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sábado, 30 de julho de 2011

As Hesitações europeias e americanas

Os mercados estão novamente em pânico, as agências de rating sereníssimas, mas os mercados em pânico. Nos Estados Unidos, as bolsas sofrem avultadas perdas há várias sessões consecutivas; as taxas de juro com que os EUA se financiam no mercado sobem progressivamente, tal como o risco do país entrar em bancarrota, ainda que seja um risco marginal. Por outro lado, nada disto é suficiente para que as agências de rating desçam o rating dos EUA, mesmo que o país esteja a um par de dias de entrar em incumprimento. E enquanto a instabilidade política é um elemento relevante para as agências de rating descerem os ratings dos países periféricos, que dizer dos Estados Unidos? Que o diga desde logo a Espanha, que se vê novamente ameaçada por uma descida no seu rating. Mas chega de bater nas agências de rating, até porque a descida do rating dos EUA teria consequências muito negativas para a economia mundial.

Coisa curiosa no meio de tudo isto é vir agora a Europa de mãos nas ancas, indignada, vociferar contra os EUA e a irresponsabilidade política de Washington. Não é, de facto, uma atitude nada hipócrita de um bloco regional que anda há mais de um ano às avessas, emperrando a recuperação económica mundial e cuja solução para a sua própria crise não é capaz de encontrar. Por isso, a Europa sente-se investida na sua auctoritas para reclamar dos outros. Então: dum lado temos os EUA praguejando contra a Europa porque os riscos de contágio da crise grega continuam a alastrar e a arrastar a Europa para uma dolorosa estagnação; do outro, temos a Europa igualmente praguejando contra os EUA porque estes não são capazes de se entenderem politicamente, espalhando o pânico nos mercados. Daqui resulta o seguinte: então Europa? Então EUA? Não éramos antes todos amigos?

Façamos uma retrospectiva: 2008, colapso do Bear Stearns e do Lehman Brothers e desabar do sistema financeiro mundial. Os líderes das nações mais ricas do mundo, temendo uma crise com as dimensões da Grande Depressão dos anos 30, reunidos em Londres, agindo concertadamente, detiveram os efeitos da crise. Aos primeiros sinais de recuperação, a acção conjunta ruiu e cada um seguiu o seu caminho. Os países periféricos europeus, afectados por elevados défices e endividamentos públicos, pressionados pelo centro europeu que lhes acorria financeiramente, aprovaram duros programas de reajustamento financeiro. Os EUA, optaram pelo caminho oposto, e continuaram com uma política de estímulos à economia. O problema é que a política de estímulos do Presidente Obama concentrou-se na extensão dos benefícios fiscais da era Bush aos mais ricos; os efeitos não foram sentidos na economia real e o desemprego nos EUA mantém-se, por isso, elevado. É por esta razão que a política mais keynesiana dos EUA não colheu frutos. A Europa seguiu na via da austeridade, esmagando o crescimento, adicionado a uma recessão uma nova recessão. Ora, sendo o problema europeu assente na sustentabilidade da dívida, ele não poderá ser resolvido à custa do crescimento. Certamente que também não poderá ser feito sem um forte disciplina orçamental, mas numa economia em recessão criar emprego é uma missão do Governo (ou dos privados: falamos aqui do Governo porque a sua acção é sempre indispensável para que os privados reúnam as condições indispensáveis, nomeadamente ao nível da fiscalidade, da desobstrução da justiça, do pagamento mais rápido aos credores do Estado). Os países emergentes por sua vez, sentiram timidamente a crise mundial. Os seus elevados níveis de crescimento caíram ligeiramente, mas já recuperaram os números pujantes anteriores à crise mundial.

O que pretendemos dizer com isto é que a Europa e os EUA precisam um do outro para enfrentarem os desafios que lhes são colocados pelas economias emergentes e ambos lucrariam muito em procurarem juntos e concertadamente políticas para os seus problemas. Uma acção concertada e concomitante dos dois lados do Atlântico restauraria a confiança dos mercados, a solidez na economia e, por conseguinte, a hegemonia que parece cada vez mais ameaçada.

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