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sábado, 20 de março de 2010

Programa de Estabilidade...o crescimento fica para depois

O PEC tem um mérito indiscutível – é credível. Os mercados aceitaram bem o Plano de Estabilidade e Crescimento Português e tal já teve reflexos nos juros dos empréstimos da República Portuguesa. A credibilidade do PEC era um imperativo. Podemos questionar as escolhas efectuadas, mas a meta de redução do défice para 3% até 2013 era incontornável. Nesse sentido, o Governo apresentou um programa com metas realistas – veja-se a evolução pessimista do problema do desemprego que pouco se alterará. O objectivo principal foi, portanto, alcançado. Mas o cumprimento do objectivo não era difícil. Difícil é conciliar o cumprimento do objectivo imediato – a redução do défice – com um conjunto de objectivos mediatos – o crescimento da economia portuguesa.
E neste PEC não se vislumbra uma linha estratégica para o desenvolvimento da economia. Não se conhece uma linha estratégica do Governo para assegurar um crescimento sustentado do País. Tudo o que Governo se limita a fazer é a anunciar medidas de estabilidade e de redução – matéria de crescimento não é da sua competência. O objectivo de redução do défice é para cumprir, o objectivo de crescimento da economia fica para mais tarde por questões de incompatibilidade de agenda.
Para além da anunciada convergência da idade da reforma do sector público com o sector privado, não se nota no PEC nenhuma ideia reformista do Governo em relação ao Estado. Para o Governo, o Estado é perfeito tal como está e, portanto, não são necessárias reformas para melhorar a sua eficiência.
A redução do défice do lado da despesa vem de paliativos essencialmente temporários – o congelamento do salário do funcionário público ou a redução do investimento público. São medidas temporárias mas que não resolvem o problema de fundo de Portugal. Este ciclo, já bem conhecido dos portugueses, consiste em congelar temporariamente os gastos mais facilmente controláveis pelo Estado durante o período de crise, e retomá-los imediatamente a seguir, logo que a crise pareça afastada. E, assim, vem Portugal desde o início do milénio. Cortando, retomando, cortando e retomando – aos solavancos. Mas sem encontrar um rumo estável. A redução do défice operar-se-á, do lado da despesa do Estado, sobretudo, por estes dois caminhos. Mas uma vez alcançada a meta de 3% do défice as despesas com estas duas rubricas irão novamente aumentar e os custos do Estado irão novamente aumentar. E quando tal acontecer, lá irá o Primeiro-Ministro, em tom pesaroso, dizer aos portugueses que a culpa é de toda gente, menos dele. Como dizia Ricardo Costa, “vamos pagar mais impostos, trabalhar mais anos, ter menos serviços, privatizar o que resta e ter pensões mínimas. Tudo isto para quê? Para que daqui a quatro anos alguém nos volte a dar a mesma receita.”
O Governo volta a perder uma nova oportunidade de indicar um caminho de crescimento sustentado para a economia portuguesa. Pelo contrário, o Governo voltou a apresentar um conjunto de medidas avulsas que reduzem a despesa do Estado apenas durante certo período. Uma vez decorrido esse hiato temporal, a situação voltará a ser a mesma. As medidas de austeridade do Governo destinam-se a um período específico. Após esse período as medidas de austeridade são colocadas na gaveta e os velhos problemas estruturais de Portugal regressam.
O Governo iniciou bem a sua primeira legislatura com ímpeto reformista. Mas o seu ímpeto durou apenas dois anos. Nos outros dois anos, o Governo foi tomar banhos de sol. Neste início de legislatura, o Governo iniciou logo pelos banhos de Sol e talvez nos últimos dois anos se dedique ao ímpeto reformista.

A juntar a todos estes problemas, soma-se a hipocrisia do Governo. Após ter jurado a pés juntos não subir os impostos e ter rasgado o pacto que propôs aos portugueses quando se submeteu ao seu voto, José Sócrates ainda tem o descaramento de não admitir um aumento real da carga tributária sobre os portugueses? Haja pelo menos a coragem e a decência de admitir, com frontalidade as medidas propostas. E não falamos de simples benefícios fiscais que distorcem a justiça social do sistema fiscal, mas de benefícios que incidem sobre despesas com saúde ou educação. Não são, portanto, benefícios destinados à nobreza. Actualmente, na política tudo é permitido: mentir, trair ou enganar. Não queiram é tomar o povo português como idiota semântico.
A revista “The Economist” recomendava aos governos a concentração sobre o crescimento económico: “Um crescimento mais elevado tranquiliza os mercados, aumenta as receitas fiscais e reduz a despesa em subsídios de desemprego e outros apoios sociais. Os políticos devem portanto evitar politicas que reduzam a taxa de crescimento a longo prazo, tais como as politicas de proteccionismo ou os impostos mais elevados, e em vez disso concentrar-se em medidas que aumentem o potencial de crescimento, tais como mercados de trabalho mais flexíveis e outras reformas que promovam a produtividade”. Obviamente este cenário idílico não se verifica em Portugal onde a palavra crescimento foi riscada do Acordo Ortográfico.

As privatizações, as quais ainda não são conhecidas em pormenor, são outro erro do Governo. Com o fim de realizar dinheiro a curto prazo, irá sacrificar a venda de organizações estratégicas para a economia e que conferem lucro ao Estado em vez de considerar a venda de outras que, pelo contrário, apenas acumulam passivo. O caso da TAP é sintomático. É necessário que se repensa também a situação de outras empresas de transporte, como a CP, a Carris ou a Metro. A venda pode não ser imperativa, mas a procura dum modelo de gestão mais eficiente não pode ser negada. Ao invés, o Governo opta por vender as companhias que lhe geram lucros, sacrificando uns trocos de curto prazo, por lucros a curto, médio e longo prazo. O Governo vende as jóias da Coroa e fica com a quinquilharia.

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