Estimado leitor,
V. Ex.ª recorda-se destas palavras? – “O amigo leitor confia no Estado para velar pelos seus negócios? Confia numa entidade tão permeável às pressões, cheia de arrivistas e ineficaz? Acha que o Estado compreende melhor qual a estratégia óptima para uma empresa? Não será isso mais facilmente compreendido pelos donos dessa empresa – os accionistas?” Ora, estimado leitor, estas palavras foram proferidas pelo nosso estimado Lord, agora de vacances, num destino exótico incerto e, por certo, algo alheado da realidade recente do nosso País.
O Dr. Ricardo Salgado, presidente do BES, é um dos accionistas da PT – este brilhante accionista que facilmente compreende a estratégia óptima da empresa, em conjunto com a Ongoing e a Visabeira, decidiram que a situação óptima da PT era alienar a sua participação na Vivo à Telefónica por 7.150 milhões de euros. E eis que, estouvadamente, aparece o malfadado Estado…! Oh! terrível! A afronta! A fatalidade! Segundo as palavras do nosso Lord o Estado, com o seu dedo fétido, iria infeccionar, irreversivelmente o negócio PT-Telefonica…A verdade, porém, é que o empecilho estadual conseguiu assegurar 350 milhões de euros extra na venda da Vivo à Telefónica. Parece que algo escapou à gestão visionária dos accionistas, algo zarolhos com a perspectiva de abaterem parte das suas dívidas com os dividendos extraordinários resultantes da alienação. O próprio Ricardo Salgado, que anuíra neste no negócio de 7.150 milhões de euros, então vetado pelo Estado com recurso à golden share, docilmente, viera já lamber o Estado, rebolar-se junto Estado, abanando a cauda. Numa conferência realizada pelo Jornal de Negócios na semana anterior, o banqueiro proferiu as seguintes declarações, quase rebentando de entusiasmo e de vermelhidão, quando questionado acerca da possibilidade da Telefónica aumentar a oferta de 7.150 milhões de euros:
- Esse valor pode ainda ser corrigido. Atribuo isso tudo à utilização da golden share. Se for assim, o mérito é todo do Primeiro-Ministro.
Ao que nos parece, este Ricardo Salgado é o mesmo que inicialmente se manifestava contra a oferta da Telefónica sobre a Vivo, fazendo juras de amor eterno à Pátria; semanas depois, Sua Excelência declarava-se enamorado pelo cifrão e passou para o lado espanhol; o mesmo Ricardo Salgado, após o veto do Estado ao negócio, declarava-se furibundo com o Estado por ter arruinado a possibilidade de um bom negócio e, por isso, mordeu, com fúria, a mão estadual; uma semana depois, o mesmo Ricardo Salgado, declara-se perdidamente apaixonado pelo Estado e declama-lhe uma serenata, enquanto o Estado escuta, suspirando, do peitoril da janela.
Para aferir a legitimidade vitoriosa da intervenção do Estado neste negócio, iremos recorrer à imprensa:
Segundo o Jornal de Negócios, “Para a “The Economist”, a Portugal Telecom parece ser a “vencedora óbvia”. “Zeinal Bava, o seu CEO com visão para os mercados, será ainda mais aclamado pelos accionistas por extrair cada cêntimo e mais algum dos espanhóis. A Telefónica pagou 14% acima da capitalização de mercado da PT antes do lançamento da oferta de compra da posição da PT na Vivo”, refere a revista num artigo intitulado “Brazil calling”.”
Ainda segundo o mesmo diário, a Ongoing, accionista privado da PT vê “com bons olhos que a empresa a manutenção da PT no Brasil – agora através da Oi – manifestando “a sua satisfação face à solução encontrada para resolver a parceria que a PT mantinha com a Telefónica na operadora brasileira de comunicações Vivo, permitindo à PT iniciar um novo caminho, com maior independência, estabilidade e com recursos para se afirmar como uma operadora com dimensão e com um reforço de condições para estar presente nos mercados de maior crescimento”.
Por fim, este negócio revelou-se de tal maneira desastroso para a PT que o Millenium investment banking elevou o preço-alvo da Portugal Telecom de 8, 60 para 11,10 euros, uma melhoria de 30%. Numa nota de research, o Millenium atribui uma recomendação de compra às acções da PT, devido ao potencial de subida dos títulos.
Os próprios espanhóis ficaram contentes. Segundo o El Economista, César Alierta, CEO da operadora, fez vergar José Sócrates. O motivo? É simples: 7.500 milhões de euros = 7.150 milhões de euros. Peanuts, portanto. Euclides estremece no seu túmulo.
Quanto à escolha da Oi como parceira da PT no Brasil, apresenta vantagens e desvantagens. A desvantagem é que apesar de se apresentar como líder no fixo, é apenas o quarto operador móvel – e todos sabemos que o crescimento da rede fixa é nulo, enquanto que no que toca à rede móvel, o Brasil continua a ser um mercado a explorar. Nesse aspecto, a Vivo era líder no mercado móvel, um mercado com muito maior potencial de crescimento do que a rede fixa, onde as possibilidades de expansão são residuais e onde os custos de manutenção da rede podem ser avultados – especialmente no caso do Brasil, país onde as tecnologias de informação e comunicação (TIC) são ainda antiquadas, obrigando a uma modernização da rede. A PT pode, contudo, aproveitar outro sector de enorme potencial – a banda larga. O Brasil continua a ser um país arcaico no que ao acesso à Internet diz respeito. Neste sentido, a PT através da Oi pode assumir uma importante posição no mercado, sobretudo pela política do Governo Brasileiro que confere grande importância à banda larga. O facto da Oi ser uma empresa brasileira pode constituir uma vantagem junto do Governo brasileiro no sentido de promover uma parceria estreita entre a PT, através da Oi, e o Governo para permitir o acesso generalizado da população à Internet, usufruindo de uma ligação estreita com Brasília em relação aos concorrentes. Além do mais, apesar do acordo prever a compra de 22,38% da Oi por parte da PT, a empresa portuguesa, segundo noticia esta edição de sábado do Expresso, a PT poderá “vetar os assuntos que vierem a ser discutidos pelos accionistas que se sentam na Telemar Participações, empresa que detém a Tele Norte Leste Participações, que gere a operação da Oi, a PT irá também presidir aos comités de engenharia e redes, tecnologia e inovação e oferta de serviços, que irão ser constituídos”. Estes comités são os grandes responsáveis pelo desenho da estratégia da empresa, pelo que a PT, apesar de não deter os destinos da Oi, influencia, decisivamente, o controlo da empresa, sobretudo em áreas fundamentais do negócio das telecomunicações. É um facto que aproveita tanto à PT, como aos accionistas brasileiros – que se servem do know-how da operadora portuguesa, com provas sólidas no mercado português e uma parceria de sucesso, agora desfeita, no caso do Brasil, de forma a valorizar os activos da Oi e a torná-la uma empresa cada vez mais robusta. Outra vantagem passa pela abertura de novos horizontes: na Vivo, o acesso ao mercado da América Latina estava vedado à PT por parte da Telefónica em função do acordo estabelecido entre as duas operadoras. Agora, com o rompimento do acordo, a Oi pode ser uma porta para a expansão da PT para o mercado da América Latina e para a África. Este é também um desejo do Governo Brasileiro – pelo que a convergência de interesses só será benéfica para todas as partes.
Assim se consegue a convergência do interesse de todas as partes interessadas no negócio – a Telefónica que garante a compra da Vivo; a PT que garante um importante encaixe financeiro, superior àquele que seria, inicialmente, esperado; os accionistas que poderão receber mais dividendos extraordinários graças à intervenção do Estado; e Portugal que consegue manter uma empresa estratégica para o País com capacidade de acção no mercado global, numa área de enorme importância nos dias que correm – as telecomunicações.
Pelos vistos, ao contrário do que pretendia sugerir o nosso Lord a intervenção do Estado na defesa dos interesses de Portugal, não é não só nefasta ao próprio interesse público, como, inclusive, ao próprio interesse privado – uma tareia aplicada nos doutrinários do laissez-faire.
V. Ex.ª recorda-se destas palavras? – “O amigo leitor confia no Estado para velar pelos seus negócios? Confia numa entidade tão permeável às pressões, cheia de arrivistas e ineficaz? Acha que o Estado compreende melhor qual a estratégia óptima para uma empresa? Não será isso mais facilmente compreendido pelos donos dessa empresa – os accionistas?” Ora, estimado leitor, estas palavras foram proferidas pelo nosso estimado Lord, agora de vacances, num destino exótico incerto e, por certo, algo alheado da realidade recente do nosso País.
O Dr. Ricardo Salgado, presidente do BES, é um dos accionistas da PT – este brilhante accionista que facilmente compreende a estratégia óptima da empresa, em conjunto com a Ongoing e a Visabeira, decidiram que a situação óptima da PT era alienar a sua participação na Vivo à Telefónica por 7.150 milhões de euros. E eis que, estouvadamente, aparece o malfadado Estado…! Oh! terrível! A afronta! A fatalidade! Segundo as palavras do nosso Lord o Estado, com o seu dedo fétido, iria infeccionar, irreversivelmente o negócio PT-Telefonica…A verdade, porém, é que o empecilho estadual conseguiu assegurar 350 milhões de euros extra na venda da Vivo à Telefónica. Parece que algo escapou à gestão visionária dos accionistas, algo zarolhos com a perspectiva de abaterem parte das suas dívidas com os dividendos extraordinários resultantes da alienação. O próprio Ricardo Salgado, que anuíra neste no negócio de 7.150 milhões de euros, então vetado pelo Estado com recurso à golden share, docilmente, viera já lamber o Estado, rebolar-se junto Estado, abanando a cauda. Numa conferência realizada pelo Jornal de Negócios na semana anterior, o banqueiro proferiu as seguintes declarações, quase rebentando de entusiasmo e de vermelhidão, quando questionado acerca da possibilidade da Telefónica aumentar a oferta de 7.150 milhões de euros:
- Esse valor pode ainda ser corrigido. Atribuo isso tudo à utilização da golden share. Se for assim, o mérito é todo do Primeiro-Ministro.
Ao que nos parece, este Ricardo Salgado é o mesmo que inicialmente se manifestava contra a oferta da Telefónica sobre a Vivo, fazendo juras de amor eterno à Pátria; semanas depois, Sua Excelência declarava-se enamorado pelo cifrão e passou para o lado espanhol; o mesmo Ricardo Salgado, após o veto do Estado ao negócio, declarava-se furibundo com o Estado por ter arruinado a possibilidade de um bom negócio e, por isso, mordeu, com fúria, a mão estadual; uma semana depois, o mesmo Ricardo Salgado, declara-se perdidamente apaixonado pelo Estado e declama-lhe uma serenata, enquanto o Estado escuta, suspirando, do peitoril da janela.
Para aferir a legitimidade vitoriosa da intervenção do Estado neste negócio, iremos recorrer à imprensa:
Segundo o Jornal de Negócios, “Para a “The Economist”, a Portugal Telecom parece ser a “vencedora óbvia”. “Zeinal Bava, o seu CEO com visão para os mercados, será ainda mais aclamado pelos accionistas por extrair cada cêntimo e mais algum dos espanhóis. A Telefónica pagou 14% acima da capitalização de mercado da PT antes do lançamento da oferta de compra da posição da PT na Vivo”, refere a revista num artigo intitulado “Brazil calling”.”
Ainda segundo o mesmo diário, a Ongoing, accionista privado da PT vê “com bons olhos que a empresa a manutenção da PT no Brasil – agora através da Oi – manifestando “a sua satisfação face à solução encontrada para resolver a parceria que a PT mantinha com a Telefónica na operadora brasileira de comunicações Vivo, permitindo à PT iniciar um novo caminho, com maior independência, estabilidade e com recursos para se afirmar como uma operadora com dimensão e com um reforço de condições para estar presente nos mercados de maior crescimento”.
Por fim, este negócio revelou-se de tal maneira desastroso para a PT que o Millenium investment banking elevou o preço-alvo da Portugal Telecom de 8, 60 para 11,10 euros, uma melhoria de 30%. Numa nota de research, o Millenium atribui uma recomendação de compra às acções da PT, devido ao potencial de subida dos títulos.
Os próprios espanhóis ficaram contentes. Segundo o El Economista, César Alierta, CEO da operadora, fez vergar José Sócrates. O motivo? É simples: 7.500 milhões de euros = 7.150 milhões de euros. Peanuts, portanto. Euclides estremece no seu túmulo.
Quanto à escolha da Oi como parceira da PT no Brasil, apresenta vantagens e desvantagens. A desvantagem é que apesar de se apresentar como líder no fixo, é apenas o quarto operador móvel – e todos sabemos que o crescimento da rede fixa é nulo, enquanto que no que toca à rede móvel, o Brasil continua a ser um mercado a explorar. Nesse aspecto, a Vivo era líder no mercado móvel, um mercado com muito maior potencial de crescimento do que a rede fixa, onde as possibilidades de expansão são residuais e onde os custos de manutenção da rede podem ser avultados – especialmente no caso do Brasil, país onde as tecnologias de informação e comunicação (TIC) são ainda antiquadas, obrigando a uma modernização da rede. A PT pode, contudo, aproveitar outro sector de enorme potencial – a banda larga. O Brasil continua a ser um país arcaico no que ao acesso à Internet diz respeito. Neste sentido, a PT através da Oi pode assumir uma importante posição no mercado, sobretudo pela política do Governo Brasileiro que confere grande importância à banda larga. O facto da Oi ser uma empresa brasileira pode constituir uma vantagem junto do Governo brasileiro no sentido de promover uma parceria estreita entre a PT, através da Oi, e o Governo para permitir o acesso generalizado da população à Internet, usufruindo de uma ligação estreita com Brasília em relação aos concorrentes. Além do mais, apesar do acordo prever a compra de 22,38% da Oi por parte da PT, a empresa portuguesa, segundo noticia esta edição de sábado do Expresso, a PT poderá “vetar os assuntos que vierem a ser discutidos pelos accionistas que se sentam na Telemar Participações, empresa que detém a Tele Norte Leste Participações, que gere a operação da Oi, a PT irá também presidir aos comités de engenharia e redes, tecnologia e inovação e oferta de serviços, que irão ser constituídos”. Estes comités são os grandes responsáveis pelo desenho da estratégia da empresa, pelo que a PT, apesar de não deter os destinos da Oi, influencia, decisivamente, o controlo da empresa, sobretudo em áreas fundamentais do negócio das telecomunicações. É um facto que aproveita tanto à PT, como aos accionistas brasileiros – que se servem do know-how da operadora portuguesa, com provas sólidas no mercado português e uma parceria de sucesso, agora desfeita, no caso do Brasil, de forma a valorizar os activos da Oi e a torná-la uma empresa cada vez mais robusta. Outra vantagem passa pela abertura de novos horizontes: na Vivo, o acesso ao mercado da América Latina estava vedado à PT por parte da Telefónica em função do acordo estabelecido entre as duas operadoras. Agora, com o rompimento do acordo, a Oi pode ser uma porta para a expansão da PT para o mercado da América Latina e para a África. Este é também um desejo do Governo Brasileiro – pelo que a convergência de interesses só será benéfica para todas as partes.
Assim se consegue a convergência do interesse de todas as partes interessadas no negócio – a Telefónica que garante a compra da Vivo; a PT que garante um importante encaixe financeiro, superior àquele que seria, inicialmente, esperado; os accionistas que poderão receber mais dividendos extraordinários graças à intervenção do Estado; e Portugal que consegue manter uma empresa estratégica para o País com capacidade de acção no mercado global, numa área de enorme importância nos dias que correm – as telecomunicações.
Pelos vistos, ao contrário do que pretendia sugerir o nosso Lord a intervenção do Estado na defesa dos interesses de Portugal, não é não só nefasta ao próprio interesse público, como, inclusive, ao próprio interesse privado – uma tareia aplicada nos doutrinários do laissez-faire.
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