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terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Uma nação vive porque pensa

Economia é cultura. Assim titulava o Expresso, no seu suplemento de Economia desta semana. As bocas abrem de espanto, de pasmo, de surpresa! Rejubilem! Todos, menos os economistas, para quem a cultura é um empecilho da pior espécie. Alguma direita, em particular aquela enamorada dos números e que olha para o mundo das letras como um católico olha para o Diabo na Cruz, deve, com certeza, estar atónita.
O estudo realizado pela Augusto Mateus & Associados por instrução do Ministério da Cultura apresenta os factos:
1. em Portugal, o sector cultural e criativo cresceu mais do dobro do que a própria economia;
2. um crescimento anual de 2,9% torna esse mesmo sector como um dos mais dinâmicos da economia nacional face a uma taxa média de crescimento da economia situada nos 1,3%;
3. o património, as artes visuais e performativas, a música, a criação literária, o cinema, a rádio, a televisão, o software educativo e de lazer, a publicidade, a arquitectura e o design são responsáveis pela criação de 2,8% da riqueza do País.
Este estudo constitui um importante e renovado fôlego para o Ministério da Cultura que se ameaçava tornar, cada vez mais, numa Secretaria de Estado e não num verdadeiro Ministério. Para aqueles que o questionam, aí têm os factos concretos. Números como tanto gostam. Redondos. O OE 2010 contempla já um reforço do orçamento do MC o que em ano de apertos económicos, constitui um sinal encorajador para o futuro.
A direita puramente económica, aquela que em vez de uma íris tem um cifrão no globo ocular, dirá que a cultura é uma actividade para ociosos, para indivíduos inertes, que tal se trata de desperdício de recursos, um crime à eficiência e concluem, enfim, que ela é dispensável à esfera do Estado. Pois bem, Direita! Vocês mesmos que reivindicam a mão protectora do Estado para as empresas verdadeiramente produtivas foram agora esbofeteados nos vossos rostos numéricos.
Cogito ergo sum. Foi Descartes quem o disse, Direita. O que vossa excelência pretende é que o Estado não incentive o pensamento dos cidadãos pois a Cultura não é mais do que a emanação do pensamento dos indivíduos que compõem o Estado. Para eles as Escolas e as Universidades são suficientes. O resto da instrução não existe fora do âmbito dos Doutores e dos Mestres – fora destas instituições não há mais lugar ao saber. E esquecem-se que o Homem pode procurar, livremente, o refúgio nas Artes e nas Ciências, plasmadas em Museus, Teatros, Livros, na Pintura, na Arquitectura, na Escultura, e por aí em diante. Para essa Direita, o único saber que existe é aquele que nos é ministrado e não aquele que é, desinteressadamente, procurado. O resultado é simples, como diz Spencer: a aceitação dos factos sem questionamento. Para eles, o investimento na cultura é estéril e inútil, pois como se há-de justificar o investimento num teatro e não num museu? Os parâmetros de avaliação são subjectivos e não objectivos. E assim, eles, objectivos, argumentam pela ineficácia destes investimentos. E porque não investir mais em auto-estradas? O cidadão necessita de asfalto. Que se unte o cidadão de alcatrão!
Caro leitor, a riqueza de um País não se mede apenas nas suas manifestações físicas, concretas, palpáveis, tangíveis. A Grécia Antiga é lembrada por Sócrates, Aristóteles e Platão. Vejam o que os números fizeram da Grécia actual. Roma, para além do seu Império, tinha Tito Lívio, Cícero, Séneca. As emanações físicas de riqueza não são suficientes para uma nação ser posteriormente recordada. A Cultura incentiva o pensamento e uma nação vive também porque pensa. Caso contrário, ela é composta por um bando de animais visto que é isso que nos separa deles – a racionalidade.
E para aqueles ainda pouco convencidos e incertos, relembramos o dito Estudo. A Cultura manifesta-se directamente sobre o individuo, sobre ele exerce uma influência imediata e fecunda, e uma nação dotada de um conjunto de Homens que saber exercer na plenitude as suas faculdades – pensar – é uma nação superiormente preparada para enfrentar os desafios que se lhe deparam.

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