Reunido ontem em Conselho de Ministros, o Governo aprovou ontem a estratégia orçamental para os próximos anos. Hoje, o Ministro das Finanças apresenta em conferência de imprensa as grandes linhas orientadoras desse mesmo plano, aguardando-se que o Governo anuncie as suas propostas de redução da despesa.
As coisas chegaram a tal ponto que têm de ser os senhores favorecidos pela fortuna ou pelo seu trabalho a implorar que os tributem e que contribuam para os sacrifícios já que os Governos não têm coragem de o fazer. Pelo menos, assim o é nos Estados Unidos, na França ou na Alemanha. Em Portugal, o senhor detentor da maior fortuna em Portugal, considerou-se um simples assalariado. Vale-nos que, pelo menos, o Governo tenha a coragem de tributar os rendimentos mais elevados. O problema, porém, é que esses senhores são já pesadamente tributados em sede de IRS. Aquando do primeiro Programa de Estabilidade e Crescimento, o Sr. José Sócrates criou um oitavo escalão no IRS para quem auferisse um rendimento colectável médio do casal acima de 150.000 euros. Portanto, despido de preconceitos revolucionários, há que admitir que em sede de IRS, os mais favorecidos são já pesadamente tributados – actualmente 46,5%. Compreendo e admito, no entanto, que à luz dos sacrifícios que vêm sendo impostos que seja criado um imposto especial e extraordinário, ainda que simbólico uma vez que a sua importância prática em termos de receita é reduzida.
O que eu não compreendo é que o Governo anuncie um aumento no IRS e no IRC (como se prepara para fazer), e aquando da resolução de tributar o subsídio de natal, o Governo tenha deliberadamente excluído os dividendos e os juros dos depósitos. Em sua defesa, o Governo invocou que pretendia incentivar a poupança. Em minha defesa, eu replico ao Governo – e o trabalho não é para se incentivar? Ora, se sua excelência tributa extraordinariamente o trabalho, mas não tributa os juros de depósito porque pretende incentivar a poupança – então sua excelência, ao tributar o trabalho, por igualdade de razão, pretende incentivar o quê? A ociosidade?
A imprensa, adiantando-se ao Sr. Ministro das Finanças, vem já revelando algumas das medidas que o Governo pretende implementar. A imprensa de hoje noticia que o Governo pretende aumentar o IRS e o IRC e ainda reforçar o quadro das saídas no seio da Administração Pública.
Reforço das saídas na Administração Pública, Sr. Ministro? Então e uma agenda para o crescimento? Em que medida espera V. Ex.ª que o reforço das saídas na Administração Pública aumente a competitividade do País? Note V. Ex.ª: o anterior Governo já vinha reduzindo o quadro dos funcionários públicos – e a economia continuava estagnada. Não queremos dizer a V. Ex.ª que não deve reduzir o quadro de funcionários; o que lhe queremos dizer é que isso por si só não serve para resolver as debilidades da economia portuguesa. V. Ex.ª, através da redução do número de funcionários públicos, reduz os encargos com pessoal e, por conseguinte, reduz a despesa pública. Isto tem um efeito positivo sobre a redução do défice público. Mas qual é o impacto sobre o crescimento e a competitividade da economia? V. Ex.ª tem estado atento às notícias que circulam na imprensa mundial? O que mais preocupa hoje a economia mundial, é saber como pretendem as economias crescerem face à ameaça de uma double dip recession. É a inexistência de uma agenda para o crescimento que preocupa os mercados financeiros mundiais. Veja por exemplo as declarações da Sra. Lagarde que pede acção política imediata para que se evite que a economia mundial recaia numa nova recessão mundial (esqueçamos o facto de a Sra. Lagarde ter sido Ministra das Finanças da França durante grande parte do period da crise de dívida pública soberana, nada tendo feito, e que as suas palavras não sejam mais do que hipócritas e incoerentes). O que lhe pretendemos dizer, Excelência, é que o Senhor não tem nenhum plano coerente, lógico e uno que vise pôr a economia a crescer. Exemplo, excelência: a recente decisão de diminuir as indemnizações por despedimento. V. Ex.ª diminui as indemnizações por despedimento, mas aplica-o apenas aos novos contratos: os efeitos apenas serão sentidos daqui a dezenas de anos. Entretanto, as empresas que pretendam despedir os seus trabalhadores mais antigos do seu quadro e que são também os menos produtivos, não o fazem e se tiverem que reduzir o pessoal, despedem os trabalhadores abrangidos pela nova lei, ainda que sejam mais produtivos. De que forma se resolve o problema da competitividade da economia portuguesa? Não se resolve nos próximos anos; apenas se poderá aguardar por efeitos benéficos quando a esmagadora maioria dos contratos forem abrangidos pela nova lei. Até lá, a recompensa para os trabalhadores mais produtivos, permanence inexistente.
Por isso, rogamos a V. Ex.ª do nosso humilde canto: Excelência, não anuncie num mês aumentos de impostos, depois no mês seguinte, reduções da despesa, e no mês seguinte sabe-se lá bem o quê. V. Ex.ª feche-se no seu gabinete, tranque-o à chave, atire-a pela janela e desenhe um plano que permita reduzir o défice público, mas que respeite o crescimento e que promova uma agenda nesse sentido e que apresente esse plano concomitantemente.
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