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segunda-feira, 12 de abril de 2010

Para continuar na Crise

Foi com grande interesse e esperança que, neste fim-de-semana, lemos atentamente uma coluna de opinião de João Bosco Mota Amaral. Intitulada “Para sair da crise” nela julgaríamos vislumbrar um conjunto de ideias concretas para resolver os males com que o País se debate desde a Eternidade. Credulamente, fomos enganados.
Mota Amaral inicia a sua análise de uma forma extraordinária – elenca a história de 900 anos do País e baseado nesta longevidade conclui que Portugal irá conseguir superar a actual crise. E com que argumento justifica tal certeza? Porque Portugal já passou por outras crises e continua por cá a espernear. Convulsamente, mas a espernear. A certeza e confiança inabaláveis de Mota Amaral suportadas nestes argumentos são inspiradoras. Sua excelência Mota Amaral acaso consultou o Oráculo de Delfos? Acaso sua excelência é uma sacerdotisa de Apolo que faz agora profecias infalíveis? Sua excelência Mota Amaral no que toca a análises políticas assemelha-se em tudo àqueles que fazem análises sentimentais aos atormentados do coração – todas as crises são passageiras.
Em seguida, Mota Amaral faz uma análise social, cultural e política do País. Começa, no entanto, por aquela análise que não enunciou que iria fazer – a análise económica – mas que, na linha seguinte, lhe, repentinamente, ocorreu. Para ele, Mota Amaral, “O Governo esfalfa-se a anunciar a saída da recessão, mas é sabido que os índices de crescimento continuarão tendendo para a estagnação”. Caro Mota Amaral, ao dizer que o Governo se esfalfa para anunciar a saída da recessão e imediatamente contradiz essa intenção do Governo, sua excelência insinua que o mesmo está a mentir ou a ocultar uma realidade ainda não totalmente percepcionada. Sua excelência sabe que o último relatório do BdP aponta para um crescimento de 0,4% - contrariando as tendências do Governo de 0,7% -, mas ainda assim, esse relatório não aponta para um cenário de recessão. Tal é, com efeito, praticamente, uma estagnação. Mas o que isso não constitui é uma recessão – logo a sua primeira constatação aparece desprovida de sentido. O que sua excelência poderia ter censurado é o facto do crescimento ser uma ninharia em comparação com o crescimento de que o País necessita. Mas isso sua excelência não diz.
Mota Amaral prossegue criticando “o Estado e a sociedade portuguesa” que se encontram “fortemente endividados perante credores externos”, “uma deriva egoísta e libertária abala instituições fundamentais da sociedade”, “os cidadãos e as cidadãs” entre os quais “alastra uma descrença profunda quanto às instituições do Estado”. Este último ponto em particular chamou a nossa atenção. Como se atreve o português a descrer das instituições do Estado que o governam e que o levaram a esta situação pestífera? A esse português diremos – mostre-se agradecido faça o favor! Haja decência, povo português! Mas, meu caro Mota Amaral, sua excelência estaria à espera do quê? Com um défice de 9, 4% do PIB – o maior desde 1922 -, com uma dívida pública que este ano atingirá os 85% do PIB, sua excelência estaria à espera que o povo português prestasse uma vénia às instituições? O povo pode ser descrente, mas não é imbecil.
Esmiuçados os aspectos sociais, culturais e políticos, Mota Amaral, chega a uma conclusão – “Aos partidos políticos, no seu conjunto, em especial os do arco constitucional e governativo, exige-se agora um sobressalto cívico, que coloque no devido lugar prioritário o interesse nacional”. Estimado leitor, nós pretenderíamos ironizar a expressão “sobressalto cívico” de Mota Amaral mas, ela é, aos nossos olhos, de tal modo ilegível que não sabemos tão-pouco o que dizer. Apenas que estas expressões dos políticos parecem do domínio das musas. Mas o deputado do PSD diz ainda que se coloque “no devido lugar prioritário o interesse nacional”. Nós questionámos sua excelência acerca da novidade desta colocação – ela não lhe parece lógica? É necessário afirmar isso e exigir isso aos partidos? Não existe a Assembleia e o Governo para servirem o País e, por consequência, o interesse nacional? Infelizmente esta verdade lógica carece de ser positivada – o interesse nacional não é colocado num pedestal, mas é espezinhado pelos Partidos que pensam primeiro nos seus interesses e depois – e só depois – da conformidade deste com os interesses do País.

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