A mais bela, a mais pura e a mais duradoura glória literária de prosa da blogosfera

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quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Debate de nadas

Com a mudança de regras e com a prévia validação da Comissão Europeia aos orçamentos nacionais a priori da sua verificação pelos Parlamentos nacionais – quando deveríamos promover a construção de um orçamento credível que continuasse o esforço de consolidação orçamental, PS e PSD estão de beicinho; PS e PSD arriscam a imagem portuguesa por intrigas de poder; ao adiarem progressivamente um debate sério do Orçamento de Estado em vez de conduzirem e realizarem, desde já, negociações para se aperceberem dos pontos de vista recíprocos, das ideias convergentes e divergentes e, nestas últimas, cinzelarem as cedências mútuas de forma a atingirem um Orçamento de Estado consensual e atempadamente preparado, PS e PSD preparam-se para apresentar um Orçamento feito em cima do joelho e remendado. Em causa está o envio do Orçamento para Bruxelas para ser fiscalizado e ignoram-se as consequências nefastas do mesmo ser reenviado à procedência com uma nota de insuficiente. Os mercados atirariam os braços ao ar, pintariam Portugal de vermelho e seria o apocalipse. Portugal não pode continuar a arriscar a sua imagem externa. Os perigos de Bruxelas não ratificar o Orçamento são enormes – pressão dos mercados e subida das taxas de juro. Estas estão já na casa dos 6%, o limiar do incomportável do crédito. A Grécia que aderiu ao plano de resgate da União Europeia e do FMI financia-se à taxa de 5%. A chegada do FMI estaria, portanto, na iminência. Mais um sinal de que os políticos portugueses são cobardes e incapazes de estar à altura das responsabilidade que a função lhes exige e lhes impõe. Mais do que ao serviço de um partido, os políticos estão ao serviço de um País. A ideologia, no entanto, não é uma paixão cega ao serviço do Partido – é um instrumento racional colocado ao serviço dos melhores interesses do País. O que se discute, porém, em Portugal não são um conjunto ideias, de políticas, de leis, de sistemas, de teorias correlacionadas e interligadas de forma a melhorar a situação do País – o que se discute entre os dois principais partidos é o tacticismo político, é o xadrez eleitoral, é a melhor forma do partido chegar ao poder.

Sucessivamente, ciclicamente, PS e PSD vão-se revezando na liderança governativa. As ideias são sempre as mesmas e despidas de correlatividade; os líderes sucedem-se, as duas ou três frases a que se resume a ideologia do partido ficam. Continuamente, inalteradamente, um traço se mantém – os interesses do partido estão à frente dos interesses da Nação. Não é o Partido que está ao serviço da Nação; a Nação é a forma do partido se nutrir e inchar à custa dela. Os políticos deveriam formar uma elite intelectual cujo valor fosse inatacável, cujo conjunto de impressões integradas e coordenadas depositadas no crânio fossem respeitadas, cuja moral fosse acima de qualquer suspeita – eles deveriam exercer uma influência fecunda sobre as camadas mais baixas da população, iluminando-as com a luz das suas ideias, com a autoridade do seu saber, da sua ciência, da sua cultura, do seu labor. As ideias são, porém, pegadas pelas orelhas e enxotadas a pontapé pelas cúpulas politicas. O PSD é o exemplo mais notório. Com um líder eleito há poucos meses, os seus militantes históricos arrancam os seus próprios cabelos, desesperadamente, com as mãos não por discordarem das ideias de Passos Coelho, mas porque o prazo escolhido para a divulgação das mesmas não foi oportuno. E porquê? Porque o PSD tem um projecto de revisão constitucional que foi apresentado extemporaneamente; porque o PSD apresentou as suas ideias próprias e isso pode trazer resultados eleitorais desfavoráveis; porque o PSD está arredado do poder desde 2005 e necessita de voltar rapidamente ao Governo pois isso não apraz a certos compadres a quem promessas foram feitas. A característica comum de todos estes factos é o calculismo eleitoral. O líder do PSD tem as suas ideias, criadas pela sua própria cabeça, e não pelos seus piolhos, pela sua inércia, mas o eleitorado pode não gostar das mesmas. É, de facto, um dilema de difícil resolução. Que deve ele fazer? Deve ele, pois, defender as suas ideias, perorar sobre elas, persuadir os outros delas, convencer os outros do seu poder correlativo, explicá-las, lutar por elas? Não, nada disso – em Portugal, alguém que tem ideias deve camuflá-las porque é vergonhoso ter ideias próprias! Aquele que sai à rua com ideias é olhado com desconfiança, parece que tem sarna, é apontado com o dedo, é falado em surdina ao início e no fim é motivo de chacota de toda a gente. O que queremos é que o PSD critica o seu próprio líder não pelas ideias que apresentou, mas sim pelo espaço temporal em que as apresentou.

Eis então como em Portugal se perde tempo a discutir problemas de forma e não de substância. A forma é útil nas Artes – não na Política. As ideias em Portugal devem, portanto, ser guardadas dentro do armário para altura conveniente; e então sim, bolorentas e bafientas devem ser soltadas sobre o público.

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