Mark Felt morreu em 2008. Graças a Felt, o Washington Post foi capaz de denunciar a teia que se erguia da Casa Branca, então comandada por Richard Nixon e que originou a sua queda da cadeira do poder. Nos nossos dias, poucos ousarão dizer que Felt não foi um grande patriota americano.
Em Portugal, por estes dias, discute-se um eventual plano do Governo para obter o domínio da comunicação social. O jornal “Sol” é, neste momento, o nosso Washington Post. Argumentam alguns contra a divulgação das escutas usando expressões como jornalismo de “buraco de fechadura”. É, de facto, uma questão complexa. Por um lado, a admissão de escutas ilegalmente efectuadas (como as considerou o Presidente do STJ) pode levar a uma intromissão na vida dos cidadãos e originar todo o tipo de abusos. A salutar liberdade é indispensável e é importante que Portugal não admita como regra geral este tipo de recursos como forma de sustentar os seus juízos, sob pena de se tornar numa sociedade como a que George Orwell nos descreve no seu “1984”. Por outro lado, o interesse público aparece a reclamar o seu espaço de supremacia em relação à contrição de algumas liberdades pessoais, em respeito com o princípio da proporcionalidade.
O debate não é fácil pois se optarmos pela validade de escutas obtidos sem a devida base legal a justiça entra num abismo e num descontrolo sem freios. Todavia, a prevalência da forma sobre a substância pode levar a situações de flagrante impunidade.
Rui Ramos escreve hoje no Expresso que Nixon devia ter nascido em Portugal. Seria feliz pois poupava-se às preocupações resultantes do Watergate. Para ele, os americanos são um povo mais cioso da liberdade. É um facto e aponta Afonso Costa e Salazar como provas de que os portugueses preferem homens providenciais e messiânicos, devidamente capacitados para resolver os seus problemas, mesmo que tal implique a perda de liberdade. Indesmentível, dizemos nós. Com efeito, os portugueses recorrem sempre ao seu tradicional Fado, lamuriam-se e, depois, apelando ao Divino e à Providência para que lhes envie o Messias, eis que ele chegado, se constata que é um Ditador e anunciando que para a resolução dos seus problemas é necessária a coerção de parte da sua liberdade, agradecem aos Céus e entregam, numa bandeja a sua liberdade e os seus problemas, desde que no retorno se lhe devolvam os problemas resolvidos. A liberdade não será tão indispensável.
No plano jurídico, o problema das escutas envolvendo José Sócrates encontra-se insusceptível de maiores desenvolvimentos (Noronha de Nascimento não vislumbrou nelas matéria de relevância criminal), mas no plano politico o mesmo já não é de afirmar. Se o Direito é o Direito e não pode ser permeado por considerações éticas para fundar o respectivo juízo, na Política, a Ética, apesar de em vias de extinção, ainda é de alguma utilidade e deve servir de base aos juízos que se façam sobre os indivíduos exercendo funções públicas.
O Governo e, em particular, o Primeiro-ministro não se podem refugiar na simples negação dos factos que concernem com a sua alegada interferência em órgãos de comunicação social, com a PT e Ongoing a servirem de aríete. Quando a argumentação de uma das partes se baseia em factos de tamanha gravidade e concretos, a via para o cabal esclarecimento dos factos não se faz pela negação. Trata-se de demonstrar que, concretamente e efectivamente, o Governo e o seu Primeiro-ministro em nada se relacionam com essas actividades. É necessário que se demonstre. É necessário que se explique. É necessário que se diga em que sentido devem ser interpretadas as escutas publicadas pelo “Sol” senão visaram uma reconfiguração da comunicação social segundo os desejos do Governo. Não se deve limitar a dizer que se tratam de conversas privadas. Tratam-se de conversas de homens nomeadas para uma empresa privada de fundos públicos e de conversas de homens que foram nomeados pelo Estado, fruto da sua golden share, para a administração da empresa e que reúnem aptidões duvidosas para o desempenho das suas funções. Tratam-se de conversas de homens que tinham em mente um plano que visava a reordenação da comunicação social e a sua limitação e controlo, sendo que a Liberdade de Imprensa é um dos pilares do Estado de Direito.
Assim, resta ao Governo dois caminhos:
1. Esclarece o País no sentido da não interferência através de grupos económicos na reconfiguração da comunicação social por factos concretos, ou
2. Não esclarece o País ou o esclarece insuficientemente pela via da negação de factos.
No primeiro caso o Governo mantém a legitimidade intacta para governar.
No último caso apenas vislumbramos uma solução: José Sócrates deve demitir-se.
Tal não implica a convocação de novas eleições. Os tempos são difíceis e reclamam a resolução dos problemas concretos do País e é importante que não se desviem também a atenção destes sob pena do futuro da nação ser, irremediavelmente, claudicado. O PS mantém a legitimidade eleitoral conquistada nas eleições legislativas de 27 de Setembro do ano passado. Segundo o art. 187/1 CRP, o Primeiro-Ministro é nomeado pelo Presidente da República, ouvidos os partidos representados na Assembleia da República e tendo em conta os resultados eleitorais. Estes deram a vitória ao PS e não a José Sócrates. Portanto, caberá ao PS indicar um novo nome para Primeiro-Ministro.
Em Portugal, por estes dias, discute-se um eventual plano do Governo para obter o domínio da comunicação social. O jornal “Sol” é, neste momento, o nosso Washington Post. Argumentam alguns contra a divulgação das escutas usando expressões como jornalismo de “buraco de fechadura”. É, de facto, uma questão complexa. Por um lado, a admissão de escutas ilegalmente efectuadas (como as considerou o Presidente do STJ) pode levar a uma intromissão na vida dos cidadãos e originar todo o tipo de abusos. A salutar liberdade é indispensável e é importante que Portugal não admita como regra geral este tipo de recursos como forma de sustentar os seus juízos, sob pena de se tornar numa sociedade como a que George Orwell nos descreve no seu “1984”. Por outro lado, o interesse público aparece a reclamar o seu espaço de supremacia em relação à contrição de algumas liberdades pessoais, em respeito com o princípio da proporcionalidade.
O debate não é fácil pois se optarmos pela validade de escutas obtidos sem a devida base legal a justiça entra num abismo e num descontrolo sem freios. Todavia, a prevalência da forma sobre a substância pode levar a situações de flagrante impunidade.
Rui Ramos escreve hoje no Expresso que Nixon devia ter nascido em Portugal. Seria feliz pois poupava-se às preocupações resultantes do Watergate. Para ele, os americanos são um povo mais cioso da liberdade. É um facto e aponta Afonso Costa e Salazar como provas de que os portugueses preferem homens providenciais e messiânicos, devidamente capacitados para resolver os seus problemas, mesmo que tal implique a perda de liberdade. Indesmentível, dizemos nós. Com efeito, os portugueses recorrem sempre ao seu tradicional Fado, lamuriam-se e, depois, apelando ao Divino e à Providência para que lhes envie o Messias, eis que ele chegado, se constata que é um Ditador e anunciando que para a resolução dos seus problemas é necessária a coerção de parte da sua liberdade, agradecem aos Céus e entregam, numa bandeja a sua liberdade e os seus problemas, desde que no retorno se lhe devolvam os problemas resolvidos. A liberdade não será tão indispensável.
No plano jurídico, o problema das escutas envolvendo José Sócrates encontra-se insusceptível de maiores desenvolvimentos (Noronha de Nascimento não vislumbrou nelas matéria de relevância criminal), mas no plano politico o mesmo já não é de afirmar. Se o Direito é o Direito e não pode ser permeado por considerações éticas para fundar o respectivo juízo, na Política, a Ética, apesar de em vias de extinção, ainda é de alguma utilidade e deve servir de base aos juízos que se façam sobre os indivíduos exercendo funções públicas.
O Governo e, em particular, o Primeiro-ministro não se podem refugiar na simples negação dos factos que concernem com a sua alegada interferência em órgãos de comunicação social, com a PT e Ongoing a servirem de aríete. Quando a argumentação de uma das partes se baseia em factos de tamanha gravidade e concretos, a via para o cabal esclarecimento dos factos não se faz pela negação. Trata-se de demonstrar que, concretamente e efectivamente, o Governo e o seu Primeiro-ministro em nada se relacionam com essas actividades. É necessário que se demonstre. É necessário que se explique. É necessário que se diga em que sentido devem ser interpretadas as escutas publicadas pelo “Sol” senão visaram uma reconfiguração da comunicação social segundo os desejos do Governo. Não se deve limitar a dizer que se tratam de conversas privadas. Tratam-se de conversas de homens nomeadas para uma empresa privada de fundos públicos e de conversas de homens que foram nomeados pelo Estado, fruto da sua golden share, para a administração da empresa e que reúnem aptidões duvidosas para o desempenho das suas funções. Tratam-se de conversas de homens que tinham em mente um plano que visava a reordenação da comunicação social e a sua limitação e controlo, sendo que a Liberdade de Imprensa é um dos pilares do Estado de Direito.
Assim, resta ao Governo dois caminhos:
1. Esclarece o País no sentido da não interferência através de grupos económicos na reconfiguração da comunicação social por factos concretos, ou
2. Não esclarece o País ou o esclarece insuficientemente pela via da negação de factos.
No primeiro caso o Governo mantém a legitimidade intacta para governar.
No último caso apenas vislumbramos uma solução: José Sócrates deve demitir-se.
Tal não implica a convocação de novas eleições. Os tempos são difíceis e reclamam a resolução dos problemas concretos do País e é importante que não se desviem também a atenção destes sob pena do futuro da nação ser, irremediavelmente, claudicado. O PS mantém a legitimidade eleitoral conquistada nas eleições legislativas de 27 de Setembro do ano passado. Segundo o art. 187/1 CRP, o Primeiro-Ministro é nomeado pelo Presidente da República, ouvidos os partidos representados na Assembleia da República e tendo em conta os resultados eleitorais. Estes deram a vitória ao PS e não a José Sócrates. Portanto, caberá ao PS indicar um novo nome para Primeiro-Ministro.
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