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quarta-feira, 28 de julho de 2010

A Reformulação Financeira nos EUA

No dia 16 de Julho, o Congresso norte-americano aprovou “a mais ambiciosa renovação de regulação financeira em gerações”, segundo o Washington Post. Esta extraordinária vitória de Barack Obama continua ofuscada, no entanto, pela crise que se vive no Golfo do México, provocada pelo derrame de petróleo da BP, e pelo arranque lento da economia norte-americana no que à política de emprego diz respeito. Os americanos continuam preocupados, sobretudo, pelos problemas da economia real – o emprego. E a verdade é que apesar da recuperação económica dos Estados e o crescimento do seu PIB, os efeitos não se fazem ainda sentir na criação de mais emprego, não obstante a administração optar por uma política de estímulos à economia para potenciar o seu crescimento. Os americanos julgam, portanto, que as prioridades da Administração estão invertidas – as ambiciosas reformas do sistema de saúde e do sistema financeiro são secundarizadas pelos problemas reais que os americanos enfrentam no dia-a-dia e os republicanos tentam capitalizar o descontentamento popular para as eleições de Novembro.

A reforma do sistema financeiro estabelece um Departamento na Reserva Federal de forma a proteger os mutuários nos abusos em torno de hipotecas, créditos ou outro tipo de empréstimos. A legislação confere ainda novos poderes à Administração no que toca à nacionalização de companhias financeiras e cria um conselho de reguladores para velar por ameaças ao sistema financeiro. Outro aspecto crucial da legislação passa pelas novas regras aplicadas a derivados financeiros de alto risco que foram responsáveis pelo descontrolo dos investimentos dos bancos. Estes derivados serão objecto de um maior controlo por parte do Governo. Um atestado claro de incompetência às malfadadas agências de rating, que avaliaram displicentemente este tipo de produtos? Pelos vistos, não são apenas os Governos Europeus que criticam a actuação das agências.
Segundo Obama, o objectivo da legislação é “protect consumers and lay the foundation for a stronger and safer financial system, one that is innovative, creative, competitive, and far less prone to panic and collapse." A ideia de que o indivíduo procurando a sua situação óptima conduz a uma situação social óptima continua a ser a melhor ideia – a liberdade de iniciativa privada continua a ser a base do sistema capitalista. Mas o sistema capitalista não pode ser o mesmo do período pré-crise. O período pós-crise tem que marcar um novo capitalismo – um capitalismo regulado pelo olhar atento do Estado, conferindo uma ampla esfera de autonomia e iniciativa aos privados, mas sob um olhar atento das entidades estaduais, com uma regulação discreta, mas eficaz de forma a evitar um descontrolo dos mercados. A sustentabilidade e o longo prazo têm de fazer parte dos objectivos das empresas – tem de haver um maior controlo da actuação dos gestores de forma a evitar decisões benéficas no curto prazo para o bónus do gestor, mas letais para a empresa no longo prazo e para toda a estabilidade do sistema financeiro. Importa promover um maior envolvimento e controlo por parte de todos os stakeholders na gestão da empresa, promovendo critérios de transparência e confiança.

Do lado dos republicanos, os argumentos são os habituais – a ameaça à competitividade da economia americana pela intromissão abusiva do Estado na acção privada. Os Republicanos são um partido antiquado – não é à toa que lhes chamam GOP, o Grand Old Party. A crise financeira e económica mundial, mas iniciada nos EUA e que, rapidamente, se alastrou pelo mundo não teve culpados e, por isso, não extraem qualquer tipo de lição dela: o melhor é manter as coisas tal qual como estão: instabilidade, desconfiança, incerteza, volatilidade, insegurança. São termos essenciais para o sucesso e para o prosperar dos negócios nos manuais dos conservadores americanos. Os Republicanos parecem mais apostados na ilusão de que se vivem tempos venturosos, de uma economia alimentada pelo crédito fácil, de instrumentos financeiros de alto risco sujeitos a avaliações parciais pelas agências de rating sem qualquer tipo de intervenção reguladora do Estado.

E na Europa? Apesar dos fundamentos da crise estarem ligados ao sistema financeiro norte-americano, a Europa não deve esquecer a reformulação do seu espaço financeiro nos mesmos moldes – maior regulação. A turbulência dos tempos que vêm varrendo a Europa nos últimos tempos não deve constituir um obstáculo para a revisão do sistema financeiro – se ela é premente, então ela deve ser iniciada; não de forma apressada, no entanto. A Europa deve também ela preparar uma reforma ponderada de forma a dotar o seu sistema financeiro de maior estabilidade, ressalvando, contudo, a iniciativa privada.
Um dos problemas poderá passar pela liderança política da direita na Europa – é assim na Comissão Europeia com Durão Barroso; é assim no Parlamento Europeu com o predomínio do PPE; é assim na Alemanha com Angela Merkel e a CDU; é assim na França com Nicolas Sarkozy e o UMP; e é agora assim no Reino Unido com David Cameron e o Partido Conservador. Não estará a direita mais refém dos interesses financeiros? Senão, pois então que o prove.

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