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sábado, 20 de agosto de 2011

As Comunicações do Sr. Presidente da República e do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros

Esta semana foram divulgadas e por esse meio confirmados publica e oficialmente os receios relativos ao crescimento (ou ausência dele) da zona euro no 2.º trimestre. E com ela a confirmação mais cabal do caminho desastroso que a Europa decidiu tomar para enfrentar a sua crise de dívida pública soberana – a estagnação. Estagnação para todos – menos para Portugal e Grécia: esses estão em recessão. A quebra do produto em Portugal é 0,7%. O consumo privado recua para níveis históricos, bem como o investimento público; as insolvências prosperam; as exportações são o único meio pela qual a violenta recessão se vai suavizando. Entretanto, o Sr. Miguel Relvas comentando estes números, achou-os menos severos do que o previsto, e logo os atribui à acção benéfica do Governo do qual faz parte, esquecendo-se que comentava os números do PIB relativos ao 2.º trimestre relativos ao Governo…do Sr. Sócrates. Um pequeno lapso de sua excelência, tal como certamente será o convite que o Sr. Ministro dirigiu ao Sr. Mário Crespo o que, porventura, representará uma intromissão num assunto que não é da sua competência, para além do que sua excelência pretende privatizar a RTP.

Entretanto, e em outras notícias, e como sua excelência o Sr. Presidente da República, o Sr. Cavaco Silva, se encontra de férias, o modo escolhido para comunicar com os portugueses é o Facebook. Assim, e comentando o encontro entre a Sra. Merkel e o Sr. Sarkozy e as propostas que dele resultaram, o nosso Presidente da República considerou o seguinte acerca da constitucionalização de uma travão à dívida pública:

«Constitucionalizar uma variável endógena como o défice orçamental – isto é, uma variável não directamente controlada pelas autoridades – é teoricamente muito estranho. Reflecte uma enorme desconfiança dos decisores políticos em relação à sua própria capacidade de conduzir políticas orçamentais correctas».

Acerca das considerações de sua excelência, o Presidente da República, nós consideramos o seguinte: não, excelência, não – não é desconfiança dos decisores políticos em relação à sua capacidade de conduzir políticas orçamentais equilibradas e sustentáveis. O que se revela é antes desconfiança em relação à capacidade dos outros o fazer. A Sra. Merkel acredita que é capaz de seguir políticas orçamentais correctas; em consonância com o seu juízo, constitucionalizou um limite ao endividamento público. Porque a Sra. Merkel julga, no entanto, que outros não são capazes de o fazer de outro modo que não pela vinculação constitucional, a Sra. Merkel sugere que se constitucionalize este travão – porque desconfia da capacidade dos outros para se governar.
E depois, excelência, usar dois argumentos opostos e que se excluem mutuamente para defender a sua posição? Não pode, excelência, não pode…Senão vejamos: por um lado, V. Ex.ª, diz: não se pode constitucionalizar um travão à dívida pública por se tratar de uma variável sujeita a imponderabilidades. Por outro lado, V. Ex.ª diz: Então mas V. Exas. cujas políticas se correctas e adequadas facilmente controlam a dívida pública, pretendem constitucionalizar um travão à dívida pública demonstrado que desconfiam das vossas próprias capacidades? Em suma: primeiro, V. Ex.ª diz «Ah, nós não podemos constitucionalizar porque é uma variável endógena que não se pode controlar» e secundum, V. Ex.ª diz «Ah, nós não podemos constitucionalizar porque se as políticas públicas forem adequadas a dívida pública é perfeitamente controlável.» Não faz sentido, pois não, Excelência?
Mas sabe que mais, excelência? Esta proposta que mereceu a sua estranheza, mereceu a célere e plena aprovação do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, o Sr. Paulo Portas. Disse o Sr. Ministro que “Portugal sublinha o empenhamento demonstrado pela França e pela Alemanha na concretização das decisões tomadas na cimeira extraordinária do Eurogrupo, realizada a 21 de Julho, e acompanha com interesse as propostas saídas da cimeira franco-alemã de ontem” e ainda que “Portugal tem tido e mantém uma posição favorável a uma maior integração económica do espaço europeu” e considera que “o reforço da governação económica é coerente com a união monetária”, isto “no sentido de a dotar de maior estabilidade e coesão”, objectivos que classifica de “relevantes para um clima de crescimento e emprego”.
Em síntese, a posição do Sr. Paulo Portas resume-se da seguinte forma: sua excelência dobra submissamente a lombada, faz uma vénia, sorri, e saúda tudo o que lhe põem à frente. Mas deixe que, impertinentemente, lhe coloque uma questão: o que V. Ex.ª de extraordinário nas propostas apresentadas pela Sra. Merkel e pelo Sr. Sarkozy para que o Sr. as receba assim tão entusiasticamente, aos pulinhos? Note o seguinte: a Sra. Merkel e o Sr. Sarkozy reúnem-se, discutem ideias, tornam-nas públicas. Reacção dos mercados? Afundam-se. Veja V. Ex.ª: há aqui um padrão de acontecimentos lógico e coerente. O que o Sr. Ministro deveria fazer era: sim, nós pretendemos maior integração económica, mas a integração económica, implicando transferência de competências dos Estados soberanos para Bruxelas, deve ser acompanhada de uma maior responsabilização das instituições europeias, nomeadamente através da criação de uma agência de dívida pública europeia que concretize a solução eurobonds. É isso que tem feito o Sr. Tremonti que é o Ministro das Finanças da Itália; é isso que vem fazendo agora o Sr. Osborne que é o Ministro das Finanças da Inglaterra.

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