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sábado, 29 de outubro de 2011

Da Cimeira Europeia de 26 de Outubro

A aclamada Cimeira Europia desta semana terminou tal como havia começado – com muito ruído de fundo, mas sem efeitos práticos. A cada Cimeira salientam-se os avanços históricos que são firmados pelos Estados-Membros no caminho da progressiva integração. Avanços históricos certamente, mas avanços históricos curtos tendo em conta a exigência do momento da história com que a Europa se depara e ao qual os líderes europeus não têm sabido ou simplesmente não sabem erguer-se.
No dia seguinte ao acordo celebrado na Cimeira Europeia de 26 de Outubro aconteceu exactamente o mesmo que vem acontecendo no dia seguinte de cada Cimeira: as bolsas sobem, as taxas de juro das obrigações soberanas descem. E é tudo o que consegue a acção estreita dos líderes europeus – obter efeitos positivos que se cingem ao dia seguinte da Cimeira. A prova de que a Europa está ainda longe de resolver a crise está no que aconteceu esta sexta-feira: a Itália recorreu aos mercados para se financiar e financiou-se a uma taxa de juro nunca antes vista e, pela primeira vez, entrou na barreira dos 6%. E se a Itália prosseguir neste caminho, e se eventualmente recorre à ajuda externa, a crise europeia será de contornos bem mais graves.


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Com esta Cimeira decidiu-se apenas o imprescindível para que a Europa sobreviva mais umas semanas: decidiu-se a reestruturação da divida grega com um perdão voluntário de 50% dos bancos membros do Instituto das Finanças Internacionais. Um acordo não vinculativo, diga-se, pois o Instituto terá ainda de negociar a participação dos seus bancos membros que não estão obrigados pelo acordo. E ainda assim, a divida pública grega será de 120% do PIB. 120% do PIB de divida pública é a percentagem da Itália – e, caro leitor, deixe-me que lhe diga, a Itália também não anda lá muito bem com esses 120% e não tem a dimensão dos problemas da Grécia. Se a tudo isto adicionarmos os fracassos dos sucessivos pacotes de austeridade que vão sendo teimosamente despejados sobre a Grécia sem coerência, sem lógica, sem razoabilidade, logo nos apercebemos o quanto esta Cimeira resolveu os problemas da Europa.


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Em consequência da reestruturação da divida grega e do haircut voluntário, os bancos europeus terão de ser recapitalizados. 100 mil milhões de euros avança a Europa para a recapitalização dos bancos. Mas note-se a ironia desta situação: há vários países na Europa que com dificuldade crescente se financiam nos mercados. E esses mesmos Estados vão agora recapitalizar os bancos que não lhes concedem financiamento precisamente porque têm sérias dúvidas acerca do seu pagamento certo.


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E por fim, decidiu ainda a Ilustre Cimeira o reforço do FEEF para um bilião de euros. Parece muito dinheiro? Não é. A Itália está sob pressão crescente dos mercados e em risco de recorrer a ajuda externa. Um bilião de euros não chegará para cobrir o resgate da Itália que é a terceira maior economia da zona euro. Portanto, apesar de recentemente aprovado, o aumento do FEEF poderá em breve estar desactualizado.

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Ou seja, em breve poderemos esperar nova Cimeira Europeia, anunciando mais uma vez a salvação da Europa. O problema é que a cada Cimeira, a margem de manobra dos líderes europeus estreita-se e com ela as hipóteses de sobrevivência da Zona Euro. E das duas uma: ou consegue-se a sobrevivência da Zona Euro, mas a um preço cada vez mais elevado ou chegará o dia que, mesmo querendo, os líderes europeus não serão mais capazes de resgatar a Europa da voracidade dos mercados.

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