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sábado, 29 de janeiro de 2011

A Revolução no Egipto

Seguindo-se à Revolução na Tunísia, surge agora a Revolução no Egipto. Pelo quinto dia consecutivo, o povo junta-se nas ruas e eclodem os protestos: no Cairo, em Alexandria, em Mansour, no Suez. Não é um grito de revolta isolado, trata-se da voz do povo que se ergue em uníssono.




















No dia de hoje, com o objectivo de acalmar a onda de protestos o Presidente Mubarak demitiu o Governo – é a primeira vítima das manifestações. Decerto não será a última. Queria o Presidente Mubarak fazer crer ao povo que escutava os seus protestos, que pretendia de agora em diante, de acordo com os desejos do povo, iniciar um novo movimento de reformas ao Egipto que lhe traria maior democracia e liberdade. Debalde – as manifestações continuam. O movimento espontâneo do povo egípcio não aponta aos braços e aos pés do regime, àqueles que constituem os instrumentos acessórios do poder: aponta directamente ao coração. E o coração deste regime é o seu símbolo máximo: o Presidente. Das duas uma: ou as manifestações acabam com a queda do regime de Mubarak ou terminam com uma repressão violenta e bárbara das forças de segurança sobre os manifestantes. Este último cenário é cada vez mais improvável – o Presidente chamou os militares a actuar; os militares juntaram-se a sua voz à do povo nos protestos. E este é um factor que faz a separação entre o sucesso e o insucesso: no caso da Tunísia, também os soldados apoiaram o povo nos seus protestos e a Revolução triunfou; no caso do Irão, na Revolução Verde de há dois anos atrás, a guarda pretoriana de Ahmadinejad e a coesão que se revelou entre o exército na defesa do regime acabou por segurá-lo.
Todos estes protestos, no entanto, têm uma base comum – é o descontentamento do povo árabe face a um regime numa fase claramente degenerativa da sua vida, numa crise aguda de legitimidade que apenas a força opressora do exército disfarçava. Pois bem: o povo deixou de ter medo – vem às ruas, grita, protesta, revolta-se, insubordina-se, rebela-se, ergue a sua voz.

A Revolução na Tunísia teve um efeito sobre os restantes povos dos países árabes: antes, o povo resignava-se perante as suas condições de vida miseráveis, perante o autoritarismo, perante a falta de liberdade: o regime brandia o exército numa das mãos e o povo tremia. Em Janeiro, o povo tunisino esmagou o medo: saiu à rua e triunfou. Demonstrou a todo o povo árabe o poder da crença – o poder de acreditar num ideal: a liberdade, a democracia. Demonstrou que a democracia prosperando por entre os Países Árabes não é um mero sonho de intelectuais utópicos: é a concretização da vontade do povo árabe, do povo por si, livremente organizado, agindo como um todo, sem uma força inspiradora que lhes insufle a vontade a não ser o ideal da liberdade.


E este movimento que irrompe em todo o Mundo Árabe deve fazer pensar os Europeus: deve fazer pensar uma certa direita xenófoba que emerge cada vez mais na Europa: na Holanda, por exemplo, os radicais de Geert Wilders, um anti-islamista, partilham o poder com o centro-direita. Espalham a sua mensagem populista entre o povo e, aqui e além, vai penetrando. Um pouco por toda a Europa, o discurso anti-islamista vai prosperando, negligenciando as consequências que, no futuro, daí poderão advir.


Pois bem: o povo árabe demonstra agora o seu verdadeiro carácter. Não se tratam de islamistas radicais, de meros títeres de meia dúzia de extremistas religiosos: a sua voz permaneceu calada todo este tempo; mas porque havia um regime ditatorial, opressor, autoritário que esmagava essa voz e o povo remetia-se ao medo e ao silêncio. Os dirigentes destes regimes não educavam o povo, não o cultivavam; apontavam-lhe apenas um caminho: a religião. Na ausência de outras forças inspiradoras, a religião foi durante muito tempo o ideal que conferiu sentido à vida do povo árabe. Não mais: o pensamento do povo árabe não se dirige ao radicalismo religioso, à corrupção, dirige-se sim à aspiração da liberdade, da dignidade do homem, da democracia. E o povo não deixará mais que outras pessoas se interponham entre si e a sua vontade e que falem em seu nome.

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