomportável do crédito. A Grécia que aderiu ao plano de resgate da União Europeia e do FMI financia-se à taxa de 5%. A chegada do FMI estaria, portanto, na iminência. Mais um sinal de que os políticos portugueses são cobardes e incapazes de estar à altura das responsabilidade que a função lhes exige e lhes impõe. Mais do que ao serviço de um partido, os políticos estão ao serviço de um País. A ideologia, no entanto, não é uma paixão cega ao serviço do Partido – é um instrumento racional colocado ao serviço dos melhores interesses do País. O que se discute, porém, em Portugal não são um conjunto ideias, de políticas, de leis, de sistemas, de teorias correlacionadas e interligadas de forma a melhorar a situação do País – o que se discute entre os dois principais partidos é o tacticismo político, é o xadrez eleitoral, é a melhor forma do partido chegar ao poder.

Sucessivamente, ciclicamente, PS e PSD vão-se revezando na liderança governativa. As ideias são sempre as mesmas e despidas de correlatividade; os líderes sucedem-se, as duas ou três frases a que se resume a ideologia do partido ficam. Continuamente, inalteradamente, um traço se mantém – os interesses do partido estão à frente dos interesses da Nação. Não é o Partido que está ao serviço da Nação; a Nação é a forma do partido se nutrir e inchar à custa dela. Os políticos deveriam formar uma elite intelectual cujo valor fosse inatacável, cujo conjunto de impressões integradas e coordenadas depositadas no crânio fossem respeitadas, cuja moral fosse acima de qualquer suspeita – eles deveriam exercer uma influência fecunda sobre as camadas mais baixas da população, iluminando-as com a luz das suas ideias, com a autoridade do seu saber, da sua ciência, da sua cultura, do seu labor. As ideias são, porém, pegadas pelas orelhas e enxotadas a pontapé pelas cúpulas politicas. O PSD é o exemplo mais notório. Com um líder eleito há poucos meses, os seus militantes históricos arrancam os seus próprios cabelos, desesperadamente, com as mãos não por discordarem das ideias de Passos Coelho, mas porque o prazo escolhido para a divulgação das mesmas não foi oportuno. E porquê? Porque o PSD tem um projecto de revisão constitucional que foi apresentado extemporaneamente; porque o PSD apresentou as suas ideias próprias e isso pode trazer resultados eleitorais desfavoráveis; porque o PSD está arredado do poder desde 2005 e necessita de voltar rapidamente ao Governo pois isso não apraz a certos compadres a quem promessas foram feitas. A característica comum de todos estes factos é o calculismo eleitoral. O líder do PSD tem as suas ideias, criadas pela sua própria cabeça, e não pelos seus piolhos, pela sua inércia, mas o eleitorado pode não gostar das mesmas. É, de facto, um dilema de difícil resolução. Que deve ele fazer? Deve ele, pois, defender as suas ideias, perorar sobre elas, persuadir os outros delas, convencer os outros do seu poder correlativo, explicá-las, lutar por elas? Não, nada disso – em Portugal, alguém que tem ideias deve camuflá-las porque é vergonhoso ter ideias próprias! Aquele que sai à rua com ideias é olhado com desconfiança, parece que tem sarna, é apontado com o dedo, é falado em surdina ao início e no fim é motivo de chacota de toda a gente. O que queremos é que o PSD critica o seu próprio líder não pelas ideias que apresentou, mas sim pelo espaço temporal em que as apresentou.

Eis então como em Portugal se perde tempo a discutir problemas de forma e não de substância. A forma é útil nas Artes – não na Política. As ideias em Portugal devem, portanto, ser guardadas dentro do armário para altura conveniente; e então sim, bolorentas e bafientas devem ser soltadas sobre o público.

terça-feira, 14 de setembro de 2010

BRIC – Capítulo I - Brasil

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No mundo actual sempre que se fala em economias emergentes, fala-se em BRIC – Brasil, Rússia, Índia e China. E de todas, talvez com a excepção da Rússia, a que tem o seu potencial menos bem aproveitado é o Brasil (isto em termos de putativo crescimento económico, bien entendu). A nossa ex-colónia tem apostado num modelo de Estado Social e isso vem-se reflectido no seu ritmo de crescimento que tem sido inferior ao chinês e indiano. Talvez seja este um dos motivos que faz com que muitos dos analistas vejam o Brasil como o menos emergente das economias emergentes.
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Sustentar um modelo social tem custos produtivos – qualquer sebenta de finanças públicas o dirá. Ora, caso o Brasil não abdique do seu modelo social que atrasa o desejado crescimento económico, terá de apostar na estabilidade e seriedade da vida política para atrair os investimentos, e assim remediar o problema. No entanto, para isto funcionar é também necessária seriedade no debate político, coisa que não abunda na América Latina.
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Haverá já um grande teste à política brasileira no próximo mês, mais precisamente a 3 de Outubro, dia em que os eleitores brasileiros vão às urnas escolher o sucessor de Lula da Silva, os governadores dos 26 estados, a Câmara dos Deputados e o Senado Federal.
Será interessante verificar se o PT se manterá no poder, depois do mensalão e do fracasso do programa Fome Zero, bandeira eleitoral de Lula. A acreditar nas sondagens parece que o Brasil vai querer mais do mesmo, já que a candidata Dilma Rousseff, do PT, lidera as intenções de voto. A verificar-se este cenário é de crer que o modelo de Estado social, não será posto em causa no Brasil. Continuarão a ser dados apoios ao membros improdutivos da sociedade e continuarão a ser taxados os membros mais produtivos. A geração actual parece incapaz de abdicar de alguma protecção para garantir um lugar cimeiro às gerações futuras.
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Restaria pois ao Brasil, para poder sonhar em ser o líder dos BRIC, desenvolver um ambiente político evoluído e sério, quase europeu. No entanto, as imagens que nos chegam daquelas paragens deixam muito a desejar. O amigo leitor veja, por gentileza, este vídeo. (Não é bricadeira, é mesmo um candidato!)
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Incapaz de largar o caduco modelo social ou de deixar o estigma sul americano da vida política, o Brasil arrisca-se a ser o último dos BRIC em 2050, exportando sobretudo matérias primas e importando bens manufacturados, situação que perpeturá o seu lugar subalterno.
E isto porque a geração actual não conseguiu abdicar de algumas protecções em benefício dos seus filhos, já que a seriedade anda longe… Este é, e sempre será o grande mal dos modelos sociais. Mais cedo ou mais tarde essas sociedades ficam para trás e as garantias que os pais gozaram, vão perde-las os filhos.
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Mas o Brasil ainda tem tempo – necessita é de optar: ou Estado social ou liderança mundial. Nós é que já lá não chegamos… Pelo menos sozinhos!

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Se o leitor gosta desta matéria e gostaria de ler mais acerca disto, permita-me recomendar esta leitura.

Até 5a!

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Today is for the men

Minhas amigas, (sim, desta vez é para elas que a minha atenção será dedicada) como mulher heterossexual que sou, padeço dessa mesma doença da qual a grande maioria de vocês sofre: gostar do sexo oposto. Mas para além de gostar dos homens, nós, enquanto seres complexos e determinados, queremos sempre percebê-los quando, na maioria dos casos, não há nada para perceber.

Quantas de nós, em conversa de café, não desabafou com a amiga e recebeu em troca um: “O meu namorado fez exactamente o mesmo!”? Ou mesmo em conversa com a mãe, quantas de nós não ouviram já um: “O teu pai era tal e qual…!”. Pois é, para mim isto pouco mais significa do que a confirmação daquela enorme máxima de que os homens são, de facto, todos iguais. Podem sentir de forma diferente, ser mais ou menos sensíveis, mais ou menos criativos, mas a verdade é que no fim de contas acabam por agir todos da mesma forma.

É verdade que no início é tudo maravilhoso, encantam-nos cheios de charme e dedicação, fazem-nos suspirar com tiradas simpáticas e românticas e nós, apaixonadas e líricas derretemo-nos de felicidade. Passados aqueles primeiro e segundo mês da conquista tudo se torna menos brilhante e sim, todas temos a sensação de que ele já foi mais empenhado, prestava-nos uma atenção diferente, era mais entusiasta… Até que entra em cena aquele fantasma chamado: rotina. E é nessa altura que achamos que tudo está a ganhar a forma de uma casamento desenrolado em casas separadas, com horários para sms e encontros de fim-de-semana. Resta então a tentação de os compreendermos, questionar o por quê do aparente desinteresse e ausência de vontade de fazer coisas originais, tornamo-nos exigentes e frustradas e, se eles não correspondem e tentam apenas levar a melhor, a relação definha até ao inevitável fim.

Poderia, eventualmente, fazer dezenas de piadas acerca dos homens, caricaturar as infelizes saídas e excesso de confiança que por vezes demonstram, apontar-lhes o dedo à simplicidade dos gestos e fraca inspiração para corresponderem ao nosso ideal de príncipe encantado, sempre pronto a surpreender e deixar-nos arrebatadas... Mas vivemos em pleno século XXI, as convicções são outras e, porque alguém decidiu um dia abrir a boca e gritar a plenos pulmões que as mulheres são independentes e emancipadas, os homens tendem a ver-nos como iguais, sem necessidade de tratamento VIP.

Tudo isto para esclarecer algumas dúvidas com que podem estar neste momento a debater-se. Caríssimas amigas, passados que são os primeiros meses de uma relação os homens são como as revistas das salas de espera do salão de beleza: já as vimos todas, por isso comecem a mentalizar-se, se uma das vossas conhecidas tem um namorado fora da regra, super excepcional, algum dia acabará por se revelar, não há volta a dar. Temos de aprender a lidar com este novo tipo de homem e, se não consegues vencê-lo, junta-te a ele.

domingo, 12 de setembro de 2010

Estou sobreendividado. E agora?

Actualmente (sobre)vivemos numa sociedade sobreendividada. Os anos 90 foram férteis no que à obtenção de dinheiro fácil diz respeito. Muitos foram aqueles que celebraram mútuos financeiros para aquisição de imóveis, de viaturas automóveis ou equipamentos e até mesmo para viajarem. O tempo das vacas gordas passou. As dívidas ficaram. Outros mútuos financeiros foram contraídos para pagar as prestações mensais vencidas e vincendas relativas aos anteriores mútuos. As dívidas aumentaram. Muitas pessoas viram-se subitamente no desemprego e os pagamentos das prestações foram-se arrastando até se tornarem impossíveis. Muitos foram os que perderam as suas casas porquanto as instituições bancárias possuíam direitos hipotecários sobre elas. "E agora?", perguntam milhares de pessoas que se revêem nas circunstâncias supra descritas e a braços com dívidas de 100, 200, 300 mil euros ou mais. Estas pessoas julgam que não há solução para o seu problema, mas felizmente não sabem o quão tremendamente estão enganadas.

Estas pessoas têm a possibilidade de lhes ser dada uma segunda oportunidade ou, numa terminologia norte-americana, um fresh start. Para tanto, uma pessoa que se encontre nesta situação tem, em primeiro lugar, de requerer que seja judicialmente decretada a sua insolvência. Uma vez declarada, se a pessoa não for empresária ou se for proprietária de uma pequena empresa (empresa com menos de 50 trabalhadores), pode apresentar um plano de pagamentos que preveja uma forma de liquidar os créditos aos credores. Este plano de pagamentos é uma espécie de proposta de medida de recuperação patrimonial, no interesse de todos os credores que, uma vez por eles aceite, permite encerrar o processo de insolvência, cessando todos os efeitos dele advindos. Todavia, se este plano não for aceite pelos credores ou se a pessoa assim o desejar, pode requerer, no próprio processo de insolvência, a designada exoneração do passivo restante. Esta exoneração permite ao insolvente ver-se livre de todas as suas dívidas (salvo mesmo muito raras excepções), caso estas não sejam pagas no próprio processo de insolvência ou nos 5 anos posteriores ao seu encerramento, desde que cumpra afincadamente determinadas condições. Estas traduzem-se no facto de, no decurso dos 5 anos após o encerramento do processo de insolvência, o devedor insolvente ficar obrigado a ceder todos os seus rendimentos (à excepção do estritamente necessário para prover ao seus sustento e ao do seu agregado familiar, montante fixado pelo juiz) a uma entidade nomeada pelo juiz (apelidada de fiduciário, normalmente um administrador da insolvência). O fiduciário notificará os credores no final de cada ano do montante recebido e entregará aos credores uma parte para abater à dívida existente. Se no decurso dos 5 anos tudo decorrer com normalidade e se o devedor insolvente pautar a sua conduta sempre pela rectidão, honestidade e boa fé, ser-lhe-á concedida então a exoneração do passivo restante, extinguindo-se todas as dívidas que ainda ficarem eventualmente por pagar. Este processo permite que as pessoas tenham uma nova oportunidade e recomecem uma vida sem dívidas e sem as preocupações que as faziam acordar a meio da noite atormentadas com o que ainda faltava pagar e sem forma de o conseguirem.

Esta possibilidade de renascimento é ainda uma solução desconhecida para muitos. No entanto, já são bastantes aqueles que recorrem a este tipo de processos para se verem livres das avultadas dívidas em que mergulharam. Apesar de o Ministério da Justiça ainda não possuir os números de declaração de insolvência de pessoas singulares do ano transacto, só de 2006 (370) para 2008 (651) o número de devedores insolventes já duplicou.

Mas como não há bela sem senão... As instituições bancárias, perante esta nova realidade, ao se aperceberem que grande parte dos seus créditos vão sendo extintos quase por artes mágicas, já estão a reafirmar a sua posição e a tentar que esta possibilidade de fresh start das pessoas singulares seja escrutinada e revista. Mas, por enquanto, tudo isto ainda é possível. É que recomeçar do zero já é difícil o suficiente!

A vida está má, está... Até para os marqueses!

sábado, 11 de setembro de 2010

Cenas da Política Portuguesa

Enquanto a situação económica e social do Pais progressivamente se deteriora, os dois principais partidos do sistema político entretém-se com recadinhos. Estes recadinhos fazem o deleite dos jornais – ei-los enfeitando as suas manchetes com frases vazias de substância e de correlatividade, donde nada se extrai a não ser a imbecilidade. Isto não serve em nenhum propósito os interesses do País e em nada resolve os problemas com que ele se debate desde a Era dos Descobrimentos. A rentrée política é a época da silly season com a similitude de que toda a anterior legislatura foi igualmente uma silly season. Ela apenas tomou férias uma vez que os seus intervenientes também tomaram férias. De resto, que produziu a legislatura passada? Dois Programas de Austeridade. Muito bem...Somos o único país da Europa cujas metas de redução do défice estão seriamente ameaçadas; dois programas, portanto, provavelmente votados ao fracasso. A receita pública, graças à extraordinária habilidade política aumentou – recorreu-se para isso a um método inovador: o aumento de impostos. Neste aspecto, divergimos do Primeiro-Ministro, para o qual continua a não haver aumento de impostos. A outra parte, a despesa pública, essa safada escorregadia, teima em fugir-nos entre os dedos e subiu 6% no primeiro semestre. Esgotados da habilidade conseguida com o aumento da receita pública, não sobrou energia aos nossos governantes para conseguir a redução da despesa. Isto num ano em que o esforço de consolidação orçamental, supostamente, deveria provir, em partes iguais, da receita e da despesa – e isto porque o PSD fez finca-pé em tal. Mas e que mais produziu esta legislatura? Sem qualquer desrespeito para os homossexuais, quando o símbolo principal de uma legislatura é a aprovação do casamento homossexual – algo nos diz que a Assembleia da República andou a sornar durante um ano.

Três senhores da agência de rating Standard & Poor’s estiveram esta semana no Parlamento português, precisamente no debate que pretendia discutir o descontrolo da despesa pública nos primeiros seis meses do ano. Questionando as pessoas que os acompanhavam sobre o que se discutia naquela sessão, os três senhores ficaram atónitos:
- Olhe amigo, é o seguinte: o Governo está tão confiante que vai reduzir a despesa pública este ano que nos primeiros seis meses do ano até lhe deu um avanço de 6%!
Os três, franzindo a sobrancelha, responderam em uníssono, desconfiados:
- I seeI see
Após um momento de silêncio, um dos três senhores da S&P, batendo com a palma da mão na testa, perguntava:
- Olha lá, não foram estes indivíduos que há uns tempos nos acusavam de lhes reduzir o rating sem motivo aparente?
Os três olhavam agora o Parlamento como se o açoitassem. Tudo isto arrepiava os homens de horror. O outro homem, no entanto, vendo a expressão sofredora dos três analistas, pitadeou então com gozo:
- Mas há pior, gentlemen
Os três homens recuaram por um momento, assombrados. Pois quê? Pior do que o descontrolo público orçamental, pior do que a incontinência da despesa pública que continua a verter à ordem de 6% por semestre – não!, os três homens não o poderiam acreditar.
Então, o outro homem, pausado, grave, sereno, explicou a artimanha governamental – chamava-se desorçamentação. Um terror tolheu os três. Nesse momento, as galerias pareciam-lhes mais lúgubres. E o outro, terrível e lívido, continuava, como se as suas palavras se assemelhassem a relâmpagos:
- É a arte de fazer varrer para debaixo do tapete o nosso défice público. Coisa muito usada por estas bandas.
Uma voz atroou então mais forte na Assembleia da República. Era o Secretário de Estado do Orçamento que, escarlate e sério, dizia:
- Não vos preocupeis, Oposição. Portugal está abaixo da Alemanha e da França no aumento da despesa pública…
Os três homens da S&P suspiraram. Uma ovação ribombou na bancada parlamentar do PS (Vozes: Muito bem! Muito bem!).
Portugal está pois a salvo. O Secretário de Estado do Orçamento vela pelos nossos destinos…

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Portugal

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Cabe-me a mim a honra de dar início a este projecto de "humor as 6as". Antes de tudo gostaria de deixar o meu público reconhecimento a todos os opinadores cujo empenho foi crucial para que este projecto se tornasse realidade.
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Através desta nova abordagem não pretendem os autores descredibilizar este blog, que tenta manter um debate intelectualmente sério sobre alguns dos problemas do mundo actual. Pelo contrário; através deste novo formato gostaríamos apelar a novos públicos, cativando o antigo, num registo mais informal mas sempre com a precupação de criticar os costumes: ridendo castigat mores...
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Neste sentido, será semanalmente sugerido um tema (o primeiro é, como não podia deixar de ser Portugal) e cabe a todos os Opinadores arranjar algo que, com fino humor, se adeque ao tema.
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Neste primeiro post do "humor às 6as" todos os opinadores optaram por vídeos... Ora pois saibámos então o que é Portugal para esta gente...

Madame de Pompadour:
Para mim, Portugal não é Portugal sem uma fieira de ouro, um sotaque curioso e uma péssima imitação de uma frase marcante de um filme. BROCK YOU FUCKERS!



Letícia, a Marquesa:



Carlos Jorge Mendes:



Lord Nelson:
Portugal, país minúsculo, é nada mais que um conjunto de famílias... E essas famílias são o que se vê neste quadro, representativo de uma domus lusitana! É uma casa portuguesa concerteza, é concerteza uma casa portuguesa!


quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Febre Eleitoral





Depois dos imperialismos clássicos pré segunda guerra mundial, o continente africano conheceu uma nova forma de dominação que passava pelo apoio mais ou menos explícito dado a ditadores mais ou menos avariados que as super-potências (leia-se E.U.A. e U.R.S.S.) davam. Golpes orquestrados, corrupção generalizada, parlamentos fantoches, guerras civis, tudo se encontrava em África.
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Passaram as guerras frias e quentes, uma das super-potências deixou de ser super e a outra passou a olhar mais para oriente no mapa. E África continuou com os seus problemas estruturais, tentando por vezes chegar à democracia, quase sempre com inúmeros atropelos.
Eis que chegamos ao ano da Graça de 2010, no qual, pasme-se o leitor, haverão 48 actos eleitorais pelo continente! Uma verdadeira febre eleitoral percorre o continente. É notório que uma eleição em África não é, grosso modo, igual a uma eleição europeia… Desde o recenseamento mal feitos, às promessas de retaliação, às tentativas de silenciar a oposição, tudo vale para manter o poder.
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Tal já foi o caso no Burundi (onde o candidato no pode ganhou com 92% dos votos!) ou na Etiópia (onde dos 547 parlamentares eleitos apenas 2 são da oposição). Mas casos mais graves há como no Quénia – onde o presidente Mwai Kibaki, apesar de ter perdido as eleições, se recusou a sair do cargo, ou dos sobejamente conhecidos Zimbabué ou Guiné-Conacri.
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Eleições em África são sempre momentos de tensão, onde alguma faísca pode despoletar a mais bárbara violência. E há lugar a receios – o Sudão vai a eleições (e o executivo actual não quer mesmo perder, pois teria de enfrentar acusações de genocídio) e a Nigéria também – onde os conflitos étnicos estão na ordem do dia.
Mas um ponto aparece desde já como positivo – a necessidade de os líderes africanos procurarem uma legitimidade de título (ainda que por meios bastante duvidosos) marca uma evolução nas mentalidades: os povos de África começam a exigir um aperfeiçoamento dos sistemas políticos e o regresso dos militares aos quartéis.
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Uma nota final para um bom exemplo – a Somalilândia. Este Estado separatista do falhado estado somali conseguiu realizar eleições democráticas (com padrões aceitáveis) e houve alternância de poder entre dois civis, sem qualquer problema nem ameaça. Se não fosse a paisagem poderia dar a impressão de que estaríamos no número 10 de Downing Street.




Findo o assunto que nos ocupa, vamos agora informar o leitor de uma nova dinâmica no nosso Opinador. Às sextas passaremos a ter um novo formato. À volta de um tema sugerido, o nosso painel opinativo procurará fazer chegar ao leitor vídeos, imagens ou textos, relacionados com a temática mas com humor. Será o nosso espaço de humor às sextas, para o nosso querido leitor ir para o fim-de-semana com um sorriso rasgado.
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Começa já amanhã!

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

O Processo Casa Pia

De um lado homens que, outrora em crianças foram abusadas sexualmente; do outro lado, homens sobre os quais recaem fortes suspeitas de terem realizado os abusos. É fácil prever de que lado estarão os corações. A Justiça, no entanto, não pode formar juízos a priori. Ela tem de aguardar pelos elementos carreados ao processo para formar o seu juízo de forma independente. E esse é o objectivo do julgamento – determinar, para além de qualquer dúvida razoável, a culpabilidade dos arguidos: por isso se diz que todos os factos relevantes para a decisão que, apesar de toda a prova recolhida, não possam ser subtraídos à dúvida razoável do tribunal, também não possam ser considerados como provados – in dubio pro reo. A publicidade desta sentença tinha, sobretudo, um objectivo – demonstrar aos portugueses da culpabilidade dos arguidos. Este objectivo não foi alcançado. Pelo contrário, as dúvidas apenas se intensificaram. A não indicação dos factos que levaram à condenação apenas contribui para intensificar a neblina que rodeia todo o processo Casa Pia. Se ninguém duvida de que os abusos foram efectivamente cometidos, há já dúvidas sérias de que aqueles arguidos – ou alguns deles – foram verdadeiramente os abusadores. Esta era a missão do tribunal – demonstrar para além de qualquer dúvida razoável a culpabilidade dos arguidos. A demonstração da culpabilidade dos arguidos baseia-se em factos, em provas e não na indicação sumária da medida da pena.
A questão da súmula não serve de desculpa à ausência de fundamentação. Se a súmula é permitida pelo Código de Processo Penal e justificada à luz da extensão material do caso, nada justifica que os juízes não tenham especificado os fundamentos da condenação – precisamente a parte fundamental de todo o Acórdão.

A verdade é que os arguidos foram condenados, sendo-lhes indicada a medida da pena, mas não a discriminação dos motivos que levaram a essa mesma condenação. Negar ao arguido a possibilidade de conhecer os fundamentos que levaram à sua condenação não é aplicar justiça – é, na verdade, um non liquet, em que não pode ser permitido ao juiz, mesmo tratando-se de uma súmula, furtar-se aos fundamentos da decisão, condenando o arguido a uma pena privativa de liberdade, sem lhe dar a conhecer as razões na origem de tal decisão.
Argumentar que a fundamentação completa do Acórdão estará disponível no dia de hoje não procede – ninguém poderá dizer que não está ciente de que a aplicação da medida de pena, destituída de uma fundamentação que a acompanhe, tem reflexos na formação dos juízos da opinião pública. Um julgamento acompanhado ao segundo na televisão e em que no momento da divulgação das penas apenas se faz referências às mesmas, contribui-se para a formação de um julgamento sumário sobre a condenação dos arguidos. Sentenciar uma pessoa a pena de prisão sem que esta conheça os fundamentos da decisão e as provas que contribuíram para a formação desse juízo é denegar o Estado de Direito.
A Justiça é, com efeito, administrada em nome do povo. A protecção dos bens jurídicos é feita em nome da comunidade e é o restabelecimento da paz jurídica posta em causa pelo crime e a consequente reafirmação da validade da norma que se visa com o processo penal. Quando a Justiça está, porém, dependente de um caso para provar o seu funcionamento – algo vai mal. A Justiça deve-se revelar distante de ímpetos sanguinários, ela não pode ceder aos temperamentos ardentes, mas sim deter-se nas frias leis, factos e provas.

A publicidade do processo é importante para dissipar quaisquer desconfianças que possam surgir na comunidade e na opinião pública sobre a imparcialidade da justiça penal – e, por isso, o acompanhamento por parte de televisões, rádios e jornais do processo é salutar. Este acompanhamento deve, no entanto, seguir o objectivo pelo qual o princípio da publicidade existe: dissipar as desconfianças. Isto esteve longe de acontecer. Os jornalistas revelaram-se uns abutres; o seu desejo era saber coscuvilhar e não informar; toda a preocupação se volta para a conquista de audiências por parte da televisão e pelo jornal que pretende vender no dia seguinte; o objectivo de escrutínio público e de informação dos cidadãos que formam a comunidade estadual foi vandalizado à custa do espalhafato mediático.
A preocupação excessiva com os media foi clara. Houve maiores providências em proteger um círculo mediático do que assegurar o regular funcionamento da justiça. O não facultamento aos advogados dos arguidos de cópias da sentença é surreal. A preocupação clara com o privilégio da forma sobre a substância não contribui para a credibilização da Justiça portuguesa. E não será a condenação de 6 dos 7 arguidos do processo Casa Pia que irá lavar a face da Justiça portuguesa. Ela não se resume a um caso – todos os casos são igualmente importantes para a Justiça. A conclusão do processo Casa Pia em sede de primeira instância em nada resolve os seus problemas. A Justiça tem de assegurar o seu funcionamento como um todo e não pode estar dependente do mediatismo de determinados casos para provar a sua valia.

Figueiredo Dias indica dois fundamentos essências da política criminal nos dias de hoje. “Um primeiro aspecto que importa salientar é o que se prende com a celeridade do processo” em que “o efeito de prevenção geral do sistema penal não depende em quase nada de uma grande severidade das penas, mas depende em extremo grau da probabilidade da punição e do lapso de tempo dentro do qual ela venha a efectuar-se. Acresce, por outro lado, a probabilidade da justeza da decisão”. Eis então como o Acórdão da Primeira Instância falhou, seguramente, em pelo menos um dos aspectos – a celeridade – e não transmitiu a certeza necessária relativamente ao segundo – a justeza da decisão.