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quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Revolução no Egipto (II)

Acontecimentos extraordinários se desenrolam neste inicio de século. Inesperadamente, o mundo árabe é sacudido por um espontâneo movimento popular sedento de liberdade, cansado do jugo opressor dos seus ditadores. Da particularidade de todos estes acontecimentos, um em especial espanta-me: não são os grandes mestres intelectuais forjando a teoria, carpindo o sistema, polindo as argumentações. É um trabalho decerto grandioso esse por onde se erguem as bases intelectuais das revoluções – grandioso, mas frio o trabalho de dispor a argumentação na mais perfeita lógica: não é feito por entre a multidão que se agita revolucionariamente nas praças, por entre os seus gritos, por entre as suas ânsias, por entre os seus ideais, as suas aspirações: é feito solitariamente no office, rodeado de livros, no silêncio. Não é um sentimento que nasce instantaneamente, não é coração que imediatamente o pressagia: é o cérebro labutando duramente, continuamente, inflexivelmente. Mas tão grande ou maior ainda que este trabalho dos intelectuais é o trabalho do povo: aqueles pensam as revoluções; estes executam-nas. E poderá conceber-se empreendimento mais nobre, mais puro do que este? Não é o crânio que espremidamente raciocina, calcula, abstrai para encontrar a perfeição dos argumentos: - é antes o coração que a sente, que aspira: e o sentimento que lhe surge automaticamente, sem essas complexas lides do raciocínio é a aspiração da liberdade.



Não há aqui Washington ou Jefferson como na Guerra da Independência dos Estados Unidos. Não há Voltaire, Diderot ou Montesquieu, nutrindo e aquecendo o movimento intelectual da Revolução Francesa; não há Kelsen, Jellinek ou Preuss, arquitectando Weimar. Terão os Egípcios lido o «L’esprit des lois»? Terão os Egípcios lido o ensaio «On the Essence and Value of Democracy»? Decerto, não. E, no entanto, ei-los, aspirando à democracia, à liberdade. Os egípcios apontam apenas para os simples tunisinos que lhes demonstraram o poder do povo, unido em torno dum ideal. E que papel tem o Ocidente nisto? Até agora um papel discreto, tímido, envergonhado. A Política não se compadece com o calor das Revoluções; mas os egípcios apenas sentem a presença dos Estados Unidos pelo gás lacrimogéneo que lhes é arremessado pelas forças de segurança com a inscrição «Made in USA». Isto, porém, parece estar a mudar. Gostaria de acreditar que tal se deveria ao apoio a um espontâneo ao Povo que reivindica os seus direitos, e não pela inevitabilidade das circunstâncias nas quais parece que esta Revolução irá terminar e que obrigam a um posicionamento táctico. O Presidente Obama fala já abertamente na necessidade de uma transição pacífica – uma menção clara à saída do Sr. Mubarak de forma a que se inicie, desde já, a construção do futuro do Egipto. O Sr. John Kerry, Presidente da Comissão das Relações Externas do Senado dos EUA, num artigo no New York Times, exulta à saída do Sr. Mubarak. Mas e a Europa? Temos ouvido falar da posição da Europa? Da Sra. Catherine Ashton? Não é ela a Alta Representante da União para os Negócios Estrangeiros? A União não tem opinião sobre os acontecimentos do Egipto? Não tem ela opinião?

As Revoluções comportam, porém, os seus riscos: e esta não está isenta de perigos para o Ocidente. O Povo manifesta a sua vontade: mas, embora em pouco número – há movimentos radicais extremistas no Mundo árabe. E movimentos desejosos de capturar o poder. As regiões vizinhas, como a Líbia, por exemplo, procurando evitar que semelhantes revoluções ecludam no seu território, sentir-se-ão tentadas a fomentar a desestabilização da revolução. Por isso, o Ocidente tem um papel neste novo mundo árabe que emerge: protegê-lo.

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