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sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Acção e Inacção

Um dos mais arreigados hábitos portugueses para desprezar a suposta crise consiste em evocar, saudosamente, o passado – consiste nesse belo hábito de afirmar que Portugal irá superar as adversidades porque, até agora, sempre o foi capaz de fazer. Estas reminiscências do passado encontram sobretudo eco nesse período glorioso de Portugal das Descobertas e, por isso, é sempre eloquente ver um político declamando. É, por isso, com languidez e melancolia que eles olham sempre, de olhos marejados, para a Mensagem sebastinianista de Pessoa. O Quinto Império, para eles, encontra-se, fixo e imóvel, no passado e não compreendem que as palavras são sempre o mote da Revolução – são elas que instigam a acção presente. Porque as palavras servem sempre de lugar à incitação – as palavras de Voltaire, por exemplo, inspiraram a Revolução Francesa. A Revolução necessita de teorizadores, de sistemas, de teorias, ela alimenta-se de ideias, de imprecações, de debates – ela necessita da palavra para lhe dar forma e cor e, só então, só depois da Palavra poderá haver Revolução. Em Portugal, porém, tudo é diferente. Em Portugal, a arte oratória é a declamação de uma fraseologia inútil, profunda na pompa, nula na Ideia. Em Portugal, a Palavra é a enfatuação do status quo.

Dizer aos portugueses que estes irão superar as dificuldades só porque assim sucedeu até agora é do mais ridículo que pode haver. É cuspir no presente e sorrir ao passado – como se efectivamente vivêssemos desse passado; é garantir que Portugal irá para sempre ser grande porque um dia, há quinhentos anos atrás o foi – e essa memória distante cuja luz ainda resplandece nos crânios de muitos políticos hoje é o travão ao rompimento com o estado presente de coisas – ela não incita, ela descansa. O Opinador tem uma opinião contrária – o Opinador respeita essa nobre época, mas não vira os olhos da nação actual; e a nação actual não é mais do que um mísero espectro desse passado glorioso. Aos políticos que, enfaticamente, declamam que Portugal irá superar as dificuldades porque sempre assim tal aconteceu, o que se pretende dizer é – “Descansai! Preguiçai! Façam uma sesta! Não sacudam as varejeiras do vosso corpo!”. E isto porquê? Porque Portugal sempre foi capaz de superar as dificuldades. E se tal sempre aconteceu, com certeza que agora a história não será diferente. Não há necessidade de trabalhar; Portugal pode repousar, serenamente, à sombra da sua História.

Outros usam as palavras, mesmo as mais duras, porque servem de catalisador à acção – e dizem: «Portugal é pobre – é necessário que se trabalhe mais; Portugal é estúpido – é necessário que se estude mais; Portugal é preguiçoso – é necessário que se lute mais.» E, no fim de tudo, Portugal será um Pais mais rico, mais culto e mais trabalhador. Tudo porque alguém lhe teve a coragem de dizer a verdade que incita à acção e não a cobardia de lhe relembrar os heróis mortos do passado como forma de os fazer descansar no presente à custa das coroas de glória do passado.

Estas verdades para muitos políticos são indiferentes porque a sua cabeça vive há quatrocentos anos atrás e abandonam o povo na luta da vida contemporânea – isto não é amor pelo País; isto é desdém pelo País.

1 comentário:

Street Fighting Man disse...

antes de palavras, o País precisa de se inconformar meu caro. é de inconformismo e insatisfaçao que se fazem as revelações ;) palavras ou pistolas são apenas armas
grande abraço