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segunda-feira, 19 de abril de 2010

Repensar a Soberania

Os deputados da Comissão Parlamentar criada na sequência do processo “Face Oculta” para analisar novas formas de combate à corrupção preparam-se para apresentar as suas propostas.
O Expresso revela dez destas medidas:
1. a criação do crime urbanístico;
2. o aumento da moldura penal da corrupção para acto licito;
3. a criação do estatuto do arrependido;
4. o alargamento da obrigatoriedade de entrega de declarações patrimoniais no Tribunal Constitucional;
5. a constituição de uma base de dados de contas bancárias no Banco de Portugal;
6. a alteração das regras do sigilo bancário;
7. a alteração das regras do sigilo profissional;
8. a intensificação do regime de incompatibilidades;
9. a suspensão do mandato de titulares de órgãos autárquicos quando sobre eles penda acusação ou pronúncia por crime doloso punível com pena superior a 3 anos;
10. a publicação na Internet das declarações de rendimentos depositadas no Tribunal Constitucional
É, no entanto, preciso salientar que as propostas não passam de um conjunto de boas intenções. Apenas quando aplicadas na prática, se torna possível aproveitar as suas potencialidades e os fins com que foram criadas. E para que essa concretização seja possível são necessários meios para cumprir esse desígnio. São necessários meios que investiguem os crimes e são necessários meios para que os crimes sejam julgados. E isto deve ser feito com a máxima celeridade possível. Todavia, é certo e sabido que celeridade e justiça em Portugal são realidades inconciliáveis. Para empreender Reformas no seio da Justiça, a simples cosmética não é suficiente – não basta anunciar que se vai fazer, é preciso que se forneçam os meios para que os objectivos sejam atingíveis. Qualquer Reforma da Justiça em Portugal irá fracassar sem a sua alteração do background de fundo – não se resolve o concreto sem solucionar, primeiramente, o geral. António Costa, Presidente da CM Lisboa, chamou, recentemente, a atenção para o problema do desprezo com que se olha para a justiça como órgão de soberania. O Governo, como responsável pelo poder executivo, não pode escamotear e instrumentalizar as verbas que o poder judicial – como poder soberano – necessita para o cabal desempenho das suas funções. É em sede de Orçamento de Estado que se resolve este problema – e não se pode admitir que o Ministério da Justiça, como responsável pela tutela da Justiça disponha de um Orçamento ridículo. Enquanto continuar a ser considerado como um Ministério marginal, os responsáveis pela Justiça – como os Juízes e o Ministério Público – continuarão com taxas de popularidade reduzidíssima junto dos cidadãos – apenas o Governo dispõe de menor taxa de popularidade.
Regressando, contudo, às dez novas leis anti-corrupção, salientamos, sobretudo, o alargamento da obrigatoriedade da entrega de declarações patrimoniais dentro do seio do Estado – em especial, ao sector empresarial -, tal como o regime de incompatibilidades. Uma das causas crónicas do atraso competitivo de Portugal deve-se à rede larvar que se instala em torno do Estado e com estas duas medidas dão-se passos no sentido de dotar o Estado de uma maior transparência.
O PS, no entanto, insiste na não criminalização do enriquecimento ilícito. Esta recusa é tanto mais estranha quanto o motivo apresentado – o receio em torno da inversão do ónus da prova. Para o PS a inversão do ónus da prova deve ser novidade no ordenamento jurídico português – e não é. Além disso, a prova continua a estar a cargo do Ministério Público que deve provar a existência do rendimento e a sua origem injustificada; só então caberá ao particular provar da licitude da obtenção dos seus rendimentos – não ocorrendo, assim, qualquer inversão do ónus da prova.
O PS continua, por vezes, a tropeçar em casos que digam respeito à promiscuidade no Estado. O PSD deu já os seus sinais de ruptura para com esta ideia de Estado. Ou o PS promove as mudanças que são necessárias na sociedade portuguesa ou pagará o preço por esse laxismo
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