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terça-feira, 13 de setembro de 2011

Fome e Fartura


Num excelente artigo (publicado no jornal The East African de Naiorobi e com tradução disponível no último número do Courrier Internacional) Charles Obbo chama a atenção para os efeitos nefastos da ajuda internacional dada pela comunidade internacional às nações do corno de África.

Inicialmente, poderíamos colocar a questão da legitimidade dos nossos governantes para dar o que não é seu, mas da comunidade que os elegeu – os nossos governantes têm de orientar a sua actividade para a gestão da coisa pública, pois foi para isso que foram eleitos. Assim enquadrada a sua actividade pode, em bom rigor, ser pouco defensável as “doações” que a comunidade internacional, rectius, os Estados costumam fazer – esta posição é politicamente incorrecta, bem o sei, mas compensa na coerência.

De qualquer das formas sempre se poderia colocar a questão de saber porque motivo os países do corno de África não se preparam para as situações de fome, que se conseguem prever (devido às condições climatéricas), deixando o curso dos acontecimentos seguir. Obbo, jornalista ugandês, avança desde logo um motivo extremamente simples – as elites desses países não passam fome – é um assunto que afecta primeiramente as zonas rurais e pode muito bem servir para capitalizar politicamente.


As elites daquele país chegam mesmo a beneficiar das situações de fome pois estas, por um lado, são um instrumento de alienação eficaz e, por outro, como são responsáveis, muitas vezes, pela gestão da ajuda da comunidade internacional podem muito bem beneficiar uns e não outros… O leitor já percebeu a mecânica disto.


Mas também as grandes empresas ligadas à agricultura têm muito a lucrar – basta pensar nas regras da oferta e da procura: nestas situações de emergência, em que o tempo é escasso, a comunidade internacional é obrigada a comprar milhões de toneladas de alimentos o que causa, obviamente, a subida dos preços (o que também vai aumentar o número de pessoas que deixam de poder comprar alimentos, especialmente nos países em vias de desenvolvimento – recorde-se que a revolta na Tunísia começou também por causa da subida do preço dos alimentos).


Lucram as elites que deixam os povos à fome, lucram as multinacionais que se aproveitam para maximizar os lucros e perde a comunidade internacional (que desperdiça recursos) e os pobres dos países em vias de desenvolvimento que, por causa do aumento dos preços, deixam de os poder adquirir.


Da próxima vez que ouvir falar de fome, ilustre leitor, em vez de clamar imediatamente por sacos de arroz sobre a Etiópia, comece a exigir o fim da política da caridadezinha – não é muito, mas é um começo. A caridade é para as ONG’s, não para os Estados.


Impõem-se outras soluções para estes Estados falhados (frutos das exigências politicamente correctas de “descolonização”) e a ONU é o fórum ideal, já que para de pouco serve.

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