A mais bela, a mais pura e a mais duradoura glória literária de prosa da blogosfera

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quarta-feira, 6 de abril de 2011

O Recurso ao FEEF

Noticia hoje o Financial Times que Portugal está já a negociar com a União Europeia um pacote de ajuda. O Jornal de Negócios reproduz declarações do Ministro das Finanças, afirmando que Portugal tem de pedir ajuda já. Isto não constitui novidade nenhuma. O momento da rejeição do PEC para 2012 na AR foi o momento em que Portugal recorreu ao FEEF. Portugal juntou à já sua debilitada situação económico-financeira, uma crise política que colocou em causa o já frágil compromisso político que assegurava as necessidades de financiamento. Os mercados, sobressaltados, deram um pulo da cadeira, levaram as mãos à cabeça e os juros da dívida dispararam, e dispararam precisamente no par de meses onde Portugal enfrenta maiores desafios de vencimento de dívidas – 10 mil milhões de euros em dois meses.

Nesta altura, o pedido de ajuda tornou-se inevitável; e tornando-se inevitável, o pior que Portugal pode fazer é adiá-lo, continuando a fomentar a instabilidade dos mercados que, a cada dia que passa, castigam os juros da dívida pública portuguesa. Não há reforma europeia no horizonte ou uma brilhante execução orçamental que nos valha. A situação é bem diferente da situação de há uns meses atrás: por essa altura ainda se discutiam os contornos da resposta europeia à crise, falava-se de eurobonds, as taxas de juro a que Portugal se financiava eram elevadas, mas suportáveis no curto prazo, com o fim de recorrer ao pedido de ajuda externa. Nada disso existe agora.

O Sr. Fernando Ulrich tem uma opinião ligeiramente diferente. Este senhor que durante meses defendeu que Portugal devia, a todo o custo, evitar o pedido de ajuda externo, vem agora afinal dizer que Portugal já devia ter pedido ajuda há muito. Não estranhamos – como o fez o Sr. Ricardo Salgado – que os banqueiros digam que Portugal tem de pedir ajuda agora. Estranhamos sim que o Sr. Fernando Ulrich diga uma coisa há uns meses atrás, dizendo outra agora, retroagindo essa afirmação a esse tempo. O que justifica esta posição? Esmiucemos… Os bancos, claro, receando os stress tests que se aproximam não querem afectar os seus resultados que podem ficar seriamente comprometidos se expostos em demasia à dívida pública de um País como Portugal; por outro lado, a notação da dívida da República Portuguesa vem rolando por aqui abaixo, aproximando-se agora da classificação de «Junk». E isto não é um dado da menor importância. A partir desta classificação, a banca não poderá apresentar os títulos da dívida pública portuguesa como colateral no BCE, sem que primeiro Portugal recorra ao FEEF. A partir desta altura, do ponto de vista dos bancos, obter liquidez junto do BCE a 1% e depois financiar o Estado português a 6 ou 7% já é definitivamente mais arriscado. Compreendemos, portanto, a perspectiva da banca que não pode, eternamente, sustentar a gula do Estado português; agora, não podemos concordar com o tom quase angelical e patriótico dos banqueiros que durante um ano andaram a reboque do Estado português, financiando-se a 1%, e emprestando a 6%, vindo agora quase dizer que o financiamento do Estado Português vinha sendo feito por razões patrióticas. A banca não financia mais o Estado português porque isso tornou-se-lhe arriscado, não por patriotismo. E não podemos concordar sobretudo com estas declarações do Sr. Fernando Ulrich que durante um ano financiou de uma forma muito lucrativa para a sua instituição o Estado português, afirmando, então, que Portugal devia resistir até ao último português a um pedido de resgate, e agora, convenientemente, olhando para a conjuntura, vem descaradamente dizer que Portugal já devia ter pedido ajuda há muito.


Entretanto, por cá, enquanto se negoceia um pacote de ajuda externa com todas as consequências gravosas daí decorrentes para o povo português, quer o estimado leitor como se vai entretendo parte dos políticos portugueses? Quer o leitor saber que exemplo pretendem dar nesta altura aos portugueses os políticos? Ora bem, o Sr. Bagão Félix, recém-chegado ao Conselho de Estado, seguiu o velho ditado romano: veni, vidi, vici. O Sr. Bagão Félix acusou o Sr. Primeiro-Ministro de mentir na entrevista que concedeu recentemente à RTP, quando afirmou que um pedido de empréstimo de curto prazo não fora abordado na reunião do Conselho de Estado; o Sr. Almeida Santos veio desmentir o Sr. Bagão Félix; o Sr. António Capucho veio por sua vez dizer que o Sr. Bagão Félix falou a verdade; e o Sr. Carlos César veio depois dizer que não – que o Sr. Primeiro-Ministro e o Sr. Almeida Santos é que falaram a verdade. À luz destes episódios, quer o leitor adivinhar o triste debate intelectual que vai anteceder as eleições de Junho?

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