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terça-feira, 25 de outubro de 2011

Requiem Líbio




Estes tempos que vivemos são bastante tristes para os entusiastas do campismo e caravanismo, já que um dos seus maiores aficionados, foi assassinado. Falamos, como é óbvio do sócio do parque de campismo do Forte de São Julião da Barra, o Coronel Khadafi, a mais recente vítima da primavera árabe.

Antes de mais convem referir que o termo primevera árabe é basfante infeliz: primeiro porque também abrange países que não são árabes, antes berberes, como a Tunísia; mas também porque transmite a ideia de um movimento homogêneo que está a varrer aquela parte do globo - o que não está correcto.

Os factores que têm desencadeado as contestações são maioritariamente endógenos. Se a carestia de vida pode ser um ponto comum (mas próprio visto que as economias não estão inseridas num mercado comum como o europeu) o desenvolvimento dos movimentos depende muito do Chefe de Estado: na Tunísia, Ben Ali, vendo a sua situação política muito comprometida, preferiu optar por um exílio dourado; no Egipto, Mubarak, muito por causa da sua idade, não conseguiu ter mão no exército, o que ditou a fortuna dos manifestantes; em Marrocos, um Rei astuto chutou para canto, acalmando as contestações com promessas de revisão constitucional. Já na Líbia, como todos sabemos, o Coronel optou pelo confronto.

Tê-lo-á feito talvez porque era o ditador menos frágil do Magrebe; convém lembrar que a Guerra só foi ganha por Benghazi com o auxílio da NATO que, talvez precipitadamente, tomou o lado rebelde. Mas, esse lado não constitui, por si, um sinónimo de democracia - dois indícios recentes assim o apontam: por um lado, o antigo ditador deveria ter sido capturado vivo e entregue às instâncias internacionais (o Tribunal Penal Internacional tinha um mandado de captura emitido). Mesmo admitindo que existem dificuldades em controlar multidões armadas e que, por tal, a morte de Khadafi foi inevitável, a confusão que se segiu lança muitas dúvidas sobre o Governo de Benghazi: entre recusas de autópsia e contra-informações, houve de tudo.

Porém, o que mais revela para estas nossas dúvidas foi o recente anúncio da base jurídica para a próxima Constituição: a sharia.Ora uma democracia, o regime que maior estabilidade poderia dar à região, dificilmente se consegue alicercar num ordenamento jurídico não laico. E uma Líbia estável é de todo o interesse para a Europa, visto que a maioria do petróleo e gás natural aqui usados, provém do Magrebe.

A pressa em remover Khadafi pode vir a revelar-se muito nociva para os interesses Ocidentais. Tudo isto sem contar com a tarefa hercúlea que espera o novo Governo: desarmar uma população pouco instruida, que não viveu em democracia e que está organizada tribalmente - e daí a nossa relutância em ver a morte de Khadafi como o fim da Guerra Civil Líbia.

De qualquer das maneiras, esperamos que naquelas paragens uma nova (e melhor) era se inicie.

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